Leia artigo do Acadêmico Simon Schwartzman, publicado no Estado de S. Paulo em 14/8:

Dizem que a França desmoronou ante os alemães em 1940 porque havia se preparado para repetir a Primeira Guerra, e não para enfrentar a Segunda. A última guerra em que o Brasil participou foi a do Paraguai (não contando a Força Expedicionária nos anos 40). Desde então mantemos uma força militar que hoje custa 113 bilhões de reais ao ano, e estamos sendo derrotados pela invasão do Coronavírus.

Claro que a pandemia não é um problema militar, mas o conceito de segurança nacional, pelo qual o país deveria estrar preparado para enfrentar crises e ameaças internas e externas, deve ser muito mais amplo do que o da preparação para uma eventual, e cada vez mais improvável, guerra convencional.

Isto coloca pelo menos três questões que precisarão ser aprofundadas na discussão sobre a política nacional de defesa que o Congresso deve considerar proximamente, que prevê a vinculação de 2% do PIB em gastos federais com a área militar, 50 bilhões a mais.

Primeiro, pensar a estratégia militar como parte de uma política mais ampla de defesa nacional, que deve incluir também as áreas de saúde pública, educação, ciência e tecnologia, proteção ambiental, defesa civil e segurança interna. O setor público precisa se capacitar para enfrentar eventuais crises sanitárias, ambientais e sociais com propostas de estratégia e de políticas públicas equivalentes às que o Ministério da Defesa preparou para o setor militar.

Os custos de equipar as forças armadas, assim como os custos de um sistema adequado de saúde pública e proteção ambiental, são potencialmente infinitos, é sempre possível querer mais. É preciso trabalhar dentro das restrições orçamentárias que se tornarão extremante fortes nos próximos anos, combinando os recursos federais com os estaduais, do setor privado e da cooperação internacional.

Segundo, há que avaliar se o conceito de segurança nacional hoje adotado pela área militar deveria se manter restrito ou se ampliar para outras áreas onde os recursos e a capacidade de mobilização das forças armadas poderiam dar uma contribuição mais regular e direta.

Não queremos voltar aos anos 60 e 70, quando um conceito extremamente ampliado de segurança nacional serviu para justificar o controle, pelos militares, de todo o Estado e da economia do país.

Não faz sentido manter toda esta estrutura de pessoal e equipamento indefinidamente isolada nos quartéis, na expectativa do exercício de sua “função precípua”, uma guerra convencional que dificilmente virá, quando poderiam estar sendo utilizados de muitas maneiras diferentes.

A área militar tem uma longa tradição de ações no âmbito civil, da construção de estradas ao relacionamento com as populações indígenas, dos tempos do Marechal Rondon, até o controle do tráfego aéreo civil pela Aeronáutica, sem falar no uso cada vez mais frequente de tropas em questões de segurança local e de fronteiras.

Deve ser possível pensar em um modelo híbrido, em que as forças armadas cumpram funções regulares na área civil, sem perder sua capacidade de mobilização militar quando necessário. Ao contrário de uma sociedade militarizada, o que precisamos é de um setor militar muito mais próximo do mundo civil.

Leia o artigo de opinião na íntegra no Estado de S. Paulo