Pandemia e desinformação: este foi o tema da quarta edição da série de webinários “Conhecer para Entender”, promovida pela Academia Brasileira de Ciências, que ocorreu no dia 28/4. A série consiste em encontros semanais com webinaristas convidados, com o intuito de compartilhar conhecimento e reflexão sobre o mundo a partir da pandemia provocada pelo novo coronavírus.

Nesta edição, apresentaram suas pesquisas, suas práticas e seus pontos de vista o cientista da computação e Acadêmico Virgílio Almeida (UFMG); o demógrafo e Acadêmico Eduardo Rios (IBGE); e o jornalista Bernardo Esteves (revista Piauí).

As pesquisas do IBGE: estatísticas confiáveis contra a desinformação

Para o Acadêmico Eduardo Rios, que é diretor de Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o empenho do IBGE é o oposto à desinformação, um trabalho essencial durante a pandemia do novo coronavírus.

Antes do surgimento dos primeiros casos de COVID-19 no Brasil, Rios acompanhava a testagem de equipamentos para a realização do censo demográfico de 2020, a principal fonte de informação sobre as condições de vida da população brasileira. Com a pandemia, o conselho deliberativo do IBGE decidiu interromper a pesquisa. “Tomamos a decisão de transferir o censo para 2021 e alocamos os recursos para o Ministério da Saúde e o combate da COVID-19”, disse o Acadêmico.

Além disso, Eduardo Rios compartilhou a difícil decisão de suspender as coletas de informação presenciais para a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD) contínua. “Essa pesquisa envolve um volume muito grande de entrevistados, com uma coleta em 3600 domicílios. Com o distanciamento social, ela continuou a ser realizada pelo telefone, buscando reunir informações essenciais ao país sobre o número de desempregados, a renda e a ocupação dos brasileiros. Esse esforço permite que tenhamos resultados, mas com aumento da variância”, pontuou.

Foi criada então a PNAD-COVID, uma pesquisa desenvolvida a fim de gerar informações específicas para a sociedade e para o Ministério da Saúde sobre a pandemia no Brasil, com uma amostra de cerca de 211 mil municípios. “O IBGE está comprometido neste esforço para manter a produção e divulgação de estatísticas confiáveis durante a pandemia”, reiterou o Acadêmico.

Algoritmos, redes sociais e robôs

“A desinformação é um processo de disseminação de informações falsas ou enganosas que pode alcançar os quatro cantos do mundo imediatamente”. A descrição do Acadêmico Virgílio Almeida para um dos problemas gerados pelas fake news alerta para um perigo ainda pior nestes tempos de pandemia: a desinformação. Em sua apresentação, o Acadêmico explicou como notícias falsas são replicadas e podem afetar a humanidade.

“Vivemos tempos de crise e incertezas entre as pessoas. Esse contexto gera uma ansiedade e as pessoas procuram entender essa situação confusa”, afirmou Almeida, afirmando que as redes sociais e as plataformas de pesquisas são, no Brasil, as fontes mais procuradas de informação pela população. Segundo o cientista, que é professor associado do Centro Berkman Klein para Internet e Sociedade da Universidade de Harvard https://cyber.harvard.edu/people, o que há por trás dessas plataformas é uma grande quantidade de dados que podem conter informações confiáveis ou enganosas, gerenciadas por um complexo sistema de algoritmos e robôs, com um potencial de gerar grande quantidade de desinformação pela utilização mal intencionada.

Uma das consequências da disseminação de notícias falsas é a criação de rumores e teorias da conspiração, como a crença de que o novo coronavírus teria sido criado em laboratórios. “A desinformação gera confusão. Nesse sentido, a ciência pode contribuir, freando essa situação, refutando informações inverídicas e identificando a origem desses problemas. O papel da ciência em disseminar conhecimento é essencial numa crise como essa”, completou.

Além da ciência, o Acadêmico Virgílio Almeida também destacou o papel do jornalismo contra a disseminação de notícias falsas. Segundo ele, pequenas notícias falsas podem ganhar uma dimensão muito maior pelas redes, algoritmos e robôs, mas podem ser barradas por um jornalismo responsável. “Se há um jornalismo investigativo que mostre o que está acontecendo e dê valor às notícias baseadas no conhecimento, se cria um movimento contrário às notícias falsas”, disse.

A infodemia

O jornalista Bernardo Esteves criou e conduz o podcast de ciência “A Terra é redonda”, da revista Piauí. A criação do programa em um contexto de disseminação de fake news começou a atender também a desinformação gerada durante a pandemia e o isolamento social.

Esteves conta que, durante a gripe espanhola, pandemia ocorrida entre 1918 e 1919, as informações falsas também fizeram parte do contexto. “É possível traçar paralelos. As pessoas estavam muito assustadas e o pouco conhecimento tornou a sociedade permeável à circulação de fake news. Tratamentos alegados como efetivos, como hoje é o caso da cloroquina, eram considerados como opções de cura pela população”, contou o jornalista.

A guerra da informação e da desinformação nas redes sociais e a confusão gerada pelos questionamentos à ciência, como por exemplo a discussão sobre a eficácia do isolamento social contra a propagação do novo coronavírus, foi citada pelo jornalista por meio do termo “Infodemia”, ou seja, a disseminação crescente da desinformação. Esteves acredita que há uma crise de autoridade.  “A eclosão dessa pandemia está motivando que setores da sociedade que estavam alinhados com a desinformação voltem a procurar informação de qualidade, devolvendo a confiança da população aos profissionais que trabalham na busca da verdade, como os cientistas, pesquisadores e jornalistas”, disse.

Na visão de Bernardo Esteves, que tem mestrado em Engenharia de Sistemas e Computação e doutorado em História das Ciências e das Técnicas e Epistemologia, ambos pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), as mídias sociais garantiram à COVID-19 um diferencial em relação a outras pandemias. “O impacto no mundo todo de informações com conteúdos falsos, mas com aparência confiável, pode ameaçar o bem-estar das pessoas”, alertou o jornalista.

Enfim, a avaliação dos especialistas é que com um simples compartilhamento de informações não verificadas, a rede de desinformação é alimentada. Isso representa um grande risco, pois muitas pessoas decidem agir com base em mensagens enganosas, aumentando o impacto da pandemia sobre a saúde pública. Fiquemos atentos. Todos nós temos responsabilidade social, façamos nossa parte.

 

Confira o vídeo com os principais destaques desta edição.


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