A Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) promoveram o simpósio Academia Empresa, nos dias 10 e 11 de outubro, com o objetivo de aproximar a comunidade científica da indústria, cientes de que essa parceria favorece ambos os setores, tal como explicou o Acadêmico Renato Machado Cotta, coordenador do evento, em entrevista para Notícias da ABC.

O simpósio integrou a 3ª Feira de Ciência, Tecnologia e Inovação da Faperj, realizada no Centro Cultural da Ação da Cidadania, o que ofereceu um cenário de descobertas e experimentos científicos às palestras de gestores de C,T&I nas empresas e universidades.

Foram apresentados casos de sucesso dessa parceria no município do Rio e os desafios para que ela aconteça por todo o estado.

A 3a Feira de Ciência, Tecnologia e Inovação da Faperj ocorreu no Centro Cultural Ação da Cidadania

Modelos de interação diversificados

Os palestrantes mostraram que não existe uma receita, um modelo exclusivo de parceria, mas que essa deve ser articulada de acordo com as demandas que cada empresa possui por tecnologia.

Sandoval Carneiro Jr., diretor de tecnologia e inovação da Vale – hoje uma das maiores mineradoras do mundo – relatou a atuação dos quatro centros de tecnologia (CTs) da empresa, um deles no Canadá, e de um instituto de tecnologia. De acordo com ele, a Vale precisa de pesquisadores em diferentes momentos da cadeia produtiva da empresa. “A tecnologia é aplicada na produção para reduzir o impacto ambiental oriundo de suas atividades, na redução do consumo de energia, do impacto da extração de minérios do solo, além de tecnologias avançadas de exploração e tratamento destes minérios”. Essa demanda fez com que a empresa criasse os CTs, que hoje somam mais de 400 postos de trabalho para pesquisadores e gestores de C,T&I. “Neles, a Vale investe em pesquisa e desenvolvimento (P&D) e inovação em busca de tendências, antecipando possíveis problemas e oportunidades e preparando-se para desafios futuros. Ainda há uma atenção com a gestão de tecnologia e propriedade intelectual.”

Além disso, a empresa busca as melhores tecnologias para explorar recursos minerais com responsabilidade e respeito ao meio ambiente. Por isso, criou em 2009 o Instituto Tecnológico Vale (ITV), uma instituição sem fins lucrativos, de pesquisa e ensino de pós-graduação. “Seu objetivo é criar opções de futuro por meio da pesquisa científica e do desenvolvimento de tecnologias, expandindo o conhecimento e a fronteira dos negócios de maneira sustentável”, explicou Sandoval.

Eduardo Gerk, diretor comercial da Apolo Tubulars, e Luiz Melo, diretor de tecnologia, relataram o modelo de interação com a academia feita pela empresa, que é focada na produção de tubos de aço de alta qualidade para a indústria de óleo e gás. Eles explicaram que essa parceria é o coração da empresa, indo desde os protótipos até a finalização dos produtos, baseando-se em pesquisas realizadas através de consultorias técnicas e acordos de cooperação com laboratórios das universidades. “A Apolo Tubulars faz a intermediação entre centros de excelência em P&D e grandes empresas. De um lado trabalhamos com centros como a Coppe, para tecnologia de soldagem e tratamento térmico, a Unesp [Universidade Estadual Paulista], para a integridade estrutural, a LTS, para tecnologia submarina, e a LNDC, para fenômenos de corrosão, do outro, atendendo às demandas clientes como a Petrobras, US Steel, Usiminas, a Companhia Siderúrgica Nacional ou Arcelor Mittal”.

Diferente da Vale, que aplica a C,T&I produzida nos centros de tecnologia na sua produção, o produto da Apolo Tubulars é aplicado em outras indústrias. Neste sentido, os modelos de interações com a academia da Apolo e da Vale se diferenciam.

A FMC Technologies também é uma indústria fabricante de equipamentos e fornecedora de serviços para a indústria de óleo e gás, ou seja, tem um modelo de negócio semelhante ao da Apolo Tubulars, embora o produto seja diferente. Alan Labes, gerente de engenharia de sistemas, relatou a estratégia de investimento em C&T da multinacional na cidade do Rio de Janeiro. Apresentou os espaços da empresa onde são realizadas, entre outras atividades, o controle de usinagem, revestimento e subsea, a logística, o armazenamento, a recuperação de dados, o Centro de Tecnologia e os laboratórios, instalados no Parque Tecnológico do Rio (UFRJ). O número de postos de trabalho gerados no estado chega a 2.100, sendo 300 postos destinados ao setor de P&D da empresa. De acordo com Labes, “a FMC Technologies quer que o seu instituto tecnológico tenha capacidade de liderar projetos, mas que a sua execução aconteça utilizando a mão de obra qualificada das universidades. Por isso, a escolha do Parque Tecnológico da UFRJ foi estratégica, já que lá encontramos o pessoal qualificado pare solucionar problemas oriundos da nossa produção, assim como aprimorar os processos de produção”.

