A Vice-Presidência Regional do Nordeste organizou um Simpósio no dia 8 de março, na Universidade Federal da Bahia (UFBA), com Membros Afiliados da ABC e palestrantes convidados. O evento foi coordenado pelo Acadêmico Jailson Bittencourt de Andrade, com a colaboração dos Acadêmicos Aldina Barral, Manoel Barral, Edgar Carvalho, Aroldo Misi e Ana Maria Giulietti.


Manoel Barral, Aldina Barral, Jacob Palis e Jailson de Andrade

Na mesa da cerimônia de abertura estavam Jailson de Andrade, o presidente da ABC Jacob Palis , o reitor da UFBA Naomar Monteiro, o diretor de Inovação da Fapesb Elias Ramos e o diretor da Escola Politécnica da UFBA, Luiz Edmundo Campos.


Jailson Bittencourt, Jacob Palis , Naomar Monteiro, Elias Ramos e Luiz Edmundo Campos

Jailson abriu o evento destacando a criação das seis Vice-Presidências Regionais da ABC, criadas em 2007 pela Diretoria eleita junto com o presidente Jacob Palis. Esclareceu que cada uma delas está organizando seus Simpósios em todo o Brasil, e que a Regional Nordeste havia dividido seu evento em duas etapas. “Hoje serão abordadas aqui as áreas das Ciências Biológicas, da Saúde e Química. Amanhã, em Recife, serão contempladas as áreas das Ciências Matemáticas, Físicas e as Geociências. E como a Bahia sempre inova, convidamos para abrir o Simpósio um expressivo filósofo da nossa Universidade”. Ele justificou a ausência do Vice-Presidente Regional, Cid B. de Araújo, por estar ocupado exatamente com a organização do evento do dia seguinte, na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), quando os novos Membros Afiliados serão titulados.

O reitor destacou sua satisfação com o crescimento da Ciência no país e especialmente na UFBA. “Tínhamos 17 doutorados em 2004, hoje temos 42. O volume de artigos com inscrição na Web of Science passou de 150 em 2003 para 460 em 2009”. Reconheceu e agradeceu, ainda, a parceria profícua com a ABC que vem ocorrendo nos últimos anos.

O presidente da ABC cumprimentou a todos e agradeceu o empenho dos Acadêmicos da Bahia na organização do evento, já o terceiro a que compareceu nesses últimos meses. Ressaltou a contribuição da Ciência da Bahia ao país, evidenciando a recente criação de um doutorado em Matemática – a sua área -, em parceria com a Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

Palis comentou que apresentou ao reitor da UFBA e ao diretor de Inovação da Fapesba a proposta de organização, ainda esse ano, de um Simpósio Academia-Empresa na Bahia. O primeiro evento desse tipo será realizado no Rio de Janeiro nos dias 24 e 25 de março, e a ABC está buscando reproduzi-lo em todo o país, com empresas de cada região. O presidente explicou que a idéia “é estimular a comunicação entre os cientistas e as empresas, visando ao maior aproveitamento da inteligência brasileira na indústria. Esse, claramente, é o caminho que levará à ampliação da pesquisa e desenvolvimento no setor produtivo e, consequentemente, à inovação no Brasil.”

Wittgenstein e os limites do significativo

O primeiro palestrante convidado foi o diretor da Faculdade de Filosofia da UFBA, João Carlos Salles. Para ele, a filosofia não é um conjunto de frases edificantes, mas trabalha sobre as condições da significação. “Há um jogo e o filósofo faz as regras. O cientista faz experimentos e o filósofo busca entender o que significa experiência para o cientista, busca o sentido”. Salles apontou que com Descartes, a metafísica deu lugar à epistemologia. “Do sujeito, o centro passa a ser a lógica, a linguagem.”

Sua palestra tratou de modalidades lógicas e experiência, partindo do filósofo austríaco Ludwig Wittgenstein (1889-1951). Salles falou do programa de investigação que Wittgenstein montou, composto pelos Tractados que demonstravam como fazer uma determinação definitiva dos limites do significativo, separando o que pode ser dito, que seria o campo da Ciência, daquilo que não pode ser dito e que é relevante, que está no campo da filosofia e da ética. “O importante, para mim, é mostrar a dissolução desse programa de investigação, que é o que Wittgenstein faz na segunda parte de sua obra. Ele começa a mostrar que as determinações do que é necessário, do que é possível e do que é existente não são definitivas”, explicou Salles.

Padrões espaciais da assembléias bentônicas nos estuários da Baia de Todos os Santos

O oceanógrafo da UFBA Francisco Barros apresentou seu trabalho sobre
assembléias bentônicas em ambientes estuarinos, ou seja, grupos de animais invertebrados que vivem no fundo de estuários, ambientes onde ocorre o encontro da água doce com a água salgada. “São ambientes que no mundo inteiro são bastante impactados pela ação do homem”.

Barros abordou especialmente os estuários da Baía de Todos os Santos, onde
identificou e estudou os padrões de distribuição das espécies mais
abundantes e mais frequentes de invertebrados bentônicos. Seu grupo vem buscando entender os fatores entrópicos que podem influenciar na estrutura dessas assembléias, visando partir para modelos preditivos, em colaboração com matemáticos e físicos. “A ideia é conseguir prever as consequências das ações humanas, saber o que aconteceria se um estuário fosse dragado, o que ocorreria se houvesse um aumento de temperatura anormal, e assim por diante.”

Em busca de novos fármacos

A médica veterinária e neurocientista do Instituto de Ciências da Saúde da UFBA, Silvia Lima Costa, apresentou resultados do Laboratório de Neuroquímica e Biologia Celular, composto atualmente por mais de 35 pesquisadores e estudantes de pós-graduação. O grupo busca o desenvolvimento de novos fármacos em todas as suas linhas de pesquisa.

Na ocasião, Silvia apresentou resultados sobre a ação de flavonóides extraídos de plantas regionais, sob uma orientação etnofarmacológica. “Essas drogas foram estudadas porque as plantas de onde provieram são usadas na medicina popular”, explicou a pesquisadora. Com a colaboração de pesquisadores das áreas de Farmácia e de Química, que obtiveram esses flavonóides, os testaram como agentes antitumorais e como regeneradores ou diferenciadores, numa perspectiva terapêutica para tumores cerebrais ou para regeneração de neurônios. Ela explicou que a célula tumoral é desdiferenciada, e sob a ação de um fármaco agente diferenciador ela pode ou morrer por morte programada, ou parar de proliferar e diferenciar, o que seria ideal para um tratamento antitumoral. “As células que sobreviverem tem um fenótipo normal, diferenciado. Essa é uma terapia inovadora e temos resultados muito interessantes”.

Além disso, o grupo vem trabalhado com células precursoras de córtex de rato, e em colaboração com o Acadêmico Stevens Rehen, da UFRJ, com precursores de células-tronco de camundongos embrionárias, visando verificar o potencial dessas drogas em induzir a maturação de neurônios e mesmo aumentar a população de neurônios, já em uma perspectiva de terapia de regeneração.

Anemia falciforme: doença de grande incidência na Bahia

Marilda Gonçalves, pesquisadora da Fiocruz e professora da Faculdade de Farmácia da UFBA, falou sobre alguns biomarcadores de prognóstico na anemia falciforme uma doença genética autossômica recessiva que tem uma incidência muito elevada no Brasil, principalmente no Estado da Bahia. Os pacientes costumam apresentar um processo inflamatório crônico, percebidos no acompanhamento desses indivíduos com marcadores laboratoriais comuns mas que têm um valor prognóstico importante, como o leucograma, que é um exame de rotina, e as dosagens de colesterol, que estão associadas à inflamação.

Os portadores da anemia falciforme apresentam também um processo de oclusão das veias que provocam crises de dor muito intensas. É uma patologia muito complexa que envolve várias sintomatologias clínicas. Vários órgãos são envolvidos nessa patogênese da doença e o paciente realmente tem uma qualidade de vida muito baixa. Marilda estuda os diferentes marcadores exatamente porque existe uma heterogeneidade clínica muito grande entre os pacientes, apesar da origem da doença ser a mesma. “Hoje, existe a tentativa de se subfenotipar esses pacientes, isto é, identificar tipos de pacientes que têm doenças de prognósticos diferentes, em função dos marcadores que eles apresentam.”

Estudando a imunidade nata na leishmaniose

A biomédica da Fiocruz e professora da UFBA, Claudia Brodskyn, procura entender os mecanismos da imunopatogênese na leishmaniose. Ela explicou que existem dois tipos de imunidade: a adaptativa, que é bastante estudada, e a imunidade inata. Seu grupo estuda atualmente a imunidade inata, especialmente os neutrófilos. “As Leishmanias vivem dentro de outra célula, chamadas macrófagos, e a interação entre esse tipo celular macrófago e o neutrófilo parece ser muito importante no início da infecção.”

Claudia observou que essa interação leva a reforços inflamatórios que, por um lado, podem diminuir a quantidade de parasitas e com isso levar a uma proteção posterior mas, por outro lado, pode também levar a um processo inflamatório bastante intenso, responsável pela lesão cutânea. “Estamos procurando entender um pouco dos mecanismos dessas interações, principalmente no modelo humano, que tem poucas referências a esse respeito.”

Evolução das energias renováveis: o biodiesel

O engenheiro Ednildo Andrade Torres, pesquisador do Laboratório de Energia e Gás da Escola Politécnica da UFBA, apresentou sua visão da questão energética, focando principalmente as energias renováveis, entre elas o biodiesel.

Torres esclareceu que o uso do biodiesel tem relação tanto com a questão ambiental como com a econômica. Compartilhou com os presentes um pouco de sua trajetória ao longo desses trinta anos, em que se ocupou de transformar ciência em tecnologia, sempre voltado para a questão energética. “Desenvolvi diversos produtos, entre eles biodigestores, e processos como a mudança da fonte energética de indústrias, passando da petroquímica para outras mais sustentáveis.”

