No dia 8 de maio, como parte de sua Reunião Magna 2024, a Academia Brasileira de Ciências teve a honra de receber no Museu do Amanhã a cientista da computação Margaret Martonosi, professora da Universidade de Princeton, EUA, para falar sobre inteligência artificial – tema da reunião deste ano – do ponto de vista dos computadores e chips. Martonosi é especialista em arquitetura de computadores, com ênfase em eficiência energética, tema central para o desenvolvimento de IA. De 2020 até 2023, Martonosi foi diretora da área de Ciências da Computação, Informação e Engenharia da National Science Foundation, principal órgão federal de fomento à ciência nos EUA.
A palestrante iniciou lembrando que em 1950, quando os computadores ainda eram máquinas gigantescas com pouca capacidade de processamento, o pai da computação moderna, Alan Turing publicou um artigo em que ponderava: “Podem as máquinas pensar?” Mais de sete décadas depois, essa pergunta continua mais atual do que nunca com a evolução das IA.
Martonosi comparou os diversos elementos, ou camadas, que compunham os computadores de 1950 e hoje em dia. Esses elementos vão desde os transistores, na camada inferior, até as linguagens de programação e os algoritmos nas camadas superiores. Todas essas partes trabalham juntas para a máquina funcionar. “Cada vez mais vemos camadas intermediárias nesse bolo sendo substituídos por sistemas otimizados para aplicativos e o mesmo pode ocorrer para sistemas de IA. Talvez daqui a uma ou duas décadas a arquitetura computacional predominante seja outra”, observou.
Entre os desafios do desenvolvimento de hardware moderno está aumentar a eficiência energética. Num mundo que exige cada vez mais sustentabilidade, conservar energia é fundamental. Para se ter uma ideia, a maior parte das operações realizadas na internet hoje em dia depende de grandes datacenters que podem chegar a uma demanda energética de 100 megawatts, suficiente para abastecer uma cidade com 60 mil domicílios. “A boa notícia é que a capacidade computacional dos datacenters está aumentando de forma muito mais rápida do que a demanda energética. De 2010 a 2018, a primeira aumentou em 550% enquanto a segunda apenas 6%”, contou a palestrante.
Mas desde 2018 a computação, e em especial a inteligência artificial, evoluiu bastante, elevando o custo energético. “Em especial, a pegada de carbono acoplada, isto é, a demanda energética envolvida desde a manufatura até o descarte dos equipamentos, é ainda maior que a demanda operacional. Precisamos pensar em ferramentas que quantifiquem melhor e ajudem engenheiros a colocar essa pegada de carbono na equação quando desenvolvem sistemas”, alertou Martonosi.
Um exemplo de evolução no hardware é o descrito pela “Lei de Moore”. Em 1965 o engenheiro Gordon Moore observou que o número de transistores – um tipo de semicondutor – em um chip dobrava a cada dois ou três anos. Longe de ser uma lei universal, a “Lei de Moore” acabou se mantendo verdadeira por muito mais tempo que seu próprio autor acreditou que seria. Mas, de acordo com a palestrante, isso começou a mudar nas últimas duas décadas. “Podemos continuar empilhando transistores, mas não ganhamos mais a mesma performance. Começamos a atingir limites energéticos ou mesmo físicos”, analisou. “Chips hoje em dia estão ficando tão quentes quanto lâmpadas, é algo que precisamos que considerar”, completou.
Outro desafio referente a IA tem a ver com a própria sociedade. Muitos analistas observam com preocupação a capacidade que essa tecnologia tem de criar abismos sociais ainda maiores. Para a palestrante, mitigar isso passa por um letramento em IA para todas as idades – “do jardim de infância aos cabelos brancos”. Ela acredita também que quanto mais inclusivo se tornar o corpo profissional em IA, problemas como vieses de dado diminuirão naturalmente. “Inclusão não é necessária apenas para quem se beneficia diretamente. Conseguimos melhores soluções de engenharia e pesquisa quando temos uma diversidade de mentes trabalhando. Isso é particularmente verdadeiro para IA, que depende de bancos de dados ainda muito concentrados em conteúdo de alguns países”.
Assista a palestra a partir de 2h40m: