A Reunião dos Presidentes das Academias de Ciência da América do Sul encerrou o evento Avanços e Perspectivas no Brasil, América Latina e Caribe, no dia 3/12.
Participaram do encontro o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Jacob Palis, o chefe da assessoria de Cooperação Internacional da Academia, Paulo de Góes Filho, o assessor internacional do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) e presidente do Grupo de Ciência, Tecnologia e Inovação da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), José Monserrat Filho, o vice-presidente da Academia Nacional de Ciências Exatas, Físicas e Naturais (ANCEFN- Argentina), Roberto Cignoli, o renomado médico e pesquisador da área de biotecnologia de Cuba, Dr. Manoel de J. Limonta Vidal, o presidente da Academia Nacional de Ciência da Bolívia, Gonzalo Taboada Lopes, o presidente da Academia Colombiana de Ciências Exatas, Físicas e Naturais (ACCEFYN), Jaime Rodríguez-Lara, o presidente da Academia Nacional de Ciências do Peru (ANC), Roger Guerra Garcia e o presidente da Academia de Ciências Físicas, Matemáticas e Naturais da Venezuela, Benjamin Scharifker.

José Monserrat, Gonzalo Taboada, Jaime Rodriguez-Lara, Benjamin Scharifker,
Jacob Palis, Roger Guerra Garcia, Roberto Cignoli
A reunião começou com a apresentação de cada um dos Presidentes. A seguir, José Monserrat Filho fez breve apresentação do novo Conselho de Cultura, Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação (Conseccti) da Unasul e de seu Grupo de CT&I, para cuja presidência o Brasil foi eleito. Monserrat informou sobre as áreas prioritárias de cooperação em CT&I aprovadas pelo Conseccti: energias renováveis, biotecnologia (sobretudo para a saúde), elaboração e implementação de políticas públicas de CT&I, educação e divulgação científicas, sem prejuízo de outras áreas também aprovadas.
Ele explicou que esta reunião dos presidentes de Academias de Ciências dos Países Membros da Unasul foi uma iniciativa e um pedido do referido Grupo de CT&I, visando deixar claro para a opinião pública que a Unasul iniciava seus esforços de promover a cooperação em CT&I preocupada com a ciência de excelência feita na América do Sul, representada acima de tudo pelo trabalho de suas Academias de Ciências.
Monserrat também frisou que as Academias de Ciências da América do Sul podem desempenhar papel relevante na expansão e consolidação das atividades de pesquisa na região, ampliando o intercâmbio de cientistas, professores e estudantes através de vários programas de colaboração conjunta dos doze países sul-americanos. Destacou ainda que as instituições de CT&I dos países da Unasul precisam de conhecer melhor e enfrentar juntas os grandes desafios da era do conhecimento em que o mundo vive com intensidade cada vez maior. Monserrat lembrou igualmente que o Brasil alcançou reconhecimento internacional em C&T após décadas de muita luta e esforço. “Queremos compartilhar nossa experiência com os outros países”, disse, ressaltando que a Unasul, para se tornar uma unidade política forte, deve também conquistar uma forte unidade científica e cultural.
Em seguida, os presidentes apresentaram suas Academias e focaram, de modo geral, a relação com o governo, nas principais atividades realizadas e nos assuntos científicos que eles consideram ser prioritários no atual momento.
A Academia de Ciências da Argentina
O primeiro a se apresentar foi Roberto Cignoli, da Academia Nacional de Ciências Exatas, Físicas e Naturais da Argentina. PhD em Matemática pela Universidade Nacional do Sul. Ele contou que a ANCEFN, criada em 1874, foi declarada instituição civil autônoma em 1926 e conta hoje com três seções: Engenharias; Ciências Biológicas, da Terra e Químicas; e Matemática, Física e Astronomia. A ANCEFN realiza reuniões científicas e fomenta o conhecimento científico, principalmente através de anais e conferências, e da Internet.
Cignoli destacou três áreas que, a seu ver, devem ser preocupação de todas as Academias. São elas: educação científica, energia e água. Para isso, a Academia da Argentina colabora com cursos de treinamento para professores, estabelece colaboração com universidades, promove a Reunião dos Biocombustíveis, assim como a Reunião dos Resíduos Sólidos. Em 2010, recebeu a Rosenberg International Forum on Water Policy.
A relação com o governo é de cooperação, afirmou ele. Hoje, a Argentina conta com o Conselho Nacional de Investigações Científicas e Técnicas (Conicet), agência governamental que coordena as atividades da área.
A Academia da Bolívia
Em seguida, o presidente da Academia Nacional de Ciências da Bolívia, Gonzalo Taboada López, reitor da Universidade Mayor de San Andrés e pós-graduado em medicina genética pela Universidade de São Paulo (USP), apontou que a Academia da Bolívia assiste universidades, centros de pesquisa, instituições e cientistas e ainda promove eventos relacionados à educação e demais áreas vinculadas à instituição. Ele declarou ser essencial reforçar a relação entre o governo e as outras Academias.
Lopéz afirmou que um dos seus desejos é realizar a reforma educacional em seu país e que gostaria de criar programas para educação contínua de pesquisadores bolivianos, o que enriqueceria as pesquisas realizadas na Bolívia. A Academia contribui com participação técnica na formulação da Reforma Educacional Nacional, a fim de promover a educação científica da sociedade.
Entre os principais desafios definidos por López estão a educação, água, energia e meio ambiente. Segundo ele, o quadro pode se reverter, pois a Bolívia dispõe de recursos naturais em abundância, tendo uma das maiores reservas mundiais de gás natural, lítio e ferro.
