“Cantando espalharei por toda parte / Se a tanto me ajudar o engenho e arte”. Foi neste trecho do poema épico Os Lusíadas que o médico Marco Antonio Zago buscou inspiração para o título de sua conferência no Simpósio e Diplomação de Novos Membros Afiliados da ABC Regional São Paulo 2019-2023, realizado em 14 de março, na Universidade de São Paulo (USP). Utilizando dois exemplos bem sucedidos da história da medicina, Zago tratou sobre a convergência não só entre diferentes áreas dentro da ciência, como entre conhecimento e prática.

O Acadêmico Marco Antonio Zago durante a conferência.

O Acadêmico destacou o quanto o alinhamento entre áreas diversas da ciência, como engenharia, física e química, é importante para a conquista de grandes resultados por uma nação. Ele lembrou da chegada do homem à Lua, que em 2019 completa 50 anos, e dos esforços reunidos para tornar isso possível. Outro fator decisivo para este acontecimento foi a decisão política do governo norte americano de que o contato humano com a superfície lunar era uma prioridade nacional. “Essa é uma lição muito importante, e nós não fazemos isso no Brasil”, complementa Zago.

A partir dos logotipos de algumas instituições de ensino e ciência, o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) observou que no Brasil passou-se a delimitar domínios que são muito difíceis de se separar na prática. Por exemplo, a divisão entre ciência e tecnologia em Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ou a criação de mais uma área, a da inovação, em Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. “E do meu ponto de vista, só cria conflitos e confusões, ao invés de se fazer aquilo que se pretende, de dar ênfase”, defendeu Zago.

Imagem: Marco Antonio Zago

“Da comunidade para a prevenção”

O cientista citou dois casos onde foi possível transformar resultados de pesquisas em conhecimento para resolver questões concretas: o Framingham Heart Study e a criação do Imatinib. Sob a direção do Instituto Nacional do Coração, Pulmão e Sangue (NHLBI, na sigla em inglês), o Framingham Heart Study se comprometeu a identificar os fatores ou características comuns que contribuem para a doença cardiovascular. Os investigadores acompanharam o desenvolvimento de doenças cardiovasculares durante um longo período de tempo, em três gerações de participantes.

O estudo começou em 1948, em Framingham, Massachusetts, nos Estados Unidos, e continua até os dias de hoje. Ao longo dos anos, o monitoramento da população do estudo levou à identificação dos principais fatores de risco de doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial, diabete e sedentarismo, bem como informações valiosas sobre os efeitos desses fatores – como pressão arterial, níveis de triglicérides e colesterol no sangue, idade, gênero e problemas psicossociais.

Essas descobertas mudaram o panorama do mundo, provocando uma mudança de hábitos na população e fazendo com que a indústria farmacêutica passasse a investir em redutores de colesterol.

“Da biologia molecular para as farmácias”

Com a descoberta do Cromossomo Phipadelphia, que recebe este nome em homenagem à cidade onde foi descoberto, a ciência deu um grande passo no tratamento de pacientes com leucemia mieloide crônica, doença caracterizada pela presença do cromossomo na célula da medula óssea.

Quando se descobre que este cromossomo, fusão entre o gene BCR (grupo de pontos de quebra) e o gene ABL (Abelson), necessita de ATP (trifosfato de adenosina) para funcionar, a indústria farmacêutica produz um fármaco, o Imatinib, que ocupa o espaço do ATP e impossibilita essa alteração na célula de atuar.

Na prática, em 1998 o Imatinib passou a ser comercializado, e, em 2000, a mortalidade entre pacientes com leucemia mieloide crônica diminuiu significativamente.

Fonte: Marco Antonio Zago

Com esses casos de sucesso na medicina, o Acadêmico mostrou o poder da pesquisa médica de influenciar os padrões comportamentais da população e fundamentar o desenvolvimento de novos medicamentos.