Como parte do evento Grandes Projetos de Colaboração Internacional da Ciência Brasileira, organizado pela ABC e SBPC, em 12 e 13 de setembro, os Acadêmicos João Steiner e Ricardo Galvão apresentaram os projetos Gemini, SOAR, GMT e CBERS. O encontro reuniu os coordenadores dos principais projetos de grande porte, multiusuários e integralmente vocacionados para a colaboração internacional, que discutiram no auditório da Academia Brasileira de Ciências seus projetos e formas de financiamento.

SOAR, Gemini e GMT

O Acadêmico João Steiner, professor titular do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP), apresentou grandes telescópios internacionais de cujos consórcios o Brasil é membro.

O Southern Astrophysical Research Telescope, ou abreviadamente SOAR, é um telescópio óptico com espelho primário de 4,1 metros de diâmetro, projetado para produzir imagens de alta qualidade em sua categoria. Suas atividades foram iniciadas no ano de 2001.

Através do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), o Brasil integra o consórcio que o financia, junto com os Estados Unidos, por meio do National Optical Astronomy Observatory (NOAO), a Universidade da Carolina do Norte (UNC) e a Universidade Estadual de Michigan (MSU). Na fase de construção, em 1998,  a contribuição brasileira foi de 17.5 milhões de dólares, sendo U$12 através do CNPq e U$5.5 oriundos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

As instalações do SOAR são compactas e eficientes, comportando o trabalho com a instrumentação e uma sala de controle. No alto do prédio de 757 m2 está uma cúpula esférica de 20 m diâmetro, fabricada por um grupo de empresas brasileiras, todas do estado de São Paulo:  Equatorial Sistemas e Fibraforte, de São José dos Campos; Santim, de Piracicaba; e Atlas Metalúrgica, da cidade de São Paulo.

Construção da cúpula do telescópio SOAR

O telescópio SOAR está configurado para permitir que astrônomos possam realizar observações remotas a partir de qualquer lugar do mundo, com o mínimo de exigências de “hardware” e conectividade.

O programa de instrumentação do SOAR, segundo Steiner, também foi realizado pom um grupo de empresas brasileiras, de São Paulo e de Minas Gerais. A parte eletrônica foi feita pela Solumnia, de Araraquara; a mecânica fina, pela Metalcard, de São José dos Campos; a usinagem mecânica pela Equitecs, de São Carlos; a anodização pela Anodont, de Ribeirão Preto, todas situadas em São Paulo. Já o estado de Minas Gerais contribuiu também na usinagem mecânica, através da Erominas e da Usinagem Moabe, ambas de Itajubá, onde também se localizam a OIO, responsável pelas fibras óticas, a Zetalabs Brasil, que cuidou da modelagem e vibração. Os circuitos impressos foram produzidos pela Cirvale, que fica em Santa Rita do Sapucaí.

Telescópios Gemini Sul e SOAR

Está situado em Cerro Pachón, a 2.700 metros acima do nível do mar, nos Andes chilenos. Fica a menos de 1km do telescópio Gemini Sul, com espelho de 8,1 metros de diâmetro. Esta proximidade possibilita o compartilhamento de instrumentação e a utilização de suas instalações quando necessário.

O Observatório Gemini, com dois telescópios, como sugere o nome, mantém o “gêmeo” no Havaí. O Brasil também integra este consórcio, com direito a oito noites por ano em cada um dos telescópios, de forma proporcional à parcela de contribuição de cada participante – Brasil, EUA, Canadá, Coreia e Argentina – na sua construção e manutenção. O CNPq investiu 4.6 milhões de dólares em 1993 e, desde então, o Ministério de Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC), por meio do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), vem contribuído com 1.9 milhões de dólares por ano.

No entanto, em termos de produção de artigos científicos, segundo Steiner, a produção brasileira excede o percentual que lhe caberia, de acordo com as horas de uso correspondentes a sua participação. O Acadêmico mostrou em gráficos que as publicações baseadas em dados e instrumentação dos telescópios Gemini e SOAR com autores brasileiros vem crescendo 17% ao ano desde o início do século XXI.

Steiner referiu-se também ao Telescópio Gigante de Magalhães (GMT, na sigla em inglês), composto pelos sete dos maiores espelhos ópticos já feitos para formar um único telescópio. Ele tem 25.4m de diâmetro e foi produzido na Universidade do Arizona (EUA).

GMT – ilustração

O consórcio do GMT envolve instituições da Austrália, Brasil, Coreia, Brasil e Estados Unidos.

As motivações científicas para a cooperação no GMT envolvem a busca de planetas extra-solares, a pesquisa em química e população estelar, o entendimento do processo de construção de galáxias, o estudo do crescimento dos buracos negros e a física cosmológica, entre outros.

O CBERS

O Acadêmico Ricardo Galvão, diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), apresentou o projeto CBERS (China Brazil Earth Research Sattelite, um programa de cooperação tecnológica entre China e Brasil para produção de uma série de satélites de observação da Terra. O convênio, firmado há 30 anos, vem sendo conduzido pela Academia Chinesa de Tecnologia Espacial (CAST, na sigla em inglês) e o INPE.

Os dados de observação da Terra obtidos pelos satélites são de acesso livre e têm ampla aplicabilidade, como para a agricultura, águas, solos, florestas, cidades, clima e desastres ambientais.

Desastre do Rio Doce: imagem de câmera MUX do CBERS 4 um mês após rompimento da barragem

Segundo Galvão, o projeto foi muito bem montado no aspecto de desenvolvimento de tecnologia, exigindo inclusive que componentes sejam encomendados a empresas brasileiras. Até o CBERS 2A, a China entrava com 70% dos recursos e o Brasil com 30%. Mas, de lá para cá, os custos e as responsabilidades passaram a ser divididas igualmente. Cinco satélites já foram construídos, sendo que alguns foram finalizados na China e outros, como o CBERS 4, no Brasil. “Mas em termos científicos, a colaboração é bem mais difícil”, apontou o Acadêmico, identificando os pontos fracos da parceria. “A algumas tecnologias estratégicas, como controle de órbita e de altitude, por exemplo, não temos acesso. Isso impede que sejamos independentes, pois conhecimentos importantes são sonegados. A colaboração em resultados e aplicações científicas, também, é insignificante.”

CBERS 4

Os aspectos positivos, em sua visão, envolvem o forte desenvolvimento da engenharia de sistemas de satélites no Brasil . “Isso está contribuindo para fortalecer a a indústria espacial brasileira, que ainda não está consolidada. Para o INPE, o saldo é muito positivo com relação à experiência construída em observação do nosso planeta por satélite. E é uma vitória, em termos de imagem internacional, uma parceria Sul-Sul tão bem sucedida. O modelo gera respeito dentro da comunidade científica”, apontou Galvão.