Os Museus de Ciência foram tema de uma das mesas do VII Seminário Nacional do programa “ABC na Educação Científica”, que teve participação do Acadêmico Alexander Kellner (Museu Nacional/UFRJ), Ennio Candotti (MUSA), Ildeu de Castro Moreira (MCTI) e Robson Coutinho Silva (Espaço Ciência Viva). Coordenada por Alfredo Tolmasquim (Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia – IBICT), a mesa debateu como os museus podem ser espaços para a difusão e educação científica.

Fósseis para divulgar ciência

O geólogo do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Acadêmico Alexander Kellner falou sobre como o seu trabalho com fósseis pode ajudar a divulgar a ciência. “Dinossauros fascinam as pessoas. Todos gostam quando falamos dessa diversidade tremenda de animais que viveram há milhões de anos.” De acordo com o Acadêmico, a paleontologia tem uma grande interdisciplinaridade, principalmente com a geologia, mas também com as ciências biológicas, matemáticas, químicas e outras. “Já passou o tempo em que as pessoas imaginavam os paleontólogos imóveis olhando para os fósseis e essa nova imagem está relacionada às novas descobertas sendo feitas”, disse.

Segundo Kellner, a pesquisa de fósseis envolve uma grande diversidade de metodologias, utilizando até mesmo raio X e tomografia computadorizada. Os fósseis se relacionam, inclusive, com aspectos da economia de um país: “Microfósseis têm relação direta com a geologia do petróleo”. O pesquisador explicou que os fósseis forneceram as principais evidências de que, no passado, existia um continente único (Pangéia) que, com os movimentos das placas tectônicas, adquiriu a configuração atual. “Brasil e África se separaram na razão de 2 a 3 centímetros por ano. Por isso, não tem como deixar de falar das rochas. E por que não falar também do aspecto cultural? A Pietá, de Michelângelo, por exemplo, foi feita em uma rocha metamórfica”. Kellner referiu-se ainda aos falhamentos que ocorrem no interior da terra e são atuantes hoje em dia, provocando terremotos, e reiterou que os fósseis estão relacionados a todas as transformações ocorridas no planeta. “Aspectos como a variação do nível do mar alteram muito as condições do ambiente, provocando seca, El Niño etc”, comentou Kellner. “Hoje, a Antártida é um continente gelado e seco, mas no passado tinha vulcanismo, fauna e flora”.

Ele citou três exemplos de divulgação científica com os quais o Museu Nacional esteve diretamente envolvido. O primeiro foi a exposição “No tempo dos dinossauros”, realizada em 1999. “Graças a ela, a mídia descobriu que se fazia pesquisa sobre fósseis no Brasil.” O evento, que teve um grande impacto e foi capa de revistas, buscou mostrar a diversidade da pesquisa, e atraiu de 220 a 240 mil pessoas em nove meses. O segundo exemplo foi o “IV Science Centre World Congress”, realizado em 2005, no Rio de Janeiro. “Queríamos mostrar que ciência não é apenas aquilo que vemos na universidade e que existe o aspecto cultural”, contou o geólogo. “Tivemos apenas 20 dias para a montagem, mas o público foi bem variado.” Depois, ele citou a exposição “Saurier – modelos de sucesso da evolução”, realizada na Alemanha em 2006/07. “Foi exibido um filme maravilhoso e tinha reconstruções incríveis; as crianças podiam brincar com os fósseis. Não era arte, e sim paleoarte.” Essa exposição recebeu 280 mil visitantes em seis meses. “A principal diferença foi o tempo de elaboração e os recursos dos quais eles dispuseram, além da cobrança de ingressos. Tinha propaganda da exposição até no metrô”, revelou Kellner. “Ou seja, existe um potencial tremendo de divulgação científica envolvendo os fósseis.”

Museologizar a natureza

O diretor-geral do Museu da Amazônia (MUSA), Ennio Candotti, afirmou que acompanha a evolução do espaço desde que ele era “uma luneta e um terraço”. Ele falou sobre a importância de se valorizar a natureza: “Temos que museologizá-la, prepará-la para visitação e fazer com que o visitante encontre nela surpresas. Como é possível que um hectare de floresta em pé valha menos que um hectare de terra com um boi em cima?”. Segundo Candotti, valorizar a floresta é um desafio museológico, que precisa ser introduzido na política nacional. “Todos os museus foram projetos de valorização da história, da cultura, de gestos, incursões épicas”, justificou.

Candotti contou que, em Manaus, a floresta é considerada o lugar onde se joga lixo: “Não há nenhum tipo de simpatia por ela. Andar pela floresta não é considerado um passeio bonito – é úmido, com um monte de mosquitos”. Da mesma forma, existe o problema da água, que é vista com hostilidade, uma vez que ela permeia a vida de todos os habitantes da região. Muitas crianças vão para escola de barco, levando até quatro horas para chegar ao local. “Eles preferem cimento e carro.”