O professor apresentou três patentes que desenvolveu com seu grupo: uma de um software e outra de energia solar, voltada para a questão energética e social. Mostrou a implantação de energia solar realizada por seu grupo numa creche que atende a 200 crianças e numa igreja que cuida de aidéticos, prostitutas e outras pessoas marginalizadas. “Isso não é ciência, mas é a tecnologia ajudando o social”. Falou também da patente de uma técnica para extração de mel de abelha sem ferrão. “No Brasil existem muitas dessas abelhas e seu mel costuma ser desprezado ou consumido de forma fermentada. Nossa técnica extrai esse mel e possibilita ao pequeno agricultor melhorar o seu produto e, consequentemente, vendê-lo melhor.”

Torres também atua no Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Energia Ambiente e no Centro Interdisciplinar de Energia Ambiente, espaços que estão em processo de construção da estrutura física, laboratorial e de treinamento de recursos humanos, em nível de doutorado.

Aplicações para nanoestruturas de carbono

O professor do Instituto de Física da UFBA Roberto Rivelino, indicado para Membro Afiliado da ABC no período de 2007 a 2012, falou de algumas aplicações de nanoestruturas de carbono. Apresentou inicialmente um breve histórico dos trabalhos que identificaram essas estruturas, focando as mais conhecidas, que são as do diamante e do grafite.

Rivelino mostrou, em imagens microscópicas, folhas muito finas originadas do grafite que podem ser dobradas, dando origem a tubos; podem ser recortadas e enroladas, gerando esferóides. “Estendidas, elas têm propriedades muito distintas das que a gente conhece.”

A folha é uma membrana bidimensional que pode ser utilizada para separar dois líquidos, sejam eles iguais ou diferentes. “Podemos colocar água de um lado, água do outro e, fazendo modificações em um lado em relação ao outro, perceber e quantificar as variações das propriedades. Esse processo pode levar a resultados bem interessantes, de estruturação de líquidos, de cristalização de materiais etc.”, exemplificou Rivelino.

Outra aplicação diz respeito à solubilidade das nanoestruturas. “A energia livre dessas nanoestruturas pode aumentar em até 100 vezes se dopada com determinadas substâncias. Procuramos determinar teoricamente a estabilidade, a energia de hidratação desse sistema de solubilização e as suas propriedades eletrônicas, interessantes para o desenvolvimento de dispositivos. Estamos investigando também as propriedades eletrônicas e de transporte de fios carbônicos muito finos. Essas são algumas das aplicações nas quais estamos trabalhando”, concluiu o físico.

Contribuição para técnicas espectrométricas de análise de amostras

O químico da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB), Valfredo Azevedo Lemos, foi indicado para Membro Afiliado da ABC no período de 2008 a 2011. Suas pesquisas atuais estão voltadas para o aumento de sensibilidade de técnicas espectrométricas, especialmente para a espectrometria de absorção atômica com chama com atomização eletrotérmica.

“Alguns tipos de amostras, como alimentos, apresentam teores de elementos, que não são facilmente detectáveis. O equipamento que estamos desenvolvendo vai ajudar na análise de amostras de alimentos, de fluidos biológicos, ambientais, como água, que são de interesse das mais variadas áreas”, explicou o pesquisador. Seu grupo partiu de tubos de quartzo ou de aço e estão estudando ainda diferentes materiais. “Esse material vai prender o vapor atômico na direção do feixe ótico, auxiliando em um aumento na sensibilidade da técnica.

Compostos detetores de radiações infravermelha

A professora de Química da UFBA Luciana Almeida Silva é uma das mais novas afiliadas da ABC, indicada em 2009. Ela falou sobre os compostos em que trabalhou para sua tese de doutorado. “Embora eu já tenha mudado o foco de minha linha de pesquisa, essa é uma boa oportunidade para se falar sobre esse tema, porque estamos publicando um artigo que deve sair nos próximos números do Journal of Chemical Education, que é a proposição de uma disciplina experimental utilizando os conhecimentos adquiridos durante o período de doutorado e logo após”, destacou a pesquisadora.

Luciana resumiu os fundamentos e aplicações dessa série de compostos – os sulfitos duplos de valência mista. “Esses compostos podem ser utilizados como semicondutores de banda estreita, o que significa que usam energia baixa para serem ativados e podem ser aplicados como detetores de radiações infravermelhas. Então, têm uma aplicação tecnológica interessante”, explicou. Além disso, um desses compostos pode ser usado como um filtro ótico, por ser capaz de selecionar uma faixa do espectro muito estreita, a luz vermelha. Seu grupo já depositou uma patente para uso desse material como filtro ótico específico para passagem de luz vermelha. Portanto, além do interesse acadêmico, que explora a parte conceitual, o grupo está explorando possibilidades de aplicação tecnológica.