A jornalista Ana Carolina Leonardi estudou comunicação digital e novas mídias na Universidade de Leeds, no Reino Unido, em 2015, depois de graduar-se na Escola de Comunicações e Artes da USP, onde atuou com professores e pesquisadores em tradução e divulgação de projetos de pesquisa para a comunidade externa à universidade. De 2016 a 2019 trabalhou na revista Superinteressante, buscando tornar hard science acessível, envolvente e divertida. Em junho deste ano conduziu uma atividade de comunicação científica no 4º Encontro de Membros Afiliados da ABC, em Fortaleza, com grande sucesso.

No evento “Ciência na América Latina: hoje e amanhã”, organizado pela ABC, Academia Mundial de Ciências (TWAS) e sua Academia jovem, a TYAN, realizado entre os dias 27 e 29/11, Leonardi integrou um painel sobre Comunicação Científica, junto com o jornalista da USP Herton Escobar, o sociólogo da UFMG Yurij Castelfranchi e o biólogo da UFRJ/IDOR, Stevens Rehen.

Ana Carolina Leonardi apontou que a sede do público por ciência – ou seja, por informação confiável, baseada em evidências sobre o mundo que o cerca – é subestimado pelos cientistas e pelos meios de comunicação tradicionais.

“Os cientistas conhecem a sensação de encantamento e prazer quando conseguem entender um pedacinho de um grande quebra-cabeça. É essa sensação que a boa comunicação científica proporciona ao grande público”, avaliou a jornalista.

Mas como alcançar e envolver esse público? Como atrair o interesse das pessoas para temas complexos e, algumas vezes, bastante técnicos?

Leonardi procurou explorar as oportunidades que o ambiente multimídia atual oferece para a comunicação científica, partindo de sua experiência na Super, onde os editores eram desafiados a escrever histórias para as diversas plataformas, da impressa ao podcast, do Instagram ao documentário.

No cenário da comunicação científica, segundo a jornalista, alguns aspectos são bastante complexos. A distância para que a pesquisa em si alcance o grande público é longa: envolve a publicação, discussões internas, explicações acadêmicas mais amplas, simplificação para o público em geral e repercussão. São muitos os agentes envolvidos e a disputa de atenção é grande, dada quantidade de informação disponível atualmente. “O desafio é encontrar espaço entre as tantas vozes que competem”, observou Leonardi.

Ela avalia que muitos pesquisadores brasileiros têm interesse na aproximação com o grande público, tanto com foco na divulgação do seu trabalho como da ciência, de modo geral. A disponibilidade dos cientistas para interações com jornalistas vem aumentando, em sua percepção. Até porque os tempos andam propensos a radicalismos e os cientistas precisam fugir do sistema de publicação científica, que é lento e dá pouca visibilidade às pesquisas. “Há uma crise da indústria do jornalismo, sua credibilidade está sendo afetada, assim como a das instituições científicas”, ressaltou Leonardi. “Daí a necessidade de maior intimidade com as mídias sociais, para que sejam construídas comunidades interessadas em ciência”, completou.

A construção de comunidades, porém, envolve os verdadeiros amantes de ciência e não apenas os entusiastas ocasionais. Embora menos numerosos, os verdadeiros fãs têm interesse em conteúdos sobre os mais diferentes temas, até mesmo os mais complexos, desde que apresentados em linguagem simples. E relata que a maior concentração de interesse ocorre nas noites de domingo. “O tamanho dos textos não importa tanto: o que faz diferença é a clareza da linguagem”, explicou Ana Carolina.

Outro aspecto importante é a adequação a cada mídia. O Instagram é mais adequado para a construção de comunidades jovens, e necessita mais planejamento visual. Já o Facebook é um ambiente mais propício a polêmicas, embora bastante flexível, assim como o Twitter. O You Tube requer um mínimo de roteiro antes e edição depois da gravação dos vídeos, assim como precisa de postagens regulares, para crescer a audiência.  Podcasts exigem menos técnica e esforço, aceitando melhor o improviso, mas precisam ser testados algumas vezes até que se acerte o tom.

A jornalista  enfatizou, porém, que cada um deve testar diferentes abordagens e prestar atenção às respostas. “O importante é avaliar seus recursos e encontrar suas referências, sendo realista. Escolha uma plataforma que tenha o seu perfil, cada uma vai requerer esforços diferentes”, explicou. Suas principais recomendação referem-se à construção de níveis de complexidade na elaboração da história, partindo de coisas que todo mundo conhece. E com atenção fundamental para a simplicidade na linguagem.

“Compartilhando o que aprendi espero enfatizar a importância do cientista no cenário da comunicação e provocar a reflexão sobre as diversas formas de linguagem que um cientista pode escolher para garantir que consiga atingir a sociedade da maneira mais simples e efetiva e, porque não, da maneira mais divertida também”, ressaltou Leonardi.

 

Confira a cobertura completa do painel de comunicação científica:

Jornalismo de ciência: um serviço de utilidade pública

Em evento na ABC, Herton Escobar alerta que investir em comunicação com a sociedade é uma questão de vida ou morte em tempos de pseudociência e “fatos alternativos” de responsabilidade das universidades públicas. 

Ciência é cultura

Stevens Rehen reforçou a importância de formas mais ágeis e interessantes de comunicação dentro e fora da academia, no evento da ABC “Ciência na América Latina: hoje e amanhã”.

Ataques à ciência são ataques à democracia

O sociólogo Yurij Castelfranchi, da UFMG, apontou no evento da ABC “