A atividade espacial, juntamente com a nanotecnologia e a biotecnologia, está entre as tecnologias rompedoras de paradigmas que vão moldar o desenvolvimento da humanidade neste século. A área estabeleceu-se de forma definitiva durante a segunda metade do século XX, quando a humanidade foi capaz de colocar equipamentos produzidos pelo ser humano no espaço. Ela está apoiada em três pilares: ciência espacial, tecnologia (ou engenharia) espacial e aplicações espaciais. A ciência espacial está ligada a esforços anteriores, pois o estudo do espaço exterior sempre esteve no foco da humanidade. Assim, astronomia, astrofísica e, mais recentemente, cosmologia são temas da ciência espacial. Com a possibilidade tornada real da presença humana ou de nossos equipamentos no espaço, as investigações em geofísica espacial, radiação cósmica, física solar e planetas e objetos do sistema solar tornaram-se temas relevantes para a área espacial. Contudo, somente quando a humanidade desenvolveu uma tecnologia espacial é que a área se estabeleceu de forma concreta. Há pelo menos três instâncias ligadas a tecnologia espacial: acesso ao espaço, satélites (incluem-se sondas e instrumentos – telescópio espacial por exemplo) e estações (situadas no espaço ou em corpos celestes fora da Terra), segmento de solo. As aplicações espaciais, por outro lado, se tornaram parte essencial da infraestrutura tecnológica da sociedade moderna, como, por exemplo sistemas globais de navegação por satélite (GNSS: Global Navigation Satellite Systems, como o GPS (EUA) e Glonass (Rússia)), satélites de sensoriamento remoto (meteorologia, oceanografia e uso do solo são exemplos de aplicações) e de comunicação. Em particular, as atividades de sensoriamento remoto, meteorologia, mudanças climáticas, monitoramento ambiental dependem fortemente da disponibilidade de sistemas baseados em satélites artificiais. As atividades do setor espacial brasileiro estão inseridas em arranjo institucional estabelecido no final da década de 70, quando foi criado o primeiro programa espacial de longo prazo e definida a Missão Espacial Completa Brasileira (MECB) com três grandes metas: desenvolver um lançador de satélites, desenvolver satélites de monitoramento ambiental e operacionalizar o Centro de Lançamento de Alcântara. Concebida no regime militar, a MECB consistiu em um esforço do governo para envolver dois atores institucionais principais (DCTA e INPE) na sua execução. A partir do final da década de 1980, o INPE iniciou sua forte atuação no desenvolvimento de satélites, complementando as atividades coordenadas pelo DCTA no desenvolvimento de veículos lançadores. Apesar de seus enormes desafios, esse programa evoluiu muito, desde a inauguração do LIT, em 1987, até o lançamento exitoso do satélite SCD-1 (Satélite de Coleta de Dados – 1), em 1993. Na mesma época, foi assinado o protocolo de cooperação entre Brasil e China, que resultou no lançamento do primeiro satélite da série CBERS, em 1999, e progrediu com êxito até o lançamento do CBERS-4, em 2014. O programa de satélites foi inicialmente todo desenvolvido sob a governança do INPE. No entanto, com a publicação do Decreto n0 1.332, estabelecendo a Política de Desenvolvimento das Atividades Espaciais – PNDAE, e a sanção da Lei n0 8.854, criando a Agência Espacial Brasileira – AEB, os programas desenvolvidos pelo DCTA e INPE passaram a ser coordenados pela agência. De fato, o Art. 30 da referida lei estabelece que “compete à AEB executar e fazer executar a PNDAE, bem como propor as diretrizes e as ações dela decorrentes”. Esta estrutura acabou introduzindo entraves porque as competências para execução do PNAE, no que concerne objetivos científicos e técnicos, projetos de satélites, participação da indústria e instituições governamentais, como também integração e testes, não estão ainda satisfatoriamente acordadas e detalhadas. Essa situação requer uma revisão adequada de todo o programa espacial brasileiro quanto à sua estrutura e governança, estabelecendo claramente seus objetivos de longo prazo. Especificamente sugerimos que os seguintes tópicos sejam considerados no estudo a ser desenvolvido pela ABC.

Acesso ao Espaço

Esta é uma atividade crítica do programa espacial em que o Brasil enfrenta atrasos. O PNAE lista uma série de ações. Porém, muitas das atividades previstas já estão comprometidas. Em julho de 2015, o Brasil oficialmente notificou as autoridades da Ucrânia do cancelamento do tratado de lançamentos comerciais pelo foguete ucraniano Cyclone-4 Para a realização do projeto, foi constituída em 2006, a empresa pública binacional Alcântara Cyclone Space (ACS), que agora está em processo de encerramento. Assim ficou sem definição clara como será a utilização da base de lançamentos de Alcântara. Por outro lado, este não é o primeiro projeto internacional na área espacial que o Brasil revê sua participação; outro exemplo importante foi a saída da colaboração para desenvolvimento da Estação Espacial Internacional. Esta é uma área que requer atenção. É necessário garantir recursos humanos e financeiros para atingir o cumprimento das metas dentro dos prazos estabelecidos.

Satélites e Aplicações Espaciais

  1. Satélites Geoestacionários
    O PNAE descreve dois tipos destes satélites; um para Defesa e Comunicações (SGDC), onde a empresa Visiona (fundada em 29/maio/2012) atua como prime-contractor, e outro para Meteorologia (GeoMet), cujos requisitos ainda não estão totalmente definidos.
  2. Satélites Oceânicos e Meteorológicos
    O Brasil é um país continental e sua dimensão, acrescentada de questões estratégicas, justificam o uso de satélites de sensoriamento remoto, incluindo a parte oceânica. O Brasil tem entendimentos com a Argentina para o lançamento do satélite Sabia-Mar, dedicado a importante atividade de monitoramento do oceano. Além disso, é igualmente importante monitoramento da atmosfera, sendo que, aparentemente, não há proposta de satélites meteorológicos de órbita polar.
  3. Observação da Terra
    Estão previstos a continuidade do Programa CBERS e o lançamento dos satélites da série Amazônia (1, 1B, 2), que tem condições de atender a demanda do País.
  4. Satélite de Coleta de Dados
    Satélites deste tipo foram projetados no âmbito da MECB (Missão Espacial Completa Brasileira), para a capacitação de equipes. Este é um satélite com 100% de tecnologia nacional, o que é relevante para estimulara capacitação do setor empresarial.
  5. Satélites Científicos
    Esta deve ser uma atividade mandatória de todos os programas espaciais. É desolador constatar que o único sistema que foi colocado em órbita foi um nano-satélite e os demais programas estão atrasados. Em particular, o programa de desenvolvimento de nano satélites deve ser melhor articulado, incluindo a participação da comunidade acadêmica.
  6. Sondas de Espaço Profundo
    Em reuniões das agências espaciais, um dos principais temas de discussão é sobre missões de espaço profundo (Deep Space). O Brasil está fora destas discussões e seria importante considerar a participação brasileira em projetos internacionais, como, por exemplo, a missão ASTER de exploração de um asteroide triplo. Missões deste tipo são janelas de oportunidades para desenvolvimentos tecnológicos, como propulsão iônica.

Segmento de Solo

Uma das ações da MECB, foi a instalação de uma antena multi-satelitária em Cuiabá (MT). Contudo, é preciso ter um plano para aproveitar os extremos do País para instalação de antenas para recepção de dados e imagens de satélites. Isso iria permitir um aumento considerável da capacidade de imageamento para o Brasil, que incluiria parte da América Central e os oceanos Pacífico, Atlântico Sul e Atlântico Equatorial Norte.

