Informações desencontradas e pouco coerentes sobre as reais dimensões do acidente na central nuclear de Fukushima dificultam as análises sobre o desenrolar da situação. Enquanto as explicações das fontes oficiais indicam que tudo caminha para a normalidade, os fatos teimam em desmenti-las, dia após dia, revelando um quadro cada vez mais grave. Especialistas ouvidos pelo Globo respondem às maiores dúvidas envolvendo o acidente, com base nos últimos desdobramentos. No pior cenário, um vazamento equivalente a cem bombas de Hiroshima.

Qual o cenário mais provável?

“Que alguma radiatividade continue a escapar, mas que eles controlem a situação nos próximos dias. No fundo, sempre haverá os efeitos, mas será melhor se o vento soprar para o mar. Os japoneses são muito competentes e devem controlar a situação: já fizeram o mais importante, que foi evacuar as pessoas no raio de 20 quilômetros, o que não ocorreu em Chernobyl”, avalia o Acadêmico e físico Luiz Pinguelli Rosa (na foto ao lado), diretor da Coppe/UFRJ. “Não sabemos ao certo todos os procedimentos que estão sendo adotados. Um vazamento geral não deve ocorrer e a emissão de gases com produtos de fissão tem ocorrido de forma controlada”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), Edson Kuramoto.

E qual seria o pior cenário?

“Um grande derretimento parcial ou total dos núcleos dos reatores. Com isso, seria lançado à atmosfera o equivalente radiativo de cem bombas de Hiroshima. Não falo de explosão, porque o reator não explode como uma bomba atômica, mas a quantidade de material radiativo seria centenas de vezes maior”, afirma Pinguelli Rosa.

Mas a contenção não é projetada exatamente para evitar a liberação do material radioativo?

“Sim, mas, se houver derretimento do núcleo, pode haver uma grande liberação de hidrogênio, que é altamente inflamável. Isso pode provocar explosões. A contenção pode não suportar a pressão e romper. Seria como uma válvula de escape de emergência de uma panela de pressão”, explica Aquilino Senra Martinez, professor de engenharia nuclear da Coppe/UFRJ.

Se, de fato, houver vazamento, para onde vai a radioatividade?

“Dependendo das condições climáticas, de ventos e chuvas, pode haver maior deposição do material radioativo em torno da usina ou dispersão para locais distantes”, diz Martinez. “Seria pior se o vento levasse (a radiação) para as áreas populosas do país, como Tóquio. As pessoas teriam de ficar trancadas em casa até se dissipar essa radiação, o que poderia levar dias”, afirma Pinguelli. “Até ontem (anteontem) o vento estava na direção do mar, se continuar assim, será mais difícil afetar o sul do país”, diz Kuramoto.

Houve falha técnica?

“Evidente que isso tudo é uma grande fatalidade. Mas o prédio não caiu por conta do terremoto, não houve desmoronamentos parciais, a construção não foi arrasada pelas ondas. Houve um erro de projeto grave: o gerador não funcionou e, por isso, o reator começou a esquentar. Qualquer instalação comercial tem alimentação de emergência, com gerador a diesel. Parece que uma onda atingiu o tanque de combustível dos geradores, impedindo seu funcionamento. Mas isso é uma falha”, afirma Martinez. “Houve uma grande falha técnica que é o gerador a diesel ter sido atingido pela tsunami. Ele deveria estar involucrado em um prédio para não ser danificado”, concorda Pinguelli Rosa.

Por que não conseguem resfriar os reatores, impedindo seu derretimento e uma catástrofe maior?

“Isso é o que nenhum boletim explica”, diz Martinez.