Todos estão suscetíveis a desastres climáticos, desde os países desenvolvidos, até aqueles que estão em desenvolvimento. Diante disso, a sexta sessão da Conferência Internacional “Como Ciência e Tecnologia Podem Contribuir para a Redução da Pobreza e da Desigualdade” tratou os impactos dessas catástrofes sobre as populações mais vulneráveis e suas alternativas, de forma a assegurar que os objetivos do desenvolvimento sustentável sejam atingidos. Os debates foram moderados por Lai-Meng Looi, doutora em medicina pela Universidade da Malásia, após as palestras ministradas por Toshio Koike, professor emérito da Universidade de Tóquio, pelo Acadêmico José Marengo, doutor em meteorologia pela Universidade de Wisconsin e por Vidya Diwakar, mestre em economia pela Universidade de Cambridge.

Toshio Koike, José MarengoLai-Meng Looi e Vidya Diwakar

Prever e Prevenir os desastres

No Brasil, são comuns as cenas de telejornais que mostram famílias que perderam todos os bens depois de enchentes ou outras catástrofes ambientais. De acordo com Marengo, no país “não há tsunamis e terremotos, mas o povo sofre com o excesso de chuvas, ou com a falta delas”. Nesse sentido, o Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), no qual o Acadêmico é pesquisador sênior, tem como missão fundamental monitorar e emitir alertas aos órgãos ​​de Defesa Civil em todo o território nacional sobre a provável ocorrência de incidentes associados a fenômenos naturais.

A seca é um desses eventos climáticos que afeta o Nordeste, uma das regiões mais pobres do Brasil e, por esse motivo, gera grandes impactos na vida dessa população. O Cemaden utiliza redes de monitoramento hidro-geo-meteorológicas de última geração e tecnologias de modelagem e previsões para antecipar, com a maior eficiência e eficácia possível, os impactos de desastres naturais na sociedade, na infraestrutura e no meio ambiente.

No Nordeste do Brasil, são distribuídos pelo governo federal pagamentos de seguros para pequenos agricultores em distritos afetados por secas extremas, para garantir condições mínimas de sobrevivência desses grupos, oriundos de municípios sistematicamente sujeitos a perdas de safras por falta ou excesso de chuva. “No período de 2012 a 2017, devido aos impactos da seca, cerca de 6 milhões de pequenos proprietários perderam sua colheita na região. Aproximadamente US $ 1,6 bilhão foi gasto no pagamento do seguro Garantia Safra”, contou o doutor em meteorologia.

O Brasil não é o único país em que o clima é uma preocupação. No Japão, por exemplo, foi realizado o Fórum Global de Ciência e Tecnologia para Resiliência a Desastres 2017, que concordou em formular diretrizes para apoiar plataformas nacionais de Redução de Risco de Desastres (RRD), utilizando ferramentas científicas e tecnológicas de forma eficiente. “Foi produzido um relatório de síntese sobre ciência e tecnologia de desastres”, disse Toshio Koike. Para isso, cada país deve elaborar um documento similar que busque coletar e armazenar conhecimento científico e informações sobre diversas atividades relacionadas à RRD. “A ideia é promover a cooperação internacional e o compartilhamento de conhecimentos entre os atores envolvidos na implementação de medidas de RRD, para apoiar outros países”, ressaltou o especialista.

Mitigar os impactos

Quando os impactos das catástrofes são analisados, percebe-se que a pobreza e a desigualdade são temas indissociáveis deste debate. Vidya Diwakar reconhece que “desastres e mudanças climáticas podem reverter anos de ganhos em desenvolvimento”, uma vez que quando ocorrem em regiões socialmente vulneráveis, causam grandes impactos a longo prazo.

Para reverter esse quadro, a Rede Consultiva sobre Pobreza Crônica (CPAN, na sigla em inglês), na qual ela é pesquisadora sênior, realizou diversos estudos a respeito da pobreza crônica infantil e da dificuldade de manter fora da pobreza aqueles que já conseguiram sair. 

De acordo com dados expostos pela pesquisadora, entre 2000 e 2007, a seca foi um fator na redução da renda familiar na zona rural do Quênia. Para lidar com a imprevisibilidade da seca e do clima, e para permanecerem fora da pobreza, as famílias migram cada vez mais para a economia rural não-agrícola, ou seja, para atividades ligadas à prestação de serviços, à indústria, ao turismo e ao lazer. 

A economista reconhece que “uma recomendação chave para garantir que a agricultura continue a ser um caminho viável para sair da pobreza é o investimento e a adaptação, por exemplo, com relação a técnicas de conservação da umidade do solo, reorganização de sistemas agrícolas, engajamento em agricultura climaticamente inteligente e forte foco na irrigação”. Nitidamente, o papel da ciência e da tecnologia é essencial na tomada de decisões de RRD, conforme foi enfatizado pelo professor Toshio Koike.

As crianças estão incluídas no grupo mais vulnerável e mostram o quanto desastres afetam o bem-estar e serviços associados, como saúde e educação, de diferentes maneiras, durante diferentes períodos do desenvolvimento infantil e adolescente. Por esse motivo, tipos de políticas específicas são necessárias para cada estágio.

A pobreza e as desigualdades no contexto dos desastres

Na análise feita pela CPAN, as famílias que residem em áreas com muitos desastres foram encontradas em maior risco de pobreza crônica e empobrecimento na Índia, e também associadas com menor renda no Quênia rural. Dentre esses grupos mais pobres, além das crianças, as mulheres também são mais vulneráveis. Elas tornam-se facilmente empobrecidas no contexto dos conflitos decorrentes dos desastres e, muitas vezes, carecem de justiça e apoio. Esses resultados enfatizam a necessidade de se ter uma maior consideração das questões de equidade e inclusão na política, planejamento setoriais e nas respostas a desastres.

Dessa forma, a sessão mostrou que o clima e o risco de desastres devem ter um foco mais forte na política de desenvolvimento socioeconômico. Se o objetivo é reduzir a pobreza, “há uma necessidade não apenas de combater a pobreza crônica, parar o empobrecimento e sustentar a fuga da pobreza, mas, ao fazê-lo, assegurar que os países possam construir capacidades adaptativas para ajudar a apoiar os resultados do desenvolvimento infantil ao longo da vida”, contou Vidya Diwakar. Os desastres também podem ter efeitos intergeracionais, e assim, um foco na infância e no curso da vida são análises particularmente justificadas do bem-estar a longo prazo.

 

Leia outras matérias sobre o evento: