No dia 2 de outubro, a presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Bonciani Nader, foi convidada pela Universidade de Harvard, EUA, para uma conversa sobre como alavancar a participação feminina na ciência. A moderadora foi a também Acadêmica Marcia Caldas de Castro, professora da Harvard T. H. Chan School of Public Health e diretora do Programa de Estudos Brasileiros do David Rockefeller Center for Latin American Studies, ambos departamentos de Harvard que organizaram o encontro.
Nader lembrou que a primeira mulher eleita como titular da ABC foi a bióloga Marta Vannucci no ano de 1966, quando a Academia já completava 50 anos de existência. No ano de 2007 as mulheres eram apenas 7% dos membros ativos, número que aumentou para 28% nos dias atuais. “O que eu defendi quando assumi o cargo de vice-presidente na gestão Luiz Davidovich foi a busca ativa por mulheres com potencial de ingresso. Nós descobrimos que as mulheres ainda se inscreviam em uma proporção muito menor do que os homens para se tornarem membros. Sabemos que ainda não é o número ideal, ainda não representa a participação feminina na ciência brasileira, mas estamos avançando”, explicou Nader.
A presidente da ABC também reconheceu que a Academia ainda está atrás na representatividade étnica brasileira. “Ainda temos muito poucos representantes negros, que são mais da metade da população brasileira, e temos apenas um indígena, Davi Kopenawa, como membro correspondente”.
Segundo ela, o problema da representatividade vem sendo atacado na graduação graças às ações afirmativas, que permitiram às universidades públicas se tornarem mais plurais. Entretanto, ainda é preciso garantir a permanência de alunos pertencentes a minorias sociais nesse ambiente. “As pessoas precisam se sustentar na graduação e infelizmente os valores das bolsas ainda não são suficientes”.
Em outro ponto, Márcia Castro questionou sobre como lideranças científicas podem lidar com a desinformação crescente. Para Nader, essa é uma questão não trivial sobre como é possível falar, de forma simples e direta, com a população. “A seca histórica que o Brasil vive, as enchentes que afetaram o sul brasileiro e que hoje afetam o estado da Georgia nos EUA, tudo isso aconteceu enquanto alguns negam as mudanças climáticas. É por isso que precisamos criar um canal de diálogo com as pessoas. Quando perguntamos ao público sobre o que é a ciência ou o nome de um cientista, muitos não sabem responder. Precisamos mostrar que seus celulares, seus remédios e quase tudo que usam é fruto da ciência”, respondeu.
Castro perguntou também sobre como foi liderar o S20, o grupo que reúne as academias nacionais de ciência do G20, para produzir recomendações aos chefes de Estado. “Em setembro, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou o Pacto para o Futuro, um acordo para que os países membros voltassem a cumprir um acordo anterior, a Agenda 2030. Estou cansada de acordos não cumpridos, o que você espera da Cúpula do G20 em novembro para que este não seja mais um?”, indagou.
Nader explicou que o S20 foi organizado em torno de cinco grupos de trabalho com os temas Inteligência Artificial, Bioeconomia, Transição Energética, Saúde e Justiça Social. O documento final foi aprovado por 19 dos 20 países do bloco.
“Espero que levem a justiça social em consideração, senão não iremos sobreviver. Quando falo em justiça social, há diversas ‘justiças’ para levar em consideração, como a climática. Se não fizermos nada com relação à temperatura, teremos migrações em massa e mais guerras surgirão. Nossos governos não estão prestando atenção no que a ciência diz”, lamentou a presidente da ABC.
Assista à conversa completa: