O relatório de avaliação das atividades do Acordo de Cooperação Brasil-Índia será apresentado na 4ª Reunião do Conselho Científico Brasil-Índia, que será realizada em 15/9, em Nova Délhi. O grupo brasileiro incumbido da apresentação conta com o presidente da ABC, Jacob Palis, o chefe do escritório internacional da ABC, Dr. Paulo de Góes Filho, os Acadêmicos Eloi Garcia, coordenador da área de Ciências Biomédicas e Virgilio Almeida, coordenador da área de Ciências da Computação.
O Acordo de Cooperação Brasil-Índia na área de Ciência e Tecnologia foi firmado em 2003, em convênio assinado entre os dois governos. Cada governo designou um presidente, um coordenador para cada área e representantes de organizações nacionais diretamente interessadas em cada área. As áreas definidas como prioritárias são Biotecnologia, Ciências do Mar, Tecnologia dos Materiais, Metrologia e Tecnologia da Informação.
A primeira reunião do Conselho foi realizada no Rio de Janeiro, em 2005. O segundo encontro teve lugar no Indian Institute of Science, em Bangalore, no ano seguinte. Dessas reuniões resultou um plano de trabalho, fechado no terceiro encontro, realizado no Brasil em 2007. Nesse plano foi incluída a área de Biocombustíveis. O financiamento desses encontros adveio de recursos da área de cooperação internacional do CNPq, até que finalmente recursos específicos foram alocados pelo MCT.
Foram realizados, até o momento, seis workshops – nas áreas de Fármacos, Nanotecnologia, Biomédicas, Física, Computação e Matemática. Uma única área, a de Bioenergia, ainda não foi atendida, estando prevista a realização de dois workshops nessa área.
Workshop sobre Fármacos
O primeiro workshop, realizado no Rio em 2007, contou com uma apresentação do Dr. Samaninathan Sivaram, diretor dos Laboratórios Nacionais de Pesquisa Química da Índia, seguida de um debate sobre os passos críticos da indústria farmacêutica indiana, com ênfase no papel das políticas públicas e privadas na produção de medicamentos genéricos e novos produtos químicos.
Depois da apresentação ocorreu uma discussão sobre os fitoterápicos e novos produto derivados de plantas, onde se debateu a experiência indiana e brasileira no aproveitamento dos conhecimentos tradicionais e os novos derivados utilizados pela grande indústria farmacêutica. Foram discutidas também as práticas regulatórias sobre o uso da biodiversidade e seus benefícios.
Um grande debate girou em torno da superação do fosso existente entre a ciência e a indústria. Foram discutidas as boas práticas laboratoriais, os testes pré-clínicos, as práticas de licenciamento e as práticas burocráticas das agências reguladoras. O desenvolvimento e produção pela indústria, os ganhos de escala, os processos de comercialização para os fitoterápicos e a questão das patentes foram outros dos temas debatidos pelo grupo de 15 representantes dos dois países.
Nanomateriais e outros materiais moleculares
Ocorrida em outubro de 2007, a missão brasileira à Índia contou com a participação dos Acadêmicos Fernando Galembeck, da Unicamp e Cid B. de Araújo, da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). O grupo de cientistas brasileiros participou do Indo-Brazil Workshop on Molecular Materials Including Nanomaterials, em Pune, Índia, e da 10th International Conference on Advanced Materials (ICAM 2007), em Bangalore, esta última com mais de 1.200 participantes.
Os representantes da comunidade científica brasileira mostraram bastante satisfação com os resultados destes encontros, que além de fortalecerem os laços com seus pares indianos abriu outras portas, dado o caráter internacional dos eventos. Os participantes visitaram o laboratório do membro estrangeiro da ABC e Prêmio Nobel C.N.R. Rao, no Jawaharlal Nehru Centre for Advanced Scientific Research (JNCASR), em Bangalore, além de outros centros de pesquisa.
