Dan Marchesin, Pesquisador do IMPA

Flávio Salek, Pesquisador visitante do IMPA no programa ANP/PRH 32

matemática

Certa vez, o saudoso Professor Elon Lages Lima, do IMPA, disse que não entendia como alguém podia dizer que não gostava de matemática. Seria equivalente a dizer que não se importa com a ortografia, que escreve chuva com x.

De fato, a Matemática é uma linguagem e, com tal, pode ser compreendida por quem a estuda, ou parecer ideogramas chineses para quem não se interessa em conhecê-la. Para os que ensinam Matemática, é usual ter diante de si alguns rostos que olham para o quadro como se ali estivessem os arabescos de uma cultura distante. Esse é o dilema de um país onde os rudimentos da Matemática são mal ensinados no ensino fundamental. Quando, mais à frente a aluna ou aluno tenta recuperar o tempo perdido, confronta-se com o árduo desafio de aprender uma nova linguagem, o que para a criança é algo praticamente inato, mas para o adolescente é tarefa árdua.

Uma forma de reagir às dificuldades matemáticas é dizer que todos aqueles modelos não servem para nada. Concluída a Universidade, muitos passam pela vida sem precisar resolver uma equação do segundo grau. Para que estudar linguagem tão complexa se para nada irá servir?

Ao passar em revista provas de anos anteriores do ENEM, observa-se que as questões da prova de Matemática estão imbuídas de um grande esforço em fazer a ciência parecer útil. A começar pelo título da prova, agora chamada de “Matemática e suas Tecnologias”, para denotar a aplicabilidade da ciência. Percorrendo as questões, encontram-se enormes enunciados, que consomem tempo excessivo para sua compreensão, no intuito de ligar uma simples equação a uma situação real.

Ou seja, a aplicabilidade da Matemática está em questão. Ela pode ser um deleite de pensadores que buscam a quadratura do círculo. A própria Instituição na qual trabalho traz este dilema impresso em seu nome: Instituto de Matemática Pura e Aplicada. Como se coexistissem uma ciência pura, livre dos males do mundo, como um monge em um mosteiro, e outra uma matemática mundana, contaminada pela corrupção do mundo secular.

Nada mais errado. O que existe, como em todos os campos da vida, não só na Matemática, são os dilemas do homem, confrontado com problemas que deseja resolver. Às vezes, a realidade coloca-se mais próxima. Outras vezes, a ciência ainda precisa esperar pela realidade. A geometria Riemanniana precisou esperar mais de 50 anos para que fosse a ferramenta decisiva na solução de Einstein para a relatividade geral. Outros problemas, como os paradoxos gregos, precisaram esperar milênios para que a solução matemática do cálculo diferencial Newtoniano chegasse para resolvê-los.

É muito difícil traçar limites para a ciência. O que pode ou não ser feito, o que deve ou não ser pesquisado. Como comparar Pitágoras, deslumbrado pelas possibilidades abertas pelo traçado de uma altura de um triângulo retângulo e Newton, ao usar o cálculo diferencial para resolver os dilemas da física?