A Academia Nacional de Medicina (ANM), Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a RedeVírus do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) promoveram simpósio sobre desafios que a ciência ainda enfrentará na vacinação contra a COVID-19. Na abertura do evento, o presidente da ANM, Rubens Belfort, ressaltou a inquietude que nos move diante desse cenário com tantas perguntas ainda sem respostas. O presidente da ABC, Luiz Dadidovich, reforçou os laços que unem ambas as instituições.

Vacinas brasileiras contra COVID-19, ensaios clínicos e opções terapêuticas com e sem evidências científicas foram temas debatidos por vários convidados. Entre os quais, os acadêmicos Marcelo Morales, Patrícia Rocco e o ex-ministro da Saúde, José Gomes Temporão. O acadêmico Marcelo Morales, um dos organizadores do evento e secretário do MCTI, apresentou propostas de imunizantes nacionais. O projeto de vacina Spintec, uma parceria do MCTI com a Universidade Federal de Minas Gerais, em duas estratégias: uma vacina bivalente contra gripe sazonal eCOVID-19. E a outra que é Versamune com proteínas recombinantes do Sars-Cov2, já protocolada na Anvisa e em fase pré-clínica concluída, sendo capaz de ativar respostas humoral, celular e inata. 

No campo das pesquisas em vacina, outro convidado foi o médico Jorge Kalil, que mostrou o projeto de desenvolvimento de uma vacina brasileira de aplicação nasal diretamente na mucosa e não injetável com a indução de anticorpos neutralizantes das células do sistema imune, T CD4 e CD8, bem como memória longa, sem efeitos adversos graves, com ampla cobertura de proteção, estabilidade térmica, preferencialmente monodose, cujo domínio tecnológico seja completamente brasileiro para produção também à baixo custo. 

– Queremos fazer uma vacina nasal, porque o vírus entra no nariz. Muitas pessoas vacinadas continuam com o vírus no nariz e transmitindo a doença. Então, se nós tivermos uma vacina nasal, conseguiríamos parar a transmissão do vírus. 

A acadêmica Patrícia Rocco falou sobre a evolução do conhecimento a respeito das manifestações clínicas provocadas pelo SARS-CoV-2 e apresentou diversos estudos sobre tratamentos com e sem evidências científicas e ressaltou, mais uma vez, a ineficácia de medicamentos do kit-covid-19. 

O ex-ministro Temporão fez um relato histórico sobre o Programa Nacional de Vacinação (PNI). Criado durante a ditadura militar, o PNI foi por muito tempo um exemplo para o mundo em virtude de sua capacidade de vacinar 300 milhões de brasileiros ao ano, seja em campanhas em um único dia contra doenças como a pólio ou em ações para enfrentar vírus como o H1N1 ou influenza. Temporão ressaltou a importância dos investimentos nos laboratórios públicos e criticou a dependência que ainda existe em importações seja de princípios ativos ou de vacinas tradicionais e modernas.

O evento ainda contou com a participação do pesquisador da Fiocruz Maurício Barreto que abordou, entre outros aspectos, os efeitos diretos e indiretos da epidemia. Como indiretos, citou as doenças mentais e a desnutrição. E apontou como decepção o papel da aliança da OMS pela distribuição equânime de vacinas. Já o pesquisador Claudio Struchiner, da Fundação Getúlio Vargas, trouxe modelos matemáticos e análises para adoção de estratégias vacinais. 

Da Anvisa, Gustavo Mendes esclareceu questões regulatórios no desenvolvimento de vacinas brasileiras e refletiu sobre futuros ensaios clínicos e como recrutar voluntários em uma população vacinada. Mendes ainda fez um apelo, solicitando à comunidade científica que colabore com a Anvisa no respaldo de estudos com fortes evidências científicas. A demógrafa brasileira Marcia Castro, professora em Harvard também participou do evento. Castro apresentou estudos sobre a curva epidemiológica de óbitos em queda a partir da vacinação por faixas etárias, demonstrando a eficácia da estratégia.

Variabilidade e resposta imune – Outro ponto debatido foram as excelentes evidências de que a resposta imune celular é eficaz contra a infecção da covid-19 e indícios mostram que é mais duradoura que a resposta imune humoral. É neste contexto que surge a necessidade de novos estudos e novas vacinas, além do fato das atuais não estarem disponíveis de forma global, como reforçou Mauro Teixeira, da UFMG que explicou a importância e o conceito de immunobridging (vacinas atuais, modificadas e novas vacianas). Outro convidado da UFMG foi o virologista molecular Renato Aguiar, que centrou sua fala nas variantes da covid, a importância do monitoramento das cepas circulantes e como a epidemia foi incendiada pela mobilidade humana.

– Determinar algum componente da resposta imune contra a vacina que vai permitir que, ao medi-la como marcador (correlato de proteção), você infira eficácia ao candidato vacinal. Assim, conseguiremos modificar vacinas existentes para lidar com as variantes emergentes, novas faixas etárias e reforço vacinal ou criar novos estudos vacinais, ressaltou Teixeira. 

Finalizando as apresentações, Cristiana Toscano – Universidade Federal de Goiás e membro do grupo de expert em vacinas covid-19 da OMS. Toscano explicou o papel, as políticas e estratégias de imunização, incluindo vacinas e tecnologia, vigilância e monitoramento, população alvo e priorização, recomendações de uso na prática de programas de vacinação com recomendações baseadas em evidências. 

A partir deste simpósio, os pesquisadores Esper Kallas, Jorge Kalil, Manoel Barral, Marcello Barsinski e Patricia Rocco participarão do Grupo de Trabalho da RedeVírus do MCTI para delinear projetos e acompanhar a população vacinada, bem como avaliar o impacto das variantes nessa população. 

 

Fonte: Academia Nacional de Medicina