Segundo Galembeck, foi possível observar a alta qualidade e o elevado número de laboratórios ativos e muito bem equipados na área. O Acadêmico considerou a posição da Índia muito vantajosa em relação à do Brasil, vendo como muito boas as perspectivas com relação aos ganhos científicos e de capacitação de pessoal que o Brasil pode obter a partir deste acordo. Em sua opinião, o intercâmbio deverá focalizar as instituições indianas que contem com facilidades residenciais no campus, especialmente o Indian Institute of Science e o Jawaharlal Nehru Center, ambos em Bangalore.
A próxima reunião deve ocorrer em outubro-novembro de 2008, quando os projetos aprovados nos Editais brasileiro e indiano de intercâmbio já terão produzido resultados.
Doenças infecciosa
O terceiro encontro realizado no âmbito do Acordo Brasil-Índia em C&T ocorreu em Bangalore, na Índia, em janeiro de 2008. A delegação brasileira foi composta por seis membros, estando entre eles os Acadêmicos Eloi S. Garcia, Wanderley de Souza e Erney Plessmann de Camargo.
Eloi Garcia foi um dos palestrantes da cerimônia de abertura, realizada pelos organizadores do evento. Erney Camargo, especialista em malária, apresentou a situação da pesquisa no Brasil em relação a esta doença, assim como os pesquisadores Dr. S. Sharma, H. Balaram, U. Tatu, e N. Surolia o fizeram em relação à Índia. Wanderley de Souza falou sobre a situação da leishmaniose no território brasileiro, indicando as principais linhas e grupos de pesquisas na área, e os Drs. H.K. Majumder, S. Roy, A. Mukhopadhyay e C. Shaha falaram pelo lado indiano. Ainda foram discutidas a AIDS, a tuberculose e a lepra.
Após amplo debate, os pesquisadores decidiram realizar projetos em colaboração nas áreas de Parasitologia (leishmanioses e malária), Microbiologia (tuberculose) e Virologia (HIV/AIDS) para serem apresentados como projetos comuns colaborativos à Academia Brasileira de Ciências e ao Department of Science and Technology.
Física da Matéria Condensada
Coordenado pelos Acadêmicos Amir Caldeira, Belita Koiller e Luiz Davidovich, este workshop ocorreu em abril de 2008, no Rio de Janeiro. O coordenador indiano, Sushanta Dattagupta, diretor do Indian Institute of Science Education and Research (IISER), em Kolkata, trouxe uma delegação composta por nove membros de diversos institutos de pesquisa indianos.
De acordo com os organizadores, os institutos de pesquisa na Índia são bem apoiados e financiados, o que já não ocorre com as universidades. Os institutos absorvem os pesquisadores que concluem o mestrado, mas as universidades ainda continuam sem área experimental. No Brasil, um dos maiores problemas da área é a falta de integração entre a universidade e os setores industriais e tecnológicos. A universidade é tradicionalmente voltada para a pesquisa básica e faltam oportunidades em pesquisa e desenvolvimento no país, já que as empresas investem pouco em inovação tecnológica.
O desenvolvimento científico dos dois países é correspondente, tanto em termos de qualidade como de volume, daí as boas possibilidades de interação. As dificuldades, porém, também se assemelham, como as disparidades regionais, acentuadas na Índia pelo sistema de castas.
Entre os palestrantes brasileiros estavam os Acadêmicos Carlos Alberto Aragão de Carvalho (UFRJ), Luiz Nunes de Oliveira (USP-São Carlos), Mauricio Coutinho (UFPE) e Mucio Continentino (UFF).
Ciência da Computação
Realizado em junho de 2008 no Rio de Janeiro, este workshop foi organizado pelo Acadêmico Virgílio Almeida e pelo Dr. N. Balakrishnan, do Indian Institute of Science, que ressaltou a importância do encontro, destacando o “peso científico” da delegação indiana.
Almeida apresentou um panorama da área de Ciência da Computação no Brasil e citou os grandes desafios de pesquisa na área para os próximos dez anos, posicionando a delegação indiana sobre a situação no Brasil e as perspectivas futuras. Os Acadêmicos Pedro Leite da Silva Dias, Edmundo de Sousa e Silva e Roberto Boisson de Marcatambém proferiram palestras, entre as 20 realizadas. Todas focalizaram temas avançados de pesquisa e temas de interesse social e estratégico para os dois países, como tecnologias da informação e comunicação para regiões emergentes e cybersegurança.
