Vera Val, Doyle McKey, Jean François Bach, Alexandre Aleixo e Marie Anne van Sluys

O segundo dia do Simpósio Brasil-França sobre Biodiversidade, 6 de junho, foi aberto com sessão que contou com os pesquisadores Marie-Anne Van Sluys , Vera Almeida e Val, Alexandre Aleixo, Jean François Bach e Doyle McKey. O foco foram os impactos que o homem causa ao ambiente e outros fatores que estão causando problemas na região amazônica.

Diversificação evolucionária

A professora titular do Departamento de Botânica da Universidade de São Paulo (USP), Marie-Anne Van Sluys, explicou que a biodiversidade existente hoje é resultado de uma diversificação evolucionária. Ela mostrou que hoje é preciso ressintetizar a biologia, colocar os organismos de volta ao seu ambiente, conectá-lo com seu passado evolucionário. “Aí poderemos sentir o fluxo complexo resultante da união entre organismos, evolução e ambiente”, destacou.

O código genético oferece inúmeras possibilidades, segundo Van Sluys. Há restrições, mas nem todas são conhecidas. E existem diversas maneiras de estudar os genomas. Ela explica que há transferência frequente de genes relacionados a trocas entre as células e o ambiente. O projeto Biogenoma da Terra busca sequenciar em dez anos os genes de todas as formas de vida, para sua conservação, segundo a líder do GateLab da USP. Seu grupo de pesquisa investiga o papel que elementos de transposição tem na diferenciação de genomas, remodelando redes regulatórias gênicas e propiciando a diversificação de espécies.

Seleção positiva e mudanças ambientais

Em seguida, a pesquisadora titular do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA), Vera Almeida-Val, relatou como as mudanças evolutivas da enzima LDH em alguns peixes aumentaram a capacidade deles se difundirem e se tornarem um grupo diverso de vertebrados.

Vera explicou que a enzima LDH atua na oxidação do carboidrato ao final do processo de quebra da glicose, quando não há oxigênio na célula. Isso ocorre em músculos de todos os vertebrados, incluindo o homem, quando se exercitam demais. “Essa enzima é importante nos peixes porque é responsável pela capacidade natatória do músculo branco e pela sobrevivência dos peixes que habitam locais com pouco oxigênio, como o ambiente tropical quente e com muitas oscilações do oxigênio dissolvido na água”, esclareceu.

Para conquistar os ambientes mais frios, da região temperada e polar, a enzima teve que ser ativada com menos energia e ter mais flexibilidade. Vera Val mostrou que tais mudanças ocorreram durante os milhões de anos de evolução dos peixes, graças a mutações e seleção natural positiva, que proporcionaram à enzima tais propriedades. Os peixes puderam, então, habitar todos os ambientes aquáticos, conseguindo se estabelecer em ambientes quentes, frios e congelantes no globo terrestre.

Por fim, mostrou que alguns peixes tropicais, em particular da Amazônia, também possuem enzimas modificadas por seleção positiva, restando saber no que essas mudanças ajudam esses peixes a habitar esses ambientes muito variáveis.

Clima tem enorme importância para a biodiversidade

O clima da região é um dos responsáveis pela diversidade do bioma Amazônico, segundo Alexandre Aleixo, pesquisador titular e curador da coleção ornitológica do Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG). “A Amazônia se tornou o que é hoje, em parte, porque o regime de chuvas fez com que o Leste ficasse mais úmido. Então, ao longo do tempo, a floresta virou uma espécie de sanfona”, explicou Aleixo.

Ele estuda a distribuição de espécies de aves amazônicas e relata que os rios são como refúgios para as espécies endêmicas. Segundo o Aleixo, a construção de hidrelétricas em Jirau, Belo Monte e São Luiz perturbou os ecossistemas dos rios Madeira e Tapajós, tendo efeito nefasto sobre conservação da biodiversidade local.

O professor emérito da Universidade de Paris Descartes, Jean-François Bach, trouxe sua pesquisa sobre a derivação genética em mamíferos, mostrando seus experimentos com ratos. Ele explicou que a evolução da estrutura genética de qualquer população é inevitável. Com a sucessão de gerações, há uma tendência da natureza para a evolução, mesmo na ausência de forças seletivas. “As mutações espontâneas desaparecem ou se tornam permanentes em determinadas populações, de forma aleatória”, observou Bach.

Pré-colombianos e o uso sustentável da biodiversidade

Encerrando as apresentações, o professor de ecologia na Universidade de Montpellier, Doyle McKey, abordou o impacto que os povos pré-colombianos causaram na Amazônia. Sua pesquisa mostrou que estas populações eram mais numerosas do que se supunha e que alteraram substanciamente a paisagem da floresta e da savana. Mas observou que podemos aprender com eles sobre o uso sustentável da biodiversidade e dos ecossistemas.

McKey mostrou imagens identificadas como marcas dos povos pré-colombianos nas savanas e em áreas recém desmatadas de florestas que indicam o uso da terra para plantação em períodos não inundados, o que possibilitou um legado ecológico. Mesmo em solos inférteis das Guianas há registro de antigas plantações. “O longo período de ocupação pré-colombiana transformou os solos, aumentando a fertilidade e a capacidade de reter nutrientes. É a chamada ’terra preta de índios’, que foi enriquecida por resíduos orgânicos, como carvão vegetal e fragmentos cerâmicos, e continua fértil 500 anos após ser abandonada”, ressaltou McKey.

Por outro lado, o legado da engenharia dos solos nem sempre é positiva. O palestrante mostrou áreas plantadas pelos povos pré-colombianos e que foram depois colonizadas por formigas, que compactaram o solo, construindo formigueiros resistentes à erosão. “Elas trazem subsolo rico em barro para a superfície”, explicou McKey. E concluiu dizendo que muitas plantas foram domesticadas na Amazônia, como o abacaxi e a pimenta vermelha, através do uso de combinações de plantações que se protegem mutuamente.

Assim, as mudanças causadas pelo homem no ambiente foram demonstradas de diversos pontos de vista e em variados aspectos nesta sessão do evento.