Em entrevista para o Amazônia Real, Davi Kopenawa, membro colaborador da ABC e líder da tribo Yanomami, fala sobre a recente tragédia humanitária enfrentada por seu povo. O conteúdo foi publicado em 24/1/2023.

O maior líder do povo Yanomami, Davi Kopenawa, de 66 anos, atendeu à equipe da Amazônia Real para uma entrevista exclusiva na segunda-feira (23). Com a agenda cheia de compromissos e reuniões com outras lideranças e apoiadores das pautas do povo da floresta, ele reservou cerca de 40 minutos para uma conversa franca e direta. O xamã Yanomami revelou estar irritado e triste por ter de tratar dos problemas por ele denunciados há décadas. Àquela altura do dia, o mundo voltava os olhos para o seu povo, com ofertas de socorro emergencial, visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e até uma tentativa política de encontrar culpados para a tragédia humanitária, há tempos denunciada pelos Yanomami. Mas para Davi não há dúvidas: o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) é responsável pelo genocídio do seu povo. 

“Quem matou o meu parente, meus irmãos, minha família, foi o [ex-]presidente Jair Bolsonaro. Nos quatro anos que ele ficou junto com os garimpeiros levou a doença, coronavírus, malária, gripe, disenteria, verminose e outras doenças. Foi ele que matou. Ele matou e foi embora. Se não tivesse matado, estava aqui junto com nós”, resumiu. Davi Kopenawa, na entrevista, pediu a prisão do político que continua nos Estados Unidos desde 31 de dezembro de 2022. 

Não restam dúvidas de que o governo Lula quer encontrar meios de enquadrar Bolsonaro por algum crime, preferencialmente algum que o tire do jogo político. O crime de genocício e omissão de socorro para o povo Yanomami é um deles.

É na Terra Indígena Yanomami (TIY) o único caso de genocídio julgado no Brasil pelos assassinatos de 16 indígenas por garimpeiros, em 1993. Antes, em 1990,  o governo de Fernando Collor demarcou o território e delegou ações para retirar 40 mil garimpeiros. A TIY foi homologada com 9,4 milhões de hectares, em 1992, com limites entre os estados do Amazonas e Roraima com a Venezuela. Mas a tragédia do massacre nunca foi superada pelo povo.

Com a entrada de Jair Bolsonaro na Presidência da República em 2019, iniciou na terra indígena uma nova corrida ao ouro e cassiterita (estanho) com aval de ações pró-garimpo pelo governo da extrema-direita. Estima-se que de 20 a 30 mil garimpeiros invadiram o território, que tem uma população de 30.400 indígenas e 386 comunidades. 

Com a liberação do garimpo na terra indígena veio o pior: os narcotraficantes passaram a lavar dinheiro do tráfico com a venda do ouro na TI Yanomami. Os criminosos, segundo a Hutukara, levam além de doenças, drogas, álcool e armas para as comunidades. 

Para o presidente da Hutukara Associação Yanomami está mais que provado que Bolsonaro é o culpado pela expansão do garimpo ilegal na Amazônia. Davi Kopenawa chama de “ouro do sangue Yanomami” a exploração predatória do minério em sua terra indígena. 

Lula, na visita a Roraima no último sábado (21), prometeu novamente tirar os garimpeiros das áreas indígenas e, em particular, da TI Yanomami. O documento com as ações para a desintrusão deve ser apresentado em 45 dias. Autoridades e órgãos que se mantiveram em silêncio nos últimos quatro anos, sob os governos de Bolsonaro (federal) e Antonio Denarium (estadual), demonstram agora interesse em enfrentar a tragédia humanitária. Mas o pedido de socorro não é recente, segundo a própria Hutukara.

“Há quase quatro anos a Hutukara vem fazendo campanha Fora Garimpo, Fora Covid. Chamamos a atenção do Estado brasileiro e, principalmente, da sociedade brasileira, chamamos a atenção do mundo inteiro. O governo passado [do Bolsonaro] sequer nos atendeu em Brasília. Então, essa é uma situação que está acontecendo e nós já avisamos há muito tempo. Então nós fizemos o nosso trabalho de documentar, fizemos relatório, as mortes estavam crescendo em 2019”, disse Dário Kopenawa, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami, que estava presente na entrevista com seu pai, Davi Kopenawa.

Leia a entrevista completa.