O workshop mostrou alguns pontos interessantes e comuns aos dois países. Na Índia, está em curso um projeto do governo para ampliar consideravelmente a capacidade de formação em Ciência e Engenharia, com o objetivo de passar de sete para 13 o número dos Indian Institute of Technolgy (IIT) e aumentar o número de Indian Institute of Information Technology (IIIT) para cinco.
Os números relativos à capacidade de formação de mestres e doutores em ciência da computação são similares. Há, no entanto, na Índia uma clara escassez de PhDs na área para contratação pelas universidades, dado o fato de que as indústrias de TICs contratam todo o pessoal formado no país. Há a previsão de que o setor de tecnologia da informação (TI) venha a representar 8% do PIB da Índia em 2015. Por ser considerado um setor crítico e estratégico para aquele país, uma das missões da área científica é pesquisar métodos e algoritmos de segurança e criptografia, projeto que envolve nove institutos de pesquisa na Índia.
Há uma oportunidade clara de colaboração na formação de mestres e doutores nos dois países, principalmente porque se observa um perfil complementar nos dois sistemas, já que o sistema educacional indiano tem hoje uma ligação muito forte com a indústria, colocando a maioria de seus mestres e doutores nas empresas e indústrias.
Há um interesse comum na pesquisa de tecnologias da informação aplicadas às áreas de saúde, educação e linguagens naturais, vistas como uma possibilidade de contribuição do conhecimento científico a grandes contingentes populacionais dos dois países. Há também uma série de problemas ligados a arquitetura de redes nacionais envolvendo infra-estrutura de redes sem fios e outras dificuldades em comum.
Matemática
O 1º Simpósio Indo-Brasileiro de Matemática foi realizado no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA), Rio de Janeiro, em julho de 2008. Participaram da reunião 19 matemáticos da Índia e 52 do Brasil, além de estudantes e outros interessados.
O escopo da reunião foi bastante amplo, envolvendo os temas de sistemas dinâmicos e teoria ergódica, equações diferenciais parciais, probabilidade, física matemática, teoria de operadores e geometria algébrica. O nível científico foi excelente e pode-se concluir que ambas as comunidades matemáticas tiveram uma visão ampla do que se passa nos dois países em pesquisa cientifica. Vários planos de intercâmbio de cientistas, inclusive em nível de pós-doutorado, foram estabelecidos, e foi agendado um próximo Simpósio para dezembro de 2009, na Índia.
O Comitê Organizador do workshop foi composto pelos pesquisadores indianos Kalyan B. Sinha e Shrikrishna G. Dani e pelos Acadêmicos Aron Simis (UFPE), Antonio Galves (IME/USP), Djairo Figueiredo (Unicamp) e Jacob Palis (IMPA). Participaram ainda, como palestrantes, os Acadêmicos Abramo Hefez, Arnaldo L. P. Garcia, Artur O. Lopes, Claudio Landim, Israel Vainsencher, Marcelo Viana, Márcio G. Soares, Marcos Dajczer, Paulo Cordaro e Welington C. de Melo.
Um programa bem sucedido
O Programa Brasil-Índia é um modelo bem sucedido para a implementação de programas de cooperação. Países com níveis de desenvolvimento equivalentes não têm, necessariamente, os mesmos níveis de desenvolvimento científico ou educacional em todas as áreas. No caso do Brasil e da Índia, que têm desenvolvimento científico equivalentes, tanto em qualidade em volume, há um elevado nível de complementaridade de áreas, o que beneficia a emergência de projetos conjuntos com alto grau de sucesso.
O modelo institucional adotado, com a constituição de um Conselho Científico formado por cientistas de grande projeção internacional dos dois países e que exercem, também, a coordenação de áreas no âmbito da implementação, foi fundamental para o extraordinário sucesso da execução do programa. Esse sucesso vem sendo amplamente reconhecido, tanto pela comunidade científica como pelo Ministério das Relações Exteriores, que concorda que essa iniciativa sirva de base para outras semelhantes.