A Academia da Colômbia
O quarto presidente a se apresentar foi o colombiano Jaime Rodríguez-Lara, da ACCEFYN, PhD em Física pela Universidade de Lille (França) e professor emérito da Universidade Nacional de Colômbia. Ele iniciou sua apresentação comentando as principais atividades da Academia no último ano, como: o Congresso de Ciência e Tecnologias Ambientais, o ciclo de conferências Homens de Ciência e Independência e o fórum Comunicação e Ciência.
Em relação ao governo, Rodríguez-Lara destacou que, por decreto, o Ministério do Meio Ambiente não pode, sem a permissão da Academia, modificar ou suprimir parques ou áreas de reservas naturais. Para isso existe uma comissão permanente na Academia. Ele disse ainda que a relação, quando se trata de outros assuntos, é pouca ou esporádica. Dentre as expectativas da instituição, segundo Lara, estão a de organizar uma seção de Jovens Cientistas, promover uma reunião de Ministros de Ciência e Tecnologia e ganhar maior visibilidade nacional em áreas do governo.
A Academia de Ciências do Perú
Em seguida, o presidente da Academia do Peru, Roger Guerra García, médico endocrinologista, começou sua apresentação dando foco na relação entre governo e Academia, quesempre foi um pouco difícil, dado o pouco interesse dos governos anteriores em financiar ciência e tecnologia no país.
Segundo García, as perspectivas para o futuro se resumem em propor a criação de um Centro de Investigação e Tecnologia em Materiais em conjunto com universidades e institutos científicos – a fim de promover o estudo e pesquisa na área – e aumentar a colaboração entre as Academias da Unasul, para que haja intercâmbio de conhecimento entre acadêmicos.
A Academia, enfatizou ele, empreende esforços para auxiliar na educação científica dos cidadãos peruanos, porém, recente estudo realizado pela Organização dos Estados Ibero-Americanos mostra que a percepção dos jovens com relação à ciência e às profissões científicas não evoluiu de fato.
A Academia da Venezuela
O presidente da Academia de Ciências Físicas, Matemáticas e Naturais da Venezuela, Benjamin Scharifker, foi o último a se apresentar. PhD em físico-química, atua também como vice-reitor Acadêmico da Universidade Metropolitana de Caracas.
O quadro apresentado por Scharifker não é muito animador, pois embora o governo venezuelano divulgue que o investimento em CT&I no país seja da ordem de 2,6% do PIB, esse alto índice não parece repercutir na produção científica do país, que não vem tendo crescimento expressivo nos últimos anos. “Não há transparência com relação aos gastos na área. Esse é um dos motivos que faz com que hoje tenhamos mais cientistas venezuelanos trabalhando no exterior do que no próprio país”, lamentou o presidente.
Ainda assim, há um movimento no país em prol do desenvolvimento de CT&I. Os programas recentes, como o Programa Vargas e Ciência na Escola – o primeiro mantém relação com cientistas venezuelanos no exterior e o segundo desperta o interesse científico por meio da indagação -, envolvem bolsas de doutorado para Ciência básica – 15 bolsas anuais -, programas de ensino de Ciência baseado na investigação com 45 escolas básicas, publicações relacionadas a divulgação científica e programas científicos voltados para agricultura sustentável em comunidades indígenas e conservação da biodiversidade.
A comunidade científica tem se mobilizado no sentido de discutir com o governo outros temas relevantes, que ainda não são alvo de programas, como modificações nas leis de C&T, financiamento do sistema científico e tecnológico, aspectos sociais e éticos de pesquisas sobre câncer, entre outros. “No momento o maior debate se dá em torno de uma nova lei que estabelece uma contribuição de até 2% da renda bruta das empresas para compor um fundo para CT&I”, informou Scharifker, acrescentando que o momento é de consolidar as instituições no sentido de garantir e sustentar o crescimento científico.
Propostas para atuação conjunta
Após a apresentação da Venezuela, o presidente da ABC Jacob Palis solicitou sugestões dos presentes para linhas de ação conjunta em CT&I entre os países da América do Sul. “Acho que estamos todos abertos para colaborações que visem contribuir para o avanço da Ciência no nosso continente”, afirmou Palis.
O colombiano Jaime Lara apelou para que o Brasil ajudasse os outros países presentes a fazer com que suas respectivas classes políticas se conscientizem da importância da C&T para o crescimento de um país. Palis esclareceu que no Brasil também não foi fácil, foram necessárias muitas visitas a Ministérios e participações de membros diversos da comunidade científica em sessões do Congresso e da Câmara. “Mas posso garantir que a definição de uma boa agenda ajuda muito”, ressaltou o matemático.
O presidente da Academia Argentina apoiou a idéia, tendo inclusive observado que seu país tem mais colaborações com a Europa e os EUA do que com países vizinhos. Destacou que pontos de interesse comum podem gerar agenda, como energias renováveis. Outro ponto sugerido pelos participantes da reunião foi a Amazônia, já que quase todos os presentes – fora a Argentina – compartilham o bioma.
O assessor técnico da ABC, Marcos Cortesão, sugeriu que fossem considerados como eixos de ação conjunta o programa de educação científica da Rede Interamericana de Academias de Ciências (IANAS) e os grupos de atuação do escritório regional do Conselho Internacional par aa Ciência (ICSU, na sigla em inglês). “Essa sinergia tem a vantagem de aumentar a produtividade das estruturas existentes”, observou Cortesão.
Após o levantamento inicial de temas, quando foram citados também a formação de recursos humanos, a formação de massa crítica, a possibilidade de criação de um centro materiais avançados e o impacto das mudanças climáticas, o presidente da ABC propôs um prazo até março para que as Academias encaminhem suas sugestões e então seja definida uma agenda. “O Brasil certamente está aberto e pode oferecer muitas oportunidades”, afirmou Palis.