Há agora um consenso na comunidade científica de que a biodiversidade tem um papel fundamental a desempenhar no funcionamento dos ecossistemas e, consequentemente nos serviços ecossistêmicos. Também designados ‘Nature’s benefits to people’ estes são os benefícios que indivíduos, comunidades, sociedades, nações e a humanidade como um todo, tanto em áreas rurais como em áreas urbanas, obtém da natureza. Os serviços ecossistêmicos – incluindo os de Provisão (como alimentos, água doce, fibras, produtos químicos e madeira), os de Regulação (absorção de CO2 pela fotossíntese das florestas; contribuição ao controle do clima, polinização de plantas, controle de doenças e pragas), os de Suporte (como ciclagem de nutrientes e formação do solo), e os Culturais (benefícios intangíveis de natureza recreacional, educacional ou religiosa) – são de fundamental importância para a qualidade de vida e o bem estar humano. Esta conexão fica clara no marco conceitual da Plataforma Intergovernamental de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos/IPBES (Figura 1). Mas muitas vezes estes serviços não são percebidos no curto prazo, mas a as análises de longo prazo e a modelagem de cenários evidenciam sua importância. A estabilidade de provisão dos serviços ecossistêmicos para as futuras gerações, em um mundo de rápidas mudanças globais, depende intrinsicamente da proteção à biodiversidade. É preciso trabalhar de forma integrada e sinergística para monitorar, proteger e restaurar a biodiversidade e, por consequência, os serviços ecossistêmicos. A necessidade de considerar os diferentes serviços ecossistêmicos, bem como a biodiversidade e a resiliência na tomada de decisões aumenta a complexidade, e exige equipes inter e/ou transdisciplinares para abordar tanto os fatores biológicos, como os socio-economicos e os associados às mudanças globais, em especial as mudanças climáticas. O mapeamento de serviços ecossistêmicos está cada vez mais sofisticado. A camada base de uso da terra está sendo incrementada com dados primários, bem como modelos baseados em processos que podem ser utilizados para prever o impacto de futuras mudanças na oferta de serviços de ecossistema. Estes mapeamentos consideram os serviços ecossistêmicos em diversas escalas, espaciuais e temporais, tornando-se uma ferramenta imprescndível para orientar a formulação e o aperfeiçoamento de políticas. É necessário o desenvolvimento de sistemas integrados de avaliação dos serviços ecossistêmicos, considerando tanto o valor econômico, monetário, como os não econômicos, ecológico e culturais. A avaliação integrada reconhece que existem vários valores, todos de igual importância e que estes não podem ser reduzidos a uma única unidade fundamental, precisam ser considerados simultaneamente. Pensando do ponto de vista de incorporação em políticas este sistema é desafiador, mas é o que garante a longevidade das soluções. Biodiversidade, serviços ecossistêmicos e bem estar humano são todos parte de um sistema único, interligado, e não se pode trocar o ganho a cuto prazo pela solução a longo prazo. Na crise atual de biodiversidade e mudanças climáticas, não podemos nos dar ao luxo de ignorar a importância da biodiversidade, tanto por seu valor intrínseco como pelo fato de prover resiliência e estabilidade no fornecimento de serviços ecossistêmicos. É imprescindível manter uma visão ampla das interligações entre os sistemas sócio-econômicos, ecológicos e evolutivos. Este é o pilar e a força de se utilizar o conceito de serviços ecossistêmicos gerando o bem estar humano.
  • A perda de biodiversidade prejudica a provisão dos serviços ecossistêmicos, impactando direta e indiretamente o bem-estar humano. É um dos três limites planetários já transpostos pela atividade humana, ao lado de mudanças climáticas e deposição de nitrogênio;
  • A taxa de extinção de espécies resultante de ação humana é da ordem de 100 a 1000 vezes 6 maior do que a taxa de extinção natural. A introdução de espécies por ação humana no último século aumentou exponencialmente, estimando-se que 3,9% das plantas existentes tenham sido movidas de seus ambientes naturais e estejam estabelecidas em novos ambientes;
  • A degradação da biodiversidade e dos serviços ecossistêmicos (BSE) causa surtos de doenças, riscos para a segurança alimentar, hídrica e climática, desastres naturais e marginalização de populações humanas. Não há, portanto, desenvolvimento socioeconômico e humano em bases sustentáveis sem a conservação e o uso sustentável da BSE;
  • Políticas subnacionais, nacionais e internacionais deverão levar em conta as relações entre biodiversidade, serviços ecossistêmicos e as pessoas para enfrentar o desafio do desenvolvimento em bases sustentáveis;
  • O Brasil tem a oportunidade de se consolidar como modelo de desenvolvimento sustentável face à riqueza de seus recursos naturais, à possibilidade de promover sua produção primária em um ambiente de elevada diversidade natural, à capacidade técnica disponível e aos instrumentos legais em geral favoráveis ao modelo. Entretanto, a BSE ainda é tratada como periférica ao desenvolvimento do país;
  • O desenvolvimento sustentável, que alia bem-estar humano à conservação e uso sustentável da BSE, consta como meta de acordos globais das Nações Unidas, incluindo as Convenções de Mudanças Climáticas, de Diversidade Biológica, de Combate à Desertificação, o documento “The Future We Want” [1] e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável [2].

Figura 1 [3] – Diagrama do Marco Conceitual da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos - IPBES. No painel central, delimitado em cinza, caixas e setas denotam os elementos da natureza e da sociedade que são o foco principal da IPBES. Em cada caixa, o texto em cor preta indica categorias que devem ser inteligíveis e relevantes para todas as partes interessadas na IPBES, e abrangem as categorias da ciência ocidental (verde) e categorias equivalentes ou similares em outros sistemas de conhecimento (azul). As categorias em azul e em verde são ilustrativas, não exaustivas, e estão melhor explicadas em Díaz et al, 2015. As setas sólidas no painel principal denotam a influência entre os elementos; as setas pontilhadas denotam as ligações reconhecidas como importantes, mas que não são o foco principal da IPBES. As setas coloridas, à direita e abaixo do painel principal, indicam que as interações entre os elementos mudam ao longo do tempo e ocorrem em várias escalas espaciais. As linhas verticais na extrema direita da figura indicam que, embora o escopo dos inventários da IPBES seja nas escalas supranacional-subregional a global, eles serão em parte construídos a partir de relações e propriedades que agem em escalas mais finas. Fonte BPBES [1] http://www.uncsd2012.org/content/documents/727The%20Future%20We%20Want%2019%20June%201230pm.pdf
[2] https://sustainabledevelopment.un.org/topics/sustainabledevelopmentgoals
[3] Adaptado de Díaz et al (2015) “The IPBES conceptual framework – connecting nature and people”. Current Opinion in Environmental Sustainability 14:1-16.