Para o palestrante, lidar com a Amazônia é lidar com um ambiente no qual, além dos objetos museológicos clássicos (folhas, peças, pássaros encalhados), há um universo de interações que não é explorado pelos museus. “Esse mundo é fascinante e não está tão longe das nossas possibilidades de museologização, como estava há dez anos”. Candotti acredita que, por esse caminho, é possível sensibilizar a juventude que está fascinada pelos dinossauros, mas não simpatiza tanto com folhas e pássaros. “Como museologizar a natureza? É um bom desafio para os próximos 50 anos.”

Espalhar a ciência pelo país

Representando o Departamento de Difusão e Popularização de C&T/SECIS, do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Ildeu de Castro Moreira defendeu que o debate deve tratar de espaços científicos culturais, uma vez que a palavra “museu” é reducionista: “Estamos pensando em sítios arqueológicos, jardins botânicos etc”. Ele definiu algumas linhas prioritárias para popularização da ciência e tecnologia (C&T): o apoio a espaços científico-culturais, citando o Programa Ciência Móvel; a presença maior e mais qualificada da C&T na mídia; a colaboração com a melhoria do ensino de ciências nas escolas; o apoio a eventos nacionais de/sobre divulgação científica e à formação de comunicadores em ciência, entre outros.

Moreira mencionou a importância de eventos como a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), que aproxima crianças e jovens da ciência. Ele também falou sobre a nova aba do Currículo Lattes voltada para a popularização de C&T, na qual o pesquisador deve inserir a descrição de atividades relacionadas ao tema. Além disso, definiu a inovação e educação como desafios brasileiros, enfatizando que a ação inovadora não acontece apenas nas empresas, mas também nos museus de ciência. Segundo o representante do MCTI, outro desafio é saber exercer a pressão política para que as coisas aconteçam: “Estamos há anos discutindo com o Ministério da Educação (MEC) para fazer um edital para os museus universitários”.

Para ele, um ponto importante é em relação ao turismo. “Temos que convencer que ciência dá público. Doze cidades brasileiras vão receber a Copa do Mundo em 2014, e gastam-se bilhões para fazer um estádio. Por que uma porcentagem disso não é usada para construir um parque cultural científico?” Moreira também enfatizou a necessidade de se espalhar a ciência pelo país. Existem 29 planetários no Brasil, sendo apenas um na região amazônica. “Quando forem construir um museu no Rio de Janeiro, temos que perguntar se é o lugar mais adequado para isso. Por que dar mais oportunidades para os mesmos?” Ele disse, no entanto, que o interesse dos brasileiros por ciência é grande, comparável com esporte, mas o acesso que as pessoas têm é muito pequeno. “Já tivemos um enredo de carnaval inspirado em Darwin e na evolução, que foi eleito pela população. A ciência dá samba”, comentou.

Viver a ciência

Por último, o vice-presidente do Espaço Ciência Viva, Robson Coutinho Silva, contou que a entidade é fruto de uma iniciativa de cientistas do Rio de Janeiro, que decidiram fundar uma ONG sem fins lucrativos para levar ciência à população. “Buscamos divulgá-la e desmitificá-la, tornando-a acessível ao senso comum e criando um canal de comunicação entre o cientista e o público”, informou o palestrante. “Temos a premissa de que compreender a natureza é um anseio do ser humano e todos devem ter acesso a ela.” De acordo com Silva, o espaço resgata o gosto pela experimentação e descoberta através de experimentos simples, participativos e lúdicos.

O Espaço Ciência Viva foi criado em 1983, e a placa de entrada do museu diz: “Por favor mexa em tudo, mas com carinho!” As atividades envolvem tangram, espelho anti-gravitacional, mas o experimento “Faça Você Mesmo” é o que faz maior sucesso, pois crianças de todas as idades podem observar as amostras que prepararam. “Temos desenvolvido novas mostras, normalmente financiadas pelo CNPq ou MEC. Uma delas foi uma exposição sobre a água, intitulada A água nossa de cada dia”, informou Silva. Ele também citou o “Projeto Ciência – sangue e cidadania”, que estimula as pessoas a conhecerem o sangue e as motiva a serem doadoras. Outra iniciativa são os “Sábados da ciência”, que promovem experiências temáticas.

“Temos a proposta de apresentar coisas novas a partir da perspectiva do pesquisador, além de tentar mesclar ciência e arte”, contou. “Apresentamos várias vezes a peça sobre o método científico, do professor e Acadêmico Leopoldo de Meis, e sempre participamos da Semana Nacional de Ciência e Tecnologia.” Silva finalizou afirmando que, no Espaço, não se fala de ciência. Vive-se a ciência.