Organizado pela Academia de Ciências da Nicarágua (ACN), em parceria com a Rede InterAmericana de Academias de Ciências (Ianas), o “Seminário Internacional sobre COVID-19” aconteceu nos dias 20 e 21 de agosto e contou com a participação de membros da Academia Brasileira de Ciências (ABC). Na qualidade de copresidentes da Ianas e integrantes do comitê organizador, Helena B. Nader (vice-presidente e membro titular da ABC) e Jeremy McNeil (membro correspondente da ABC) participaram, respectivamente, das cerimônias de abertura e encerramento do evento. Cesar Victora, por sua vez, atuou como conferencista, ao lado de cientistas do Canadá, Estados Unidos, Honduras, México e, claro, Nicarágua.

No início do seminário, Helena B. Nader destacou a importância de iniciativas como aquela, que permitem e estimulam a interação entre as comunidades científicas dos diferentes países da região. Ela destacou que a pluralidade de nacionalidades também esteve presente no Comitê Organizador, que contou com a presença de representantes da Argentina, Colômbia e Costa Rica, além de Brasil, Canadá, Estados Unidos e Nicarágua. “Essa troca de experiências pode ser fundamental no enfrentamento de crises como a provocada pela pandemia de COVID-19”, apontou Nader.

Já no final do evento, Jeremy McNeil agradeceu a todos os conferencistas, organizadores e espectadores e reforçou o papel da Ianas como uma das principais promotoras do debate científico no continente.

Em sua conferência, no dia 21 de agosto, o Acadêmico Cesar Victora analisou o cenário da pandemia na América Latina e no Brasil. Ele destacou que o padrão de contágio na região se mostra diferente daquele verificado em alguns lugares da Europa. Enquanto na Itália, por exemplo, houve um pico inesperado de mortes – seguido por uma queda vertiginosa, a América Latina enfrentou um crescimento sustentado deste número, que se encontra, no momento, em um platô elevado. Tal diferença pode ilustrar que, uma vez deflagrada a pandemia, alguns países europeus reagiram de forma mais eficiente à crise.

Já analisando a realidade brasileira de enfrentamento da COVID-19, Victora apresentou os resultados do estudo Epicovid-19, promovido pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) em 133 cidades (250 pessoas testadas em cada) em todos os Estados do país, fazendo uso de testes rápidos de anticorpos> “Já promovemos três rodadas, uma em maio e duas em junho. Elas mostraram a migração da concentração de casos do Norte para o Nordeste do Brasil e confirmaram que a COVID-19 impacta os grupos mais pobres de maneira muito mais intensa, o que também acontece com populações fragilizadas, como os indígenas”, destacou Victora. O estudo também indica que o número real de casos é muito maior que os dados oficiais de contaminação por Sars-CoV-2 da população brasileira.

Após sofrer com a divulgação de notícias falsas (que levaram, inclusive, a prisões indevidas de membros das equipes de campo e destruição de amostras coletadas) e com o corte do financiamento pelo Ministério da Saúde, que provocou a suspensão da pesquisa por dois meses –, Victora informou que a UFPel conseguiu levantar recursos privados e realizará uma nova rodada do Epicovid-19 no fim do mês de agosto. “Espera-se que esta quarta rodada evidencie a percepção de que o impacto da pandemia se encontra em estágios diferentes nas distintas regiões do Brasil: enquanto Norte e Nordeste verificam declínio nos casos e mortes por COVID-19, Sul e Centro-Oeste enfrentam franco crescimento desses índices”, apontou o Acadêmico.

Da mesma sessão de Cesar Victora participaram Jorge Huete-Pérez (Universidade Centro Americana), que apresentou o preocupante cenário da pandemia de COVID-19 na Nicarágua, e María Elena Bottazzi (Baylor College of Medicine e Texas Children’s Hospital) e Peter Hotez (Baylor College of Medicine). A hondurenha e o americano trabalham conjuntamente nos estudos da vacina da farmacêutica Merck em parceria com o Baylor College (EUA) e discutiram a necessidade do desenvolvimento de tecnologias em saúde que sejam acessíveis para todos. As apresentações foram seguidas por um debate entre os conferencistas, que contou, também, com comentários e perguntas da audiência. Muitos dos envolvidos chamaram a atenção para a politização da pandemia, prática que vem ocorrendo em muitos países das Américas e leva a uma falta de coordenação entre os governos federais, estaduais e locais no enfrentamento da pandemia.