Com estudantes assistindo em pé e outros pela janela, o Acadêmico Ângelo da Cunha Pinto deu sua visão pessoal sobre a Química e as plantas da Amazônia. Ele afirmou que os químicos se interessam por estudar plantas porque cada planta é como uma fábrica de produtos químicos. Cada fábrica se especializa na produção de metabólitos secundários, que são que estruturas químicas.


Prof. Angelo Pinto em sala lotada na UFAM, em Manaus

“Alguns químicos se interessam por desvendar o mistério dessas estruturas, saber qual é o arranjo espacial desses átomos nessas substâncias que as plantas produzem”. Cunha Pinto explicou que essas substâncias são fonte de inspiração para outros químicos – os orgânicos e os de síntese-, que buscam produzi-las sinteticamente em seus laboratórios.

Cada um desses grupos de estruturas complexas se caracteriza por um novo processo de arquitetura para cada uma dessas moléculas, sendo também fontes de inspiração. “Outros químicos já se interessam pelas atividades de cada uma dessas substâncias produzidas pelas plantas. Surgem então trabalhos em colaboração de químicos e biólogos, os primeiros trabalhando no isolamento e na determinação estrutural e os últimos no levantamento das determinadas atividades biológicas”, esclareceu o Acadêmico.

Esta é a meta das grandes empresas farmacêuticas: na medida em que haja uma prospecção, chegar com substâncias naturais na clínica médica. O objetivo é que essas substâncias cheguem à Medicina, passando a fazer parte do arsenal terapêutico. Dois alcalóides anti-leucêmicos já foram introduzidos na clínica nos anos 70 pelos EUA, o que mostra o descompasso: há mais de 30 anos os países desenvolvidos já têm produtos com atividade biológica importantes disponíveis nas prateleiras das farmácias.


A grande vedete do momento, por exemplo, é o taxol, um anti-tumoral que foi isolado em 1971 da casca do teixo-do-pacífico (Taxus brevifolia), a partir de uma prospecção realizada nos EUA. Depois de 20 anos essa substância chegou ao mercado e foi a descoberta de maior sucesso da indústria farmacêutica das últimas décadas. “A síntese química é importante porque, para se obter 25Kg de taxol puro, são sacrificadas 38.000 árvores, pois a substância só está presente nas cascas”, esclareceu o professor, ressaltando que a empresa que comercializa a substância está tendo dividendos excelentes. “Embora três brasileiros tenham estado envolvidos no projeto, este não trouxe dividendos para o Brasil. Mas trouxe aprendizado”, diz Cunha Pinto.

O químico explicou que entre a descoberta de uma substância e aprovação de um fármaco decorrem entre 15 e 20 anos. Os primeiros três a cinco anos são dedicados a descoberta e estabelecimento de um protótipo da substância. Nos três anos seguintes, ocorre o desenvolvimento pré-clínico, que envolve testes in vitro, estudos de farmacodinâmica, farmacocinética e toxicologia. Em seguida vêm os estudos clínicos, que se dão em três fases, tomando em torno de seis anos. Por fim, vem o processo de aprovação do fármaco, que leva geralmente três anos. Este tempo vem caindo, dependendo dos artigos encontrados na literatura – nos EUA, atualmente, o processo todo leva em torno de oito anos, principalmente nos produtos anti-virais.

É importante, então, estudar as plantas, pergunta o professor. Sim, porque dentre os fármacos aprovados entre 1981 e 2006, por exemplo, grande parte foi produzida pelas plantas ou são substâncias que, através de algumas transformações químicas (semi-síntese), vão gerar o fármaco. Ou podem servir de inspiração para a síntese de outras substâncias. “Do total, 5% dos fármacos aprovados foram produtos naturais – sendo um de origem marinha -, 23% derivados de produtos naturais, 24% sintéticos miméticos e 30% de produtos sintéticos. As vacinas correspondem a 4% do total e os produtos biológicos a 14%”, contabiliza o especialista.

Em torno de 50% dos fármacos comercializados têm uma identidade com substâncias naturais: não só vegetais, mas também organismos marinhos, que são as grandes estrelas das empresas farmacêuticas. “Grande parte das substâncias lançadas nos últimos anos têm origem marinha. Se formos capazes de fazer a prospecção dos mares, encontraremos substâncias importantes”, indicou Cunha Pinto.


Pau-rosa

Não é só em relação à Medicina, no entanto, que as plantas interessam aos químicos. Há também as substâncias odoríferas. O pau-rosa, ou Aniba rosaedora, originada da Amazônia, é a matéria prima do famoso perfume Chanel no 5 e do sabonete Phebo tradicional. “O litro do óleo custa R$ 50 e um vidro do perfume custa R$150, o que dá uma noção do valor econômico de produtos da floresta”. Segundo Cunha Pinto, o princípio ativo começou a ser extraído em 1921 na Amazônia. Em 1991 já tinham sido abatidas mais de dois milhões de árvores.

“Hoje está aqui presente o Prof. Lauro Barata, que trabalha com as folhas do pau-rosa. Com essa técnica, não há mais necessidade de derrubar as árvores – através de um processo sustentável, essa substância pode ser extraída. O emprego dessas substâncias de origem amazônica na cosmética está crescendo muito”, concluiu o químico.