Enelise Katia Piovesan nasceu em 1983, na zona rural de Frederico Westphalen, no estado do Rio Grande do Sul. Teve uma infância repleta de brincadeiras com os irmãos e amigos, no sítio dos pais. Gostava de pega-pega, bicicleta, futebol e vôlei, mas também adorava ler.
Biologia sempre foi sua matéria favorita na escola. “Adorava coletar plantas, insetos, observar o comportamento das espécies em seu ambiente natural. Também gostava de coletar minerais e rochas. Essa curiosidade natural hoje entendo que era já representava o desejo de ser pesquisadora. Também sempre acompanhei meu padrinho, um entusiasta da natureza”, contou a Acadêmica.
Os pais de Enelise possuem uma pequena propriedade rural, da qual sempre extraíram o sustento da família, sendo que a mãe foi professora de educação infantil por alguns anos, com quatro filhos: um menino mais velho e três meninas, das quais ENelise era a caçula. Uma de suas irmãs cursou duas graduações, em letras e direito, e fez mestrado em literatura; a outra é pedagoga e doutora em educação. Os pais sempre apoiaram e incentivaram os filhos a estudarem, por isso o desejo da caçula de se aventurar e ir para longe dos familiares em diversas fases da vida nunca foi um problema.
Ela sempre soube que enveredaria pelas ciências naturais, e assim foi. Fez a graduação em ciências biológicas na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), entidade jesuíta privada. Enelise saiu da casa dos pais e foi morar com as irmãs, precisando trabalhar para ajudar a pagar as despesas e ajudar nos custos da faculdade particular. Porém, já nos primeiros semestres sentiu que precisava imergir totalmente na pesquisa e ingressou como bolsista de iniciação científica (IC), o que manteve ao longo de quase toda a faculdade. Participava das coletas de dados e amostras de colegas de curso. A maioria dos fins de semana eram dedicados a coletas de campo e trilhas. “Foram tempos difíceis, pois o valor da bolsa era muito baixo – e ainda é”, afirmou a pesquisadora.
Logo que terminou a graduação, Enelise enfrentou o mais difícil de todos os desafios pessoais de sua vida: a perda de sua filha Carolina. Mudou de cidade, para outro campus da Unisinos, em São Leopoldo, onde cursou o mestrado e o doutorado em geologia. Nesse período da pós-graduação, surgiu uma oportunidade de participar de um projeto na área de geociências, que agarrou imediatamente, passando então a se dedicar à micropaleontologia. “Fiz um doutorado-sanduíche em Lisboa, onde tive um aprendizado incrível. Durante todo este tempo, tive orientadores excelentes e colegas de trabalho e amigos que me apoiaram muito e com os quais sigo cooperando”. Ela diz que na pesquisa, assim como na vida, é fundamental ter humildade para estar sempre aprendendo. “Sou muito grata a todos os meus professores, meus orientadores e meus alunos, com os quais aprendo muito todos os dias”, afirmou.
Atualmente, Enelise Piovesan é professora adjunta na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), atuando nas disciplinas de paleontologia geral nos cursos de geologia e ciências biológicas, micropaleontologia e estratigrafia. É membro permanente do Programa de Pós-Graduação em Geociências desde 2015, onde coordena o Laboratório de Micropaleontologia Aplicada (LMA), que faz parte do Instituto de Pesquisa em Petróleo e Energia (i-Litpeg) e é equipado para o processamento de amostras e análise de microfósseis. Também atua como líder do grupo de pesquisa do Laboratório de Geologia Sedimentar e Ambiental (Lagese).
Ela explica que o trabalho da área de micropaleontologia é o estudo de fósseis de tamanho diminuto. Os microfósseis são aplicados na datação de rochas, no entendimento de relações paleogeográficas e na reconstrução de ambientes e climas do passado. Têm grande potencial econômico, sendo aplicados na exploração de petróleo.
As regiões onde Enelise realiza o maior número de trabalhos são as bacias sedimentares do Brasil, sobretudo as do Nordeste, onde já coletou e descreveu alguns novos gêneros e espécies de pequenos crustáceos da Classe Ostracoda. “O estudo destas pequenas formas de vida, que podem ser micro-organismos inteiros ou partes deles, ajudam a contar como evoluiu a vida no nosso planeta ao longo de mais de aproximadamente 4 bilhões de anos”, destacou a Acadêmica.
Ela participou de três expedições à Antártica, para realizar pesquisas e coletar amostras de fósseis, como uma das investigadoras do Projeto Paleoantar, que é financiado pelo CNPq, com apoio da Marinha do Brasil. Piovesan conta que o mais longo tempo que ficou acampada em uma das ilhas da Antártica foi de 50 dias, porém toda a logística demandou cerca de três meses, desde a partida até o retorno ao Brasil. “Nestes dias de acampamento, o grupo fica isolado, com comunicação restrita a um equipamento de telefone por satélite para emergências. Estas experiências foram transformadoras, tanto do ponto de vista pessoal, quanto profissional. Certamente, é um dos lugares menos acessíveis do mundo – e um dos mais bonitos e preservados”, ressaltou a cientista.
Para Enelise Piovesan, fazer ciência é estar em movimento, é aprender todos os dias. “Na paleontologia, cada descoberta adiciona uma informação ao quebra-cabeça da vida no passado e serve como guia para o planejamento de ações futuras”, ressalta. Ela acredita que entender a origem e a evolução dos organismos e ambientes ao longo do tempo geológico, por si só, é de fundamental importância; porém, divulgar estes conhecimentos de forma ampla é imprescindível. Por isso a pesquisadora se sentiu extremamente feliz e honrada com o título de membro afiliado da ABC. “Pretendo contribuir ampliando as discussões na minha área de atuação e demonstrando a importância do estudo da paleontologia para o público em geral”, afirmou.
Embora reconheça que o trabalho ocupe a maior parte do seu tempo cotidiano, nos dias livres Enelise Piovesan adora viajar e estar com a família. Como descendente de italianos, aprecia um bom vinho, acompanhado de um bom livro, de um sossego na praia… e de cozinhar ouvindo MPB.