O Encontro Brasil-Reino Unido sobre Mulheres e Ciências que terminou em 2/2 foi palco de boas discussões. Entre as conclusões encaminhadas no encontro está a articulação entre pesquisadores para a formação de uma rede de pesquisa voltada para o público feminino e o incentivo à consolidação de políticas públicas visando a maior inserção e participação das mulheres em todos os campos da ciência no Brasil e em outros países.

No mundo da ciência, acredita-se, que o que conta é qualidade do trabalho realizado e não as características pessoais de quem o realizou, sejam elas relativas a gênero, raça, religião ou outras. Mas a realidade não é bem assim.

De acordo com dados divulgados no encontro, o número de bolsas em produtividade de pesquisa distribuídas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) anualmente tem os homens como seu público principal. As mulheres representam apenas 34% do número de bolsistas. Em algumas áreas, como engenharia elétrica, a porcentagem de mulheres que requisitam bolsas só chega a 5%.

A pergunta que ecoou durante no encontro foi “por que as mulheres cientistas no Brasil ainda não avançam tanto em cargos e posições de destaque e reconhecimento? Será preconceito do pares, dos comitês de julgamento de projetos de pesquisa que na maioria das áreas são compostos por homens? Ou será devido ao condicionamento cultural proveniente de uma socialização prematura ou a situação particular da mulher em relação à maternidade?” Foram estes e outros questionamentos que as pesquisadoras procuraram refletir e debater no decorrer do evento.

Várias pesquisadoras lembraram também que a desigualdade de gênero não está só na ciência. Segundo a antropóloga Marília Gomes de Carvalho, no mercado de trabalho, as mulheres ganham 30% menos que os homens de sua mesma idade e nível de instrução.

“A mulher, em todas as instâncias, tem que provar sempre que tem competência, o que não é igualmente cobrado dos homens. Isso ocorre devido a um estereótipo, a uma construção cultural, na qual a sociedade sacralizou a mulher como passiva, frágil, doméstica e mãe. Por causa desta visão, a mulher enfrenta mais dificuldades que os homens, que já possuem historicamente o ethos de serem vistos sempre como os mais fortes, os líderes e os mais competentes. Com isso as mulheres acabam por retardar sua ascensão em seu âmbito profissional ou mesmo científico”, disse a antropóloga no segundo dia do encontro.

Com os diagnósticos divulgados durante o evento foi concluído que nos níveis mais altos da bolsa de Produtividade e Pesquisa a maioria dos pesquisadores é do sexo masculino, inclusive nas áreas tidas como femininas, enquanto que nos níveis iniciais da carreira, o número de mulheres é bem mais expressivo.

Segundo a geneticista, professora da Universidade de São Paulo e Acadêmica Mayana Zatz, além do possível preconceito que a mulher pesquisadora possa enfrentar no campo acadêmico para ser reconhecida e chegar a postos mais altos, muitas mulheres fazem a escolha de não assumirem cargos de chefia, para conciliar melhor o tempo dedicado à família e ao trabalho.

Mayana disse ainda que é fundamental juntar esforços para impulsionar de vez políticas publicas que favoreçam a inserção maior das mulheres na ciência. “O Programa Mulher e Ciência é uma destas grandes iniciativas, que desde 2005 vem trabalhando para estimular a discussão e a produção científica sobre a participação da mulher na ciência. Mas além do programa, precisamos inserir de vez a sociedade como um todo nesse debate de gênero e educação científico-tecnológica, propondo a criação de políticas públicas que conduzam à participação mais efetiva e igualitária das mulheres na ciência e na tecnologia”, afirmou.

O Programa Mulher Ciência, do qual o CNPq é integrante, se destaca por três grandes ações em prol da equidade de gênero nas ciências: o Edital bianual de pesquisas na temática “Relações de Gênero, Mulheres e Feminismos”, o prêmio para estudantes denominado “Construindo a Igualdade de Gênero” e o Encontro trienal “Pensando Gênero e Ciências”.

Durante o evento, foi pautada também a necessidade de dar prosseguimento às discussões para ampliar a inserção de pesquisadoras e pesquisadores brasileiros em grupos de estudos sobre ciência, tecnologia e gênero, ressaltando a importância de se construir genealogias, redes e comunidades de conhecimento que valorizem os contextos da sua produção, construção e transmissão.

As investigações e os resultados desse encontro e do Programa Mulher Ciência serão divulgados no VIII Congresso Iberoamericano em Ciência, Tecnologia e Gênero, a ser realizado de 5 a 9 de abril, na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), em Curitiba.