No dia 19 de junho, ocorreu uma audiência pública conjunta das Comissões de Ciência e Tecnologia (CCT) e de Educação (CE) do Senado Federal. O objetivo principal foi discutir a situação orçamentária das universidades e Institutos Federais (IF), justamente no momento em que uma greve de professores e técnicos ultrapassa dois meses. A reunião contou com a presença da presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Helena Bonciani Nader.
Orçamento do MCTI e FNDCT
O primeiro a falar foi o secretário executivo da Iniciativa para Ciência e Tecnologia no Parlamento (ICTP.br), Fábio Guedes. Ele defendeu que o orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) – e dentro dele do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – está limitado pelas regras fiscais em vigor e, cada vez mais, só dá conta das despesas correntes.
Dessa forma, despesas discricionárias, como projetos estratégicos e não-ordinários, dependem muito fortemente do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Para Guedes, a liberação total do FNDCT, conquistada pela Lei Complementar 177 de 2021, foi uma importante vitória, mas o fundo sozinho é insuficiente para dar conta, por exemplo, da reestruturação da infraestrutura universitária. “As bases de financiamento de CT&I no Brasil são arcaicas e muito estreitas para conseguirmos recuperar todo o sistema, precisamos de uma reforma no modelo de financiamento da ciência brasileira”, resumiu.
Na mesma linha, Helena Nader lembrou que durante as discussões do Novo Arcabouço Fiscal, em 2023, o Senado aprovou a isenção de investimentos em C&T das regras fiscais, mas a proposta foi derrubada pela Câmara. “Faltou à Câmara uma visão de nação”, criticou.
A presidente da ABC fez coro à ideia de que o FNDCT sozinho não é suficiente e criticou o governo por não implementar a proposta, aprovada no conselho do fundo, de elevar a proporção de recursos não-reembolsáveis para 60%. Também defendeu atrelar isenções fiscais à contratação de mestres e doutores pela indústria e considerou uma “aberração” a proposta de taxar fundos patrimoniais voltados ao investimento em pesquisa científica.
“Temos condição de ser uma potência científica. Aplaudimos a Universidade de São Paulo (USP) por estar entre as 100 melhores do mundo, mas não observamos o que ela faz. A USP tem orçamento garantido, tem planejamento. Não existem milagres”, finalizou.
Orçamento das universidades e Institutos Federais
A diretora de Desenvolvimento da Rede de Instituições Federais de Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), Tania Mara, criticou o orçamento enxuto para as universidades e IF em 2024. “Chegou ao absurdo de uma universidade perder todos os seus recursos para permanência estudantil, como ocorreu com a Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), o qual tivemos que recuperar com um projeto de lei”.
A vice-presidente do Fórum Nacional de Pró-Reitores de Pesquisa e Pós-Graduação (Foprop), Claudia Xavier, ilustrou a situação trazendo números de perda real no orçamento desde 2016. Para as universidades a perda é de 50% e para os IF chega 60%. “Se fosse para refletir 2016 o orçamento deveria ser de R$ 12 bi, mas não chegou a R$ 6 bi. Só para conseguir manter essas instituições durante 2024 seria necessário mais R$ 2.4 bi, mas só R$ 521 mi adicionais foram aprovados”, criticou.
A situação se agrava se considerarmos que o sistema de educação superior brasileiro está em expansão, ou seja, a quantidade de instituições que precisam ser mantidas hoje é maior do que oito anos atrás. “O sistema cresce mas os recursos diminuem, é impossível continuar dessa forma”, finalizou Xavier.
Ainda nessa discussão, o reitor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), José Geraldo Ticianelli, representando a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), lembrou que muitas das obrigações assumidas pelas universidades atualmente, como a manutenção de acervos históricos e culturais e alguns modelos de cursos profissionalizantes, não estão totalmente cobertas pelas bases orçamentárias vigentes. “Algumas universidades já empenharam 75% do orçamento e estamos na metade do ano. As necessidades orçamentárias são crescentes e precisamos atender a todas essas novas demandas, por isso precisamos discutir novas bases orçamentárias para os próximos anos”.
Reajuste e expansão na oferta de bolsas
Os representantes do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), Olival Freire Junior e Antonio Gomes de Souza Filho, afirmaram que, graças a PEC da Transição, foi possível reajustar o valor e aumentar a disponibilidade de bolsas, desde a Iniciação Científica e até as bolsas de pós-graduação, pós-doutorado e de produtividade.
Olival Freire lembrou que o CNPq vem buscando fortalecer a interação entre academia e setor privado através do Programa de Mestrados e Doutorados na Indústria (MAI/DAI). “Já são mais de R$ 100 milhões investidos, em mais de cinco mil alunos, e em parceria com mais de 200 empresas”, afirmou.
Os palestrantes afirmaram também que a redução no número de bolsas em cursos tradicionais se deve a uma tentativa de expandir o sistema e que 37 instituições jovens receberam bolsas pela primeira vez. Eles argumentaram que esses efeitos colaterais se devem ao pouco espaço orçamentário, mas que já estão sendo mitigados. “Políticas de Estado não podem desconsiderar o tamanho do país”, finalizou Antonio Gomes.
Assista à Audiência Pública pelo canal da TV Senado: