No dia 22 de outubro, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) sediou uma cerimônia em comemoração aos 50 anos de estabelecimento das relações diplomáticas entre o Brasil e a China. O evento reafirmou os laços de amizade e cooperação científica e tecnológica entre os dois países e se insere no contexto da colaboração bilateral entre a ABC e a Academia Chinesa de Ciências (CAS), que desde 2018 mantêm um Memorando de Entendimento visando promover atividades em áreas de interesse comum.

“Nossos países têm colaborações de longa data em diferentes áreas, seja no lançamento de satélites, na agricultura, no combate às mudanças climáticas ou na saúde. Essas parcerias influenciam no impacto dos trabalhos e nas citações, e precisam ser fortalecidas”, afirmou a presidente da ABC, Helena Nader, ao abrir a cerimônia.

Na mesma linha, o vice-presidente da CAS, He Hongping, agradeceu a todos que se dedicam à diplomacia científica. Ele recordou que a ABC foi a primeira instituição latino-americana a estabelecer um mecanismo de cooperação bilateral com a CAS e é um parceiro fundamental. “A colaboração com a comunidade científica brasileira leva a uma maior eficiência de pesquisa e ao progresso da ciência nos dois países”, afirmou.

A abertura também contou com falas de Marcos Galvão, embaixador do Brasil em Pequim; Zhu Qingqiao, embaixador da China em Brasília; Carlos Aragão, diretor da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep); Carlos Morel, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz); Yungui Yang, diretor do Centro Nacional de Informação em Biociências da China (CNCB); Luciana Santos, ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI); e Luis Fernandes, ministro em exercício do MCTI.

A mesa de abertura. Da esquerda para a direita: Carlos Aragão (Finep), Luis Fernandes (MCTI), Helena Nader (ABC), Carlos Morel (Fiocruz), Yungui Yang (CNCB / CAS)

Centro Nacional de Informação em Biociências da China: uma janela para cooperação

Yungui Yang, diretor do Centro Nacional de Informação em Biociências da China

Em seguida, o espaço foi aberto para o professor Yungui Yang, do CNCB, instituição de pesquisa ligada à Academia Chinesa, cujas origens remontam ao Instituto Genômico de Pequim que, em 2001, foi o responsável por 1% do gigantesco Projeto Genoma Humano. Desde então, o centro passou a englobar diferentes laboratórios, bancos de dados e ferramentas de análise. “O CNCB deve servir não apenas como plataforma de armazenamento e gerenciamento de dados, mas como uma instituição de pesquisa e tecnologia de fronteira e uma janela para a colaboração internacional”, afirmou o diretor.

Hoje, o site do CNCB hospeda 108 bases de dados biológicas que são utilizadas para pesquisas de ponta em todo o mundo. O sistema é reconhecido pelas principais editoras científicas do planeta e recentemente passou a integrar o Global Core Biodata Resouces, uma iniciativa internacional de compilação de bancos de dados biológicos. Outro avanço foi sua integração com bases de dados internacionais especializadas, como aquelas específicas para doenças como a covid-19 ou o câncer.

Dessa forma, o CNCB incorpora em sua missão o provimento de serviços para a população, trabalhando em parceria com hospitais para que médicos consigam prestar um atendimento personalizado aos seus pacientes. Durante a pandemia, o centro cooperou com o Brasil no contexto dos BRICS, participando de pesquisas de monitoramento genômico nos países do bloco. Também recentemente, o CNCB estabeleceu parceria direta com instituições brasileiras, entre elas a Fiocruz e o Laboratório Nacional de Computação Científica (LNCC).

A instituição foi uma das fundadoras da iniciativa Biodiversity and Health Big Data Alliance (BHBD), que conta com 35 institutos em 17 países, entre eles o Brasil. O objetivo é promover um serviço global de compartilhamento de informações biológicas. A iniciativa conta com o apoio da Aliança de Organizações Científicas Internacionais (Anso), da qual a ABC é uma das academias membro e fundadora, sendo Helena Nader uma de suas vice-presidentes.

Dentre as instituições brasileiras envolvidas na BHBD está o Laboratório Nacional de Comunicação Científica (LNCC), representado no evento pela Acadêmica Ana Tereza de Vasconcelos. Ela contou mais sobre as colaborações entre o laboratório e o CNCB, que aconteceram no contexto do projeto de sequenciamento genômico do arroz e depois na iniciativa para monitorar a covid-19 nos BRICS. “É uma colaboração que começa em 2019 e será continuada com a assinatura de um novo memorando nos próximos dias”, relatou.

Representando a Fiocruz, o Acadêmico Carlos Morel, relatou como veio a interagir com Yungui Yang e fez um histórico de sua cooperação com o CNCB e suas instituições predecessoras. Para Morel, a consolidação do centro na China oferece uma chance valiosa para fortalecer a cooperação sino-brasileira, sobretudo nas ciências biológicas. “É o tipo de oportunidade que não surge todo dia”, sumarizou.

O Instituto de Resistência Antimicrobiana de São Paulo (Cepid – Aries) esteve representado por dois cientistas, o Acadêmico Arnaldo Colombo e o infectologista Carlos Kiffer. Colombo apresentou o tema central do instituto, os patógenos super-resistentes, que evoluíram para sobreviver aos antibióticos. “A resistência antimicrobiana foi escolhida pela Organização Mundial da Saúde como uma das 10 prioridades globais em saúde pública. Estima-se que até 2050 tenhamos mais mortes causadas por patógenos super-resistentes do que por câncer”, alertou.

Kiffer, por sua vez, explicou que o objetivo principal do Aries na atualidade é criar uma base de dados integrada, unindo repositórios públicos a repositórios privados ou de projetos de pesquisa específicos. “Temos no Brasil um sistema de saúde que coleta muitos dados, mas o que não fazemos é transformá-los em informação. Criar um observatório para monitoramento da resistência antimicrobiana é algo que requer colaboração por definição, pois foge ao escopo de um só instituto”, explicou.

Por fim, o pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Claudio Struchiner, especialista na interface entre computação e saúde, resumiu o que acredita ser o principal ponto de convergência do evento. “O que mais ouvi aqui hoje foi sobre integração de dados. Precisamos trabalhar para que consigamos unir dados das fontes mais díspares possíveis em um só sistema. Acredito que devemos almejar ter uma ferramenta que nos ajude a fazer sentido desses dados, uma espécie de ChatGPT para a pesquisa biomédica”, sugeriu.

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