Embora reconheça que a participação da mulher na sociedade avançou muito nos últimos anos, é impossível negar que exista machismo – e o mundo acadêmico é repleto disso. Essa é a opinião da farmacologista Maria Martha Campos, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), eleita como Membro Afiliado da ABC para o período 2011-2015. “É preciso ser firme, mas doce ao mesmo tempo. Não acho que tenhamos que provar que somos capazes como os homens. Temos que ser mulheres e, sem perder nada, fazermos o nosso trabalho da melhor forma possível”, argumenta a cientista.
Forte influência do ambiente familiar
Nascida em Criciúma, a capital brasileira do carvão, no interior de Santa Catarina, no ano de 1974, Maria Martha Campos teve uma infância muito boa, de criança de interior. Seus pais sempre trabalharam fora. Seu pai trabalhava no escritório de uma carbonífera e a mãe era professora primária, lecionando português. Sempre conciliou o trabalho na escola com os cuidados da casa e da família – para Maria Martha, caçula de cinco irmãos, de uma forma inacreditável. “Todos passaram para a universidade federal sem cursinho, hoje dois são engenheiros e dois são médicos”, conta, lembrando que se sentia na obrigação de seguir o exemplo e o padrão da família.
Suas matérias preferidas no colégio eram Português, História e, naturalmente, Biologia. Esse interesse levou à opção pela Odontologia, que cursou na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Na faculdade, fez iniciação científica no mesmo laboratório em que seu irmão, estudante de Medicina, havia feito três anos antes. “A iniciação científica foi uma das melhores coisas na minha vida acadêmica”, declara Maria Martha. Tanto foi que, no final da faculdade de Odontologia, ela já tinha decidido desistir da clínica para se dedicar integralmente à vida acadêmica. “Jamais me arrependi, nem considerei qualquer oferta para mudar o que tinha decidido, mesmo ponderando os aspectos financeiros”, reafirma a pesquisadora.
Terminou a faculdade com 21 anos e ingressou imediatamente no mestrado em Farmacologia, na mesma instituição. “A iniciação me ajudou muito e com isso defendi o mestrado em 18 meses, entrando para o doutorado com 23 anos. Uma semana depois já estava começando o pós-doc no Canadá”. Maria Martha reconhece a grande influência dos irmãos médicos em sua carreira, mas foi o Acadêmico João Batista Calixto, seu orientador da iniciação até o doutorado e, depois, em um segundo pós-doutorado, que a “contagiou”, em suas palavras, com sua paixão pela pesquisa.
E a paixão resultou em muita realização. Desde 2005, Maria Martha atua como revisora de diversos periódicos, como o British Journal of Pharmacology; Life Sciences; Planta Medica; Regulatory Peptides; Pharmacology, Biochemistry and Behavior; Brain Research; Journal of Medicinal Food; Oral Oncology; Revista Odonto Ciência; Plos One. Até o dia 19/03/2011, tinha publicado 70 trabalhos, com um total de 1429 citações.
Apaixonada pela “elegância” e dinamismo da ciência
Maria Martha se dedica à identificação de novos alvos para o desenvolvimento de estratégias para o tratamento de alterações crônicas envolvendo dor, inflamação e distúrbios de depressão, especialmente em casos relacionados com respostas infecciosas. Fascinada pelo que chama de “elegância” da Farmacologia, para ela o mundo da ciência não tem rotina e o pesquisador está sempre sendo surpreendido. “Inclusive o trabalho de orientação de alunos em diferentes níveis faz com que nós aprendamos o tempo todo, inclusive a melhorar a relação com as pessoas”, avalia.
A indicação para a ABC foi uma dessas surpresas – ela diz que nunca achou que isso pudesse realmente acontecer. “É muito gratificante e trouxe uma grande satisfação pessoal”, declara Maria Martha. Ser cientista, em seu ponto de vista, é coisa para poucos. “E acho que ainda preciso aprender muito para ser uma cientista de verdade”. Ela considera que egoísmo e preguiça são defeitos que um cientista não pode ter, “pois ninguém trabalha sozinho e, quando se gosta de verdade do que se faz, passar noites e finais de semana trabalhando, assim como anos sem férias, não faz diferença.”
Para Maria Martha Campos é comum que as pessoas no meio acadêmico percam o brilho nos olhos e a simplicidade à medida que a carreira avança. “Isso é uma pena”, diz ela, pois acha que os que conseguem manter essas características são os que se destacam – são aqueles capazes de “contaminar” os estudantes com a sua paixão pela pesquisa.