A segunda parte da sessão “Promovendo a Equidade de Gênero na Ciência: Experiências Brasileiras” contou com a apresentação de três projetos na tarde do dia 21 de agosto: Meninas na CiênciaEnergéticas e o ProgrAmazonas.

 

Meninas na Ciência
A professora do Departamento de Astronomia do Instituto de Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (IF-UFRGS), Daniela Pavani, apresentou o  projeto “Meninas na Ciência”, proposto em 2013 e acolhido como projeto de extensão do IF-UFRGS em 2014. Pavani é vice-coordenadora do projeto.

Segundo a palestrante, apesar das mulheres representarem 43% dos trabalhadores brasileiros, a participação feminina cai conforme sobe o nível hierárquico, chegando a no máximo 10% no topo das hierarquias. O recorte para áreas de ciência e tecnologia já é complicado: a cada 1000 jovens entre 25 e 34 anos que estão nas universidades, apenas 22 escolhem carreiras nas ciências exatas, dos quais apenas oito são mulheres.

Para tentar melhorar esse cenário, o “Meninas na Ciência” se propõe a atrair meninas para as carreiras de ciência e tecnologia, estimular aquelas que já tenham escolhido essas carreiras a persistirem e se tornarem agentes do desenvolvimento tecnológico do país e criar modelos que estimulem mais meninas.

Para atingir tais objetivos, o projeto faz uso de diversas ferramentas e atividades. Uma delas, que já acontece há quatro anos, é realizada em parceria com a TV da universidade e consiste na elaboração de pequenas entrevistas em vídeo. A cada ano é dado um foco diferente e, ao longo da existência da parceria, já foram entrevistadas mulheres no topo da carreira, alunas da pós-graduação, cientistas negras e transgêneras e até mesmo meninas do ensino médio e técnico.

O “carro-chefe” do projeto é o “Guria, partiu UFRGS!”, que leva em torno de 50 meninas do ensino público para o ambiente universitário da UFRGS para a realização de atividades e oficinas de física, astronomia e gênero. Este projeto, que acontece em parceria com outros dois programas de extensão – o Aventureiros do Universo e o Observatório Educativo Itinerante -, além de mostrar as instalações da universidade e o dia-a-dia dos profissionais e estudantes, também coloca a universidade no horizonte dessas jovens como um espaço possível para todas elas.

Além disso, o projeto também realiza campanhas e estudos. Um exemplo foram as campanhas #EsseÉMeuProfessor e a #EsseÉMeuColega, nas quais alunas e professoras, respectivamente, compartilhavam declarações machistas que já ouviram de professores universitários. Um dos estudos citados foi o Mapa do Medo, que mostrou como a causa e a percepção do medo são diferentes entre homens e mulheres.

 

Projeto Energéticas
A astrofísica  da Universidade Federal do Pampa (Unipampa – campus Uruguaiana) Eliade Ferreira Lima apresentou o Projeto Energéticas, que traz o tema das energias renováveis para a vida de inúmeras meninas do município de Uruguaiana, no Rio Grande do Sul. A cidade, fronteiriça com a Argentina e o Uruguai, possui, segundo a palestrante, forte cultura tradicional e machista, o que, a princípio, a fez duvidar que o projeto fosse dar certo.

A ideia nasceu a partir do “Cientistas do Pampa”, um grupo de mulheres que promovem a divulgação de ciência para meninas na região do Pampa Gaúcho, do qual Eliade é coordenadora. Cada mulher do grupo possui projetos de extensão relacionados à divulgação científica nas mais diversas áreas – física, astronomia, neurociência, entre outros. Porém, após abertura de um edital, elas decidiram criar o Energéticas, voltado para as ciências exatas.

“Atualmente, o projeto alcança, diretamente, 35 meninas de uma escola estadual da região, que possui cerca de 1.500 alunos e oferece educação fundamental e média, além de um curso de formação de professores. O diretor da escola, que é físico, apoiou o projeto e assim tudo começou”, contou Eliade.

As atividades realizadas envolvem visitação aos campi e laboratórios da universidade; visitas à usinas de geração de energia; capacitação para desenvolvimento de protótipos de geração de energia solar, eólica e de biodiesel; participação na feira de ciências da cidade e oficinas . Nestas,  as meninas constroem pilhas, microfones, entre outros e também assistem palestras com mulheres cientistas. “Elas nunca imaginaram que tinha uma astrofísica na cidade de Uruguaiana, que havia duas vencedoras de um Prêmio L’Oréal”, relatou Eliade.

Embora focando nos aspectos positivos, o projeto também toca em assuntos delicados. Por exemplo, Eliade achou relevante debater e alertar sobre assédios morais e sexuais que as meninas podem vir a sofrer, caso decidam pela carreira científica em um ambiente majoritariamente masculino. “Não apenas dizemos: ‘Meninas, vão para as Exatas’. Também dizemos ‘Quando vocês chegarem lá, vocês vão encontrar situações de dificuldade’”, comentou a astrofísica.

É importante destacar que, antes da instauração do projeto, foi discutido com as estudantes, os pais e professores o viés do trabalho e os temas que seriam tratados nas rodas de debate. Segundo Eliade, isso contribuiu para que muitos pais e mães se envolvessem no projeto e apoiassem a participação de suas filhas, bem como para que muitos professores prestassem atenção à questão da desigualdade de gênero no ambiente escolar e universitário.

 

ProgrAmazonas
O projeto, apresentado pela estudante de engenharia de computação pelo Centro Universitário do Estado do Pará, Jéssica Amorim, fundadora e coordenadora da comunidade PyLadies Belém e instrutora do projeto ProgrAmazonas, incentiva meninas a seguirem as carreiras da programação e computação na região amazônica e é organizado pela Fab Lab Belém. Esta é uma organização que possui laboratórios de fabricação digital no mundo todo. Fundado em 2014, o Fab Lab Belém é o primeiro da região amazônica e está localizado dentro da Universidade Federal do Pará (UFPA). Sua missão é fornecer um espaço onde o acesso a diferentes tipos de tecnologia possa ser democratizado.

Por ser uma região com um dos menores índices de desenvolvimento tecnológico do país, “as pessoas não são influenciadas a estarem próximas da tecnologia”, comentou a palestrante. Para suprir essa necessidade, o Fab Lab Belém promove algumas ações como o Open Day, um dia em que o laboratório fica aberto para visitações ou para receber pessoas que queiram palestras ou dar oficinas. Outra ação promovida é o ProgrAmazonas, que foca em ensinar programação para meninas do ensino médio de escolas públicas da região amazônica.

Jéssica comentou que, apesar de ser graduanda em engenharia da computação, em nenhum momento ouviu o nome de mulheres que foram importantes para a área. Como exemplos, ela citou Ada Lovelace, primeira pessoa a escrever um algoritmo; Grace Hopper, criadora da linguagem de programação intitulada COBOL; e Margaret Hamilton, que participou da programação da nave Apollo 1. Porém, esses exemplos são o ponto fora da curva, já que, segundo dados apresentados pela palestrante, apenas 8% dos desenvolvedores de todo o mundo são mulheres.

Para que as meninas do projeto possam ver que, embora pouca, há representatividade na área, o ProgrAmazonas foca em ter instrutoras mulheres, sendo elas professoras ou estudantes da área de computação. No projeto, as meninas aprendem linguagens de programação – Python e Arduino, por exemplo – e webdesign, focando em aplicações que façam sentido para elas.

A primeira turma do projeto, de programação em Python, foi finalizado em junho passado. No total, foram 27 alunas que, ao fim do projeto, elaboraram um jogo educacional com um tema escolar com o qual se relacionassem melhor. No começo e no fim do curso, um questionário sobre aproveitamento gerou os primeiros números do projeto: ao término, 86% das meninas disseram se sentir capazes de seguir na área de computação.

Confira outros projetos apresentados na sessão “Promovendo a Equidade de Gênero na Ciência: Experiências Brasileiras”:

“Contando Nossa História”, “Engenheiras da Borborema” e “Tem Menina no Circuito”
“Meninas no Museu”, “Parent in Science”, “Ciências da Terra – ON” e “NINA”

Saiba mais sobre o evento “Promovendo Equidade de Gênero na Ciência”:

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