Indústrias do Setor Espacial

O programa espacial do Brasil está aquém da demanda real do País. Mesmo assim, a área conseguiu estruturar um setor industrial, ainda pequeno, pois sua dimensão não permite uma expansão substancial. Porém, com a instabilidade dos programas e a retração dos recursos, o setor que já é pequeno, pode entrar em colapso. Basicamente, este setor necessita continuidade do Programa Espacial para poder se planejar e se estruturar. A área espacial também pode oferecer outras oportunidades, por exemplo, estabelecer infraestrutura de uma constelação de satélites de coleta e transmissão de dados na zona equatorial. Uma vez criada a infraestrutura, o setor pode ser competitivo com os custos de outras tecnologias, além de garantir uma demanda para a indústria do setor.

Veículos Lançadores

Há vários tópicos relativos à estratégia atual para desenvolvimento de veículos lançadores que necessitam ser melhor investigados, como, por exemplo
  • Analisar a viabilidade da estratégia de “começar pequeno” e ir crescendo em seguida, proporcionada pelo Veículo Lançador de Microssatélites (VLM).
  • Qual é o papel da tecnologia de motores a combustível sólido e líquido e sua participação na construção de um conceito integrado de lançador? Deve-se optar por um ou manter os dois?
  • Estabelecer programa de desenvolvimento da plataforma inercial para guiamento, navegação e controle.
  • Estabelecer programa de desenvolvimento de eletrônica embarcada, envolvendo fortemente a indústria nacional.

Novas Tecnologias

O programa especial, incluindo mesmo a parte de ciência básica, depende fortemente do desenvolvimento de novas tecnologias e instrumentação. Por isso deve contemplar um grande esforço neste aspecto, como por exemplo
  • Materiais para aplicações espaciais.
  • Novos propelentes.
  • Motores a propulsão elétrica (iônica e a plasma).
  • Plataformas inerciais.
  • Computadores de bordo resistentes à radiação.
  • Voo em formação de satélites.
  • Comunicação a laser entre satélites.
  • Sensores especiais

Pesquisa Básica em Ciências Espaciais

É necessário articular melhor as atividades pesquisa básica desenvolvidas por unidades de pesquisa do MCTIC e as instituições acadêmicas, em particular incentivando o desenvolvimento de instrumentação científica.

Coordenadores
Ricardo Galvão
Valder Steffen Jr.

Participantes
Adenilson Roberto Silva
Amauri Silva Montes
Antonio Carlos Pereira
Carlos de Oliveira Lino
Cesar Ghizoni
Fabiano Luis de Souza
Gilberto Câmara
Haroldo de Campos Velho
João Braga
João Luiz Filgueiras de Azevedo
João Steiner
João Vianei Soares
João Vital Cunha Junior
Leila Fonseca
Leonel Fernando Perondi
Luis Eduardo Loures da Costa
Manoel Mafra de Carvalho
Marco Antonio Chamon
Maria de Fátima Mattiello Francisco
Mauricio Gonçalves Vieira Ferreira
Milton Chagas
Petrônio Noronha de Souza
Ricardo de Queiroz Veiga
Walter Bartels

A primeira reunião do grupo aconteceu na Sede do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, em São José dos Campos, em SP, no dia 17 de novembro de 2016. Contou com a presença de quase todos os participantes deste grupo.

Foram elencados os tópicos principais do tema Atividades Espaciais, são eles:

  • Introdução
  • Objetivos Estratégicos e Políticas para o Programa Espacial
  • Missões Satelitais
  • Veículos Lançadores
  • Infraestrutura
  • Coleta de Dados e Observações da Terra
  • Objetivo e Desenvolvimento Industrial
  • Pesquisa Básica

Todos os participantes tiveram a oportunidade de se voluntariar para redigir um ou mais tópicos principais.

As primeiras versões das redações relativas aos tópicos principais devem ser enviadas aos coordenadores do grupo até o dia 10 de janeiro de 2017.