Muito se fala sobre a vocação para a ciência, sobre cientistas que se apaixonaram cedo por sua área de estudos e seguiram para se tornar especialistas. Mas não é sempre que ouvimos histórias ao contrário, de jovens talentosos em uma matéria que crescem para se destacarem em outra completamente diferente. Essa é a história do antropólogo Rodrigo Ferreira Toniol, novo afiliado da Academia Brasileira de Ciências (ABC), que passou de finalista da Olimpíada Brasileira de Física para doutor naquela que talvez seja a menos matemática das ciências sociais.

Rodrigo cresceu em Osasco, na Grande São Paulo, filho de Norma Ferreira e José Toniol. Com o mesmo olhar atento que dedica ao estudo do humano e de suas culturas, o Acadêmico analisa suas próprias origens. Sua linha materna foi do Pará – de Belém e da ilha de Marajó – para São Paulo em busca de melhores oportunidades, enquanto sua família paterna é de imigrantes italianos e espanhóis que vieram para o Brasil no início do século XX, atravessando gerações de agricultores e operários.

“Enquanto meu pai sempre trabalhou na indústria, minha mãe se aventurou por muitos caminhos, tivemos um bar, vans escolares e até vendemos maçã-do-amor em festas. Não sou, portanto, de uma família de intelectuais e fui o primeiro a completar o ensino superior. Ao mesmo tempo, a universidade nunca esteve fora de meu horizonte, pois embora muitas vezes com uma vida financeira instável, meus pais sempre conseguiram garantir que eu cursasse boas escolas particulares”, conta ao Acadêmico.

O gosto pela leitura o acompanha desde cedo e contribuiu para que fosse um aluno destacado que conseguia bolsas. Já na adolescência lia Max Weber, Maquiavel, Paul Vayne, entre outros clássicos – e nem tão clássicos – da filosofia e da história. Mas na escola gostava mesmo era dos números. Por dois anos consecutivos chegou às finais das Olímpiadas Brasileiras de Física e seguir esse caminho parecia natural. Mas tudo mudou graças ao professor Vinícius Muller, que incentivou seu gosto pelos textos clássicos e o fez optar pelas humanidades.

Rodrigo escolheu cursar antropologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em Porto Alegre, motivado pela vontade de sair de São Paulo e ter novas experiências. Sua primeira referência na carreira foi seu primeiro orientador, Carlos Alberto Steil. “Seu papel em minha via profissional é inestimável, foi meu orientador da graduação ao doutorado, sempre dedicado e interessado no diálogo com aquilo que me encantava em termos de pesquisa”.

Outra característica fundamental desses anos foi a troca de conhecimentos e experiências com pesquisadores de vários níveis da carreira e também de vários lugares do Brasil e do mundo. Durante o doutorado, Rodrigo teve a oportunidade de morar em Guadalajara, no México, e em San Diego e Berkeley, nos EUA. De volta ao Brasil, se instalou em Campinas para fazer pós-doutorado, mas logo surgiu uma oportunidade como pesquisador visitante na Universidade de Utrecht, na Holanda. Ao retornar, contribuiu para consolidar a linha de pesquisa sobre religiões no mundo contemporâneo na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e em 2020 ingressou como professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Atualmente, o Acadêmico coordena o grupo de pesquisa Passagens, na UFRJ. “Por mais identificado com os estudos da religião que eu seja, nunca me senti limitado tematicamente. Considero que minhas pesquisas estão mais associadas a fenômenos do que a grandes temas. Meus objetos de interesse estão nas passagens: do alternativo para o oficial, do não científico para o científico, do ilícito para o lícito, dos sintomas para o diagnóstico, do ordinário para o sagrado. Por exemplo, no doutorado pesquisei sobre a incorporação das chamadas terapias alternativas, antes marginalizadas e tidas como para-científicas, no SUS”, explica.

Para Rodrigo, a atividade científica lhe deu acesso a um novo mundo, não apenas intelectual, mas também prático. Foi uma ferramenta de mudança de vida. Além disso, para ele a ciência tem uma característica muito particular de encantamento, algo que muitos encontram na espiritualidade. “Estudando religião embora pessoalmente não seja nada religioso, acredito que talvez a ciência seja a minha forma de encantar o mundo”, reflete.

Agora na ABC, Rodrigo está orgulhoso e encara a nomeação como uma responsabilidade com as ciências sociais. “Ainda são poucos os colegas de ciências sociais entre os membros. Assim, minha atuação estará menos marcada pelos interesses de uma área em particular e muito mais pelo esforço, que buscarei empreender, de integração das questões, debates e perspectivas que as ciências sociais podem aportar para os debates do país”, afirma.