Os estudos do pesquisador são voltados para as bases neurais do comportamento e visam entender os mecanismos das motivações e emoções humanas no campo das interações sociais. Para ilustrar a complexidade dos processos mentais de comunicação nos relacionamentos humanos, Moll compara a vida com um jogo de xadrez. “Centenas de pessoas estão envolvidas em cada decisão que precisamos tomar. Nós temos de contemplar todos esses aspectos de forma muito eficiente e, muitas vezes, implícita”, destaca.

Filho de médicos, o neurocientista conta que, apesar de admirar a dedicação e o profissionalismo dos pais, inicialmente, não se identificava com a Medicina. Sempre gostou das ciências naturais e recorda que quando criança pensava em trabalhar com pedras e insetos. No início da adolescência, Moll passou a se interessar muito por Física e a ler sobre assuntos como teoria da relatividade, Astronomia e robótica. Temas relacionados à ficção científica despertaram nele a curiosidade sobre fenômenos estranhos e paranormais, como a telepatia. “O terreno misterioso da mente e das ciências ocultas me levaram à Medicina, o campo que me daria mais subsídios e a melhor formação para estudar o cérebro. A minha abordagem sempre foi estrutural e mecanicista; não era bem a Neurologia, enquanto área médica, que me atraía”.

Na universidade, ficou cada vez mais evidente para Moll a vontade de compreender fenômenos complexos do pensamento humano, como mecanismos de atenção e tomada de decisão. Entre os anos de 95 e 98, ao mesmo tempo em que cursava a residência em Neurologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o neurocientista realizava o que ele chama hoje de “pesquisa de garagem”. Quando os equipamentos de ressonância magnética do laboratório Labs estavam livres, na madrugada ou nos fins de semana, ele convocava voluntários e conduzia experimentos sobre percepção tátil e controle de movimentos junto com os colegas e mentores Ricardo de Oliveira Souza, docente da Universidade do Rio de Janeiro (Uni-Rio), e o Acadêmico Ricardo Gattass, que é professor emérito da UFRJ e superintendente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). “Muitas vezes, nós víamos o dia amanhecer. Nessa época, conseguimos processar as primeiras imagens funcionais”, orgulha-se Moll.

Em 2000, seu grupo de pesquisa identificou no cérebro qual a região do córtex responsável por armazenar as fórmulas de uso de ferramentas como o martelo e a chave de fenda. “Para conhecer bem um processo cognitivo é necessário decompor os seus componentes para estudar os fenômenos simples”, ressalta. Com toda a base de dados das pesquisas em mãos, o neurocientista foi direto para o doutorado em Ciências, na área da Fisiopatologia Experimental, na Universidade de São Paulo (USP). A vantagem da faculdade paulista era o sistema flexível de créditos, com ênfase em temas como Psiquiatria, Neurologia e comportamento. Um ano após concluir o curso, o pesquisador foi para os Estados Unidos fazer um pós-doutorado na Seção de Neurociência Cognitiva do Instituto Nacional de Saúde (NIH), sob a supervisão do psicólogo Jordan Grafman, especializado nas funções do lobo frontal humano.

O foco principal da linha de pesquisa de Moll é o que alguns chamam de Neurociência Social, responsável pela análise do processo cerebral que garante a comunicação e o entendimento entre as pessoas. “Nós experimentamos os sentimentos dos outros e regulamos os nossos comportamentos de acordo com isso”, esclarece. Ele afirma que, mesmo sem perceber, escolhemos o que dizer baseados nas relações que traçamos com os indivíduos, através do reconhecimento de suas intenções e expectativas. O neurocientista explica que, em geral, essas interações envolvem o acesso às sensibilidades, muitas vezes identificadas como intuições, mas que, na realidade, têm uma arquitetura cognitiva que pode ser estudada, decomposta e compreendida.

O pesquisador estuda as emoções morais ou sociais por meio de experimentos com questionários ou testes de computador. Na pesquisa, são apresentadas situações hipotéticas que levam o voluntário a definir como agiria e qual seria a sua reação emocional naquelas circunstâncias. Outro método tem como foco a análise estrutural do cérebro. Dentro do equipamento de ressonância magnética funcional, a pessoa tem acesso a uma tela de computador que exibe frases e imagens, que evocam diferentes sensações. Através deste processo é possível decodificar as atividades cerebrais que estão relacionadas aos sentimentos complexos.

No NIH, Moll conduziu uma atividade que avaliou o processo de tomada de decisão, através da doação à caridade. O voluntário era exposto a imagens de variadas instituições beneficentes e decidia se iria doar ou ficar com o dinheiro que recebia no início do experimento. Desta forma, era possível analisar o mecanismo cerebral que regulava essa decisão, que tinha um impacto no mundo real e um verdadeiro custo ou benefício para a pessoa. “As regiões emocionais do cérebro são ativadas fortemente nesta experiência, principalmente as atribuídas à recompensa e aos mecanismos de afiliação, amor e compaixão”, explica o neurocientista.

Ao retornar para o Brasil, o pesquisador iniciou um estudo que busca identificar o que há de comum e de diferente entre as respostas ligadas às recompensas “egoístas”, que são só pessoais – como ser promovido no emprego ou ganhar na loteria – e as sociais, quando se ajuda outros indivíduos. “Hoje sabemos que as boas ações estão relacionadas a um bem estar mais prolongado do que as conquistas particulares, que têm um efeito momentâneo. Nós acreditamos que essa descoberta pode ter uma aplicação muito grande em termos de qualidade de vida e altruísmo”. Moll acrescenta que existem inúmeros estudos que evidenciam que as iniciativas que envolvem valores mais amplos asseguram uma maior estabilidade psicológica.

Por considerar a construção social contemporânea muito individualista, o neurocientista acredita que a descoberta pode trazer uma mudança de perspectiva pelo fato de demonstrar que funcionar bem em sociedade é uma característica natural da constituição humana. De acordo com o pesquisador, estamos no limiar do surgimento de uma nova ciência que poderá ser chamada de Neurosociologia. “Os sentimentos afiliativos e pró-sociais poderão ser maximizados a partir de políticas operacionais que proporcionarão um maior equilíbrio nas relações entre os indivíduos, no ambiente de trabalho ou até mesmo na Economia”, presume.

Outros focos das pesquisas de Moll são as disfunções cerebrais que prejudicam os mecanismos das relações interpessoais, como ocorre com os chamados psicopatas que possuem um grave comportamento anti-social. “São indivíduos que não desenvolveram a capacidade de experimentar sentimentos como culpa ou compaixão. Eles são muito frios e capazes de causar grandes danos a quem estiver em volta”, alerta. O neurocientista avisa que identificá-los precocemente é uma tarefa quase impossível, já que os psicopatas tendem a ser extremamente carismáticos e envolventes e têm facilidade para simular sentimentos como a culpa e o arrependimento.

De acordo com o pesquisador, o distúrbio está presente em 1% a 2% da população de ambos os sexos e está associado à agressividade, manipulação, chantagem e falta de empatia. Moll acrescenta que a síndrome resulta de uma deficiência de formação de determinados circuitos cerebrais que, por enquanto, não tem cura ou tratamento eficaz. Ele explica que, nesses casos, foi encontrada uma redução discreta da massa cinzenta em uma combinação de regiões envolvidas nos processos cognitivos dos sentimentos morais. “É muito pior quando uma rede de áreas está comprometida”, ressalta.

Sobre a indicação como membro afiliado da ABC, o neurocientista confessa que foi uma grande surpresa, principalmente porque a trajetória de pesquisa dentro do sistema privado tende a ter menos visibilidade no meio acadêmico tradicional. “Para mim, é uma honra fazer parte desse grupo que tem inúmeros cientistas fenomenais. Isso me estimula a produzir mais em quantidade e qualidade”, enfatiza. O pesquisador quer aproveitar a oportunidade para realizar o que ele chama de “fertilização cruzada”, ou seja, a interação com outras áreas da ciência. Na sua perspectiva, o intercâmbio é a única forma de criar campos científicos mais criativos. “É desse cruzamento entre as diferentes disciplinas que surge a novidade e a originalidade das pesquisas”, acentua.

Para Moll, a interação entre a Neurociência e a Matemática é muito promissora, uma vez que a ciência dos números poderia simplificar e amplificar a análise dos dados coletados nos experimentos com imagens funcionais. Segundo o neurocientista, pelo fato do cérebro ser uma estrutura extremamente complexa que envolve uma enorme variedade de padrões relacionados a estímulos e pensamentos, é necessário um tratamento mais sofisticado, como a metodologia utilizada no campo dos Sistemas Dinâmicos. “Em certo grau e ao olhar a distância, nós podemos dizer que o ser humano é previsível, mas, quando nos aproximamos do dia a dia de alguém, entramos em contato com comportamentos impossíveis de prever. Essa união permitiria um melhor entendimento desses eventos”, justifica.

Na opinião do pesquisador, o maior desafio para a compreensão do cérebro humano é o fato do órgão ser altamente sensível a contextos que influenciam cada pensamento e decisão. Para ele, o maior dilema é criar uma situação experimental que abranja a complexidade da vida real. “Nós estamos em um momento único da história, onde temos todas as ferramentas para abrir a caixa-preta da mente, enquanto o homem interage com outros indivíduos e reflete sobre diferentes aspectos do mundo moderno”, avalia Moll, que está convencido de que fazer ciência é mais do que uma profissão: é uma questão de paixão.