Empreendedorismo na universidade

Regina Fátima Faria, gerente da incubadora de empresas da Coordenação de Pós-Graduações em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), abordou as iniciativas empresariais que surgem dentro das universidades.

De acordo com dados de 2011 da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), o Brasil possui 384 incubadoras que, por sua vez, abrigam 2.640 empresas, gerando 16.394 postos de trabalho. A incubadora da Coppe/UFRJ tem papel de destaque nesses números, pois, entre 1994 e 2013, gerou 67 empresas, somando graduadas e residentes, 1.148 postos de trabalho altamente qualificados e 218 postos para mestres e doutores, e teve 13 empresas internacionalizadas.

Faria definiu a incubadora de empresas da UFRJ “como um ambiente que auxilia empreendedores para que eles possam desenvolver ideias inovadoras e transformá-las em empreendimentos de sucesso. Para isso, a incubadora oferece infraestrutura e suporte gerencial, orientando os empreendedores quanto à gestão do negócio e sua competitiv
idade, por um tempo determinado”.

Além de levar empresas para o exterior, há um movimento de vinda de empresas e estudantes para o país, interessados nas empresas geradas dentro da UFRJ. “Em 2012 foram 55 visitas de 13 países por diversas razões: interesse institucional, investidores, alunos em pesquisa, outras incubadoras e ainda a vinda empresas em busca de parcerias com as empresas residentes”, relatou Faria.

Interiorização da parceria academia-empresa pelo estado

Rex Nazaré, diretor de tecnologia da Faperj, relatou como a FAP quer criar condições para uma sólida interação da ciência com o setor empresarial, estimulando a colaboração da comunidade científica com os centros de pesquisa de empresas nacionais e internacionais no Estado do Rio.

Na Faperj, o fomento à relação entre universidades e empresas no estado é feito através de editais, como o Rio Inovação, que é destinado às empresas sediadas no estado que possuam protótipos, produtos e/ou processos em fase final de desenvolvimento. “Em 2004, o Rio Inovação contou com a participação de três municípios; em 2007, foram 12 municípios; em 2011, todos os municípios do Rio tinham projetos apoiados pela Faperj. Esses dados mostram a evolução desse tipo de parceria por todo o estado e o papel da FAP nesse processo”, afirmou.

Nazaré destacou que esses dados mostram que os objetivos da Faperj nesse sentido estão sendo alcançados – como a redução do desequilibro regional, interiorização e, neste processo, a viabilização da participação direta do micro e pequeno empresário e do produtor rural, melhorando a distribuição dos recursos dos editais que contemplem o empresário individual, o inventor independente e cooperativas. Com essa meta, foram 1588 projetos implementados em 92 municípios.

Continuando a tratar da interiorização da parceria academia empresa no estado do Rio, Alexandre José da Silva, diretor da Associação de Pesquisadores em Prol da Tecnologia e Inovação do sul fluminense (Aptec), relatou a possibilidade da Via Dutra se tornar uma rota tecnológica do estado.

A inspiração da Aptec é a área ao longo da Rota 128 em Massachusetts, nos Estados Unidos, que é a sede de um grande número de empresas de alta tecnologia. “As pré-condições para isso existem: a Via Dutra é um eixo entre as maiores metrópoles do país; há um sistema acadêmico desenvolvido; um grande número de empresas instaladas na via de todos os setores; espaço e condições para a instalação de novas empresas tecnologia”, afirmou Alexandre Silva.

O diretor da Aptec ressaltou que essa realização traria vantagens para as universidades do interior que não são suficientemente envolvidas com o desenvolvimento de projetos de tecnologia, já que as pesquisas universitárias são, em grande parte, propostas e conduzidas por pesquisadores em base individual. “E vantagens para as empresas que, embora estejam cada vez mais voltadas para o produto, em muitos casos não possuem condições para arcar com uma estrutura própria de pesquisa e desenvolvimento de tecnologia ou ainda não consolidaram uma política a longo prazo para o desenvolvimento de projetos tecnológicos”, explicou.

De acordo com Silva, para tornar a Via Dutra uma rota tecnológica, é necessário que uma política de desenvolvimento tecnológico seja criada para as regiões cortadas pela via, de forma a aproveitar o potencial de cada uma delas. Essa política também deveria contar com a criação de estruturas intermediárias entre as universidades e as empresas – laboratório, oficinas e sistemas de administração ágeis no registro de patentes voltados para inovação e tecnologia – nas quais fossem desenvolvidas pesquisas compartilhadas entre os setores. A seu ver, esses laboratórios e oficinas também deveriam contar com espaços para incubação de empresas de tecnologia, iniciativas autônomas e para fomentar projetos empreendedores.