Em 26 de setembro, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) enviaram carta ao vice-presidente da República. Leia a carta na íntegra:
Prezado Sr. Vice-Presidente da República,
Senhor Hamilton Mourão,
Vimos trazer, por meio desta carta, considerações da Academia Brasileira de Ciências e da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência sobre suas críticas aos sistemas desenvolvidos pelo INPE para monitoramento do desmatamento nos biomas nacionais, bem como sobre sua proposta de criação de uma agência nacional para centralizar dados do desmatamento, sob a gestão do CENSIPAM (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia, órgão do Ministério da Defesa), nos moldes da agência norte-americana NRO (National Reconaissance Office).
Outras medidas, tomadas recentemente, voltadas a reduzir o protagonismo do INPE na execução da parte civil do Programa Espacial Brasileiro e de sua atuação no monitoramento ambiental, foram as decisões de não renovar a colaboração Brasil-China, para desenvolvimento de satélites de observação da Terra (programa CBERS) e de cortar o orçamento para desenvolvimento de novos satélites no próximo ano. Características importantes do sistema nacional de monitoramento do desmatamento da Amazônia e a base de sua renomada credibilidade internacional têm sido, até o presente, a grande qualificação dos cientistas do INPE, sua independência em relação aos órgãos fiscalizadores, como IBAMA e ICMBio, e a divulgação aberta e gratuita dos dados à sociedade.
O CENSIPAM é um órgão militar e, reconhecendo seus bons serviços com relação ao sistema de vigilância da Amazônia, não tem como missão o controle do desmatamento e não disponibiliza abertamente dados e alertas de desmatamento. Ao propor que a nova agência siga o modelo da agência americana NRO, o Governo indica a intenção de controlar as atividades de observação da Terra sob a óptica das aplicações militares.
Uma consequência da centralização dos dados de imagens de satélite no CENSIPAM poderá ser a obstrução ou a dificuldade de sua análise por outros órgãos e agentes públicos e ou privados, inclusive universidades e programas de pós-graduação. Ressalte-se que mais de mil trabalhos acadêmicos já foram produzidos com dados dos sistemas DETER e PRODES. Quanto mais análises forem feitas por diferentes órgãos, maior será a segurança para a sociedade de que a atuação do INPE é coerente com a estratégia espacial brasileira e com a proteção e monitoramento da Amazônia.
Em conclusão, é essencial para o país reforçar a atuação do INPE como instituição científica e independente, responsável pelo monitoramento dos biomas brasileiros e pela execução das aplicações civis do Programa Espacial Brasileiro.
Eis aqui, Sr. Vice-Presidente, a reflexão de duas entidades cujos membros têm atuado tanto na formação de recursos humanos como na produção de conhecimento nas mais diversas áreas, inclusive na defesa nacional. Esperamos que ela contribua para que o senhor reveja sua compreensão dessa questão fundamental para o progresso do país.
Atenciosamente,
Luiz Davidovich
Presidente
Academia Brasileira de Ciências
Ildeu de Castro Moreira
Presidente
Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência