Veterano de cúpulas climáticas e um dos maiores especialistas do mundo sobre a Amazônia e o seu impacto no planeta, o climatologista Carlos Nobre diz que a COP-26, que começou ontem em Glasgow, na Escócia, tem como desafio conseguir de governantes o compromisso com metas duríssimas, mas necessárias. Copresidente do Painel Científico para a Amazônia e pesquisador sênior do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), Nobre afirma que a Humanidade tem à frente a década mais desafiadora de sua História.

O que podemos esperar da COP-26?

É uma pergunta de US$ 100 milhões. O momento me lembra o da COP-15, em Copenhague, para a qual havia uma imensa expectativa. Porém, só fomos alcançar os resultados esperados na COP-21, em Paris. E isso aconteceu porque houve um trabalho prévio do governo da França.

Que trabalho?

Uma intensa negociação prévia com os países. Os líderes, como o presidente americano Barack Obama, chegaram com muita coisa já negociada, prontos para o Acordo de Paris.

Por que é tão urgente chegar a um acordo substancial de redução de metas nesta COP?

Porque estamos atrasados. A ciência aponta os riscos há décadas e o último relatório do IPCC é a continuidade disso. Não falamos mais do que pode acontecer, mas do que já ocorre e do que precisamos fazer para tentar impedir que se agrave. E friso que passar de 1,5° C de elevação de temperatura será terrível. Para evitar que isso aconteça, teríamos que reduzir as emissões em 50% até o fim desta década.

Qual a chance de a COP-26 chegar a um acordo neste sentido?

Parece distante com o que temos na mesa neste momento. Este ano, as emissões de CO2 devem superar as de 2019, ainda que a atividade econômica não tenha se recuperado plenamente e enfrentemos a pandemia. Os números do Brasil de 2021 ainda não saíram, mas devem superar 2020, ano em que o Brasil foi um dos poucos países que registrou aumento de emissões, devido ao desmatamento da Amazônia. Este ano, o desmatamento continua a crescer e o governo ligou as térmicas.

(…)

O senhor tem trabalhado com o projeto da Amazônia 4.0 de desenvolvimento associado à exploração sustentável da biodiversidade. O quão rentável pode ser a exploração sustentável da floresta?

Muito rentável. Vou dar um exemplo. Um hectare de sistema agroflorestal rende uma média de US$ 1.000 por ano. Isso representa um rendimento dez vezes maior do que o do gado e cinco vezes superior ao da soja.

E como está o Amazônia 4.0?

Apesar da pandemia, temos conseguido avançar. Conseguimos recursos para o primeiro laboratório que será levado a quatro comunidades no Pará. Ele está em construção em São José dos Campos e será usado para produtos de cacau e cupuaçu, com alta agregação de valor.

Qual a maior urgência da Amazônia?

Fazer uma moratória a jato para o desmatamento e a degradação em toda a Amazônia. Hoje, 17% dela foram desmatados e outros 17% degradados. É preciso zerar o desmatamento, não importa se legal ou ilegal, até porque o Congresso brasileiro tem legalizado as ilegalidades. A palavra legal passou a não significar mais nada por isso. Como 60% da Amazônia estão no Brasil, ele deveria liderar. Mas para isso é preciso de uma política mais enérgica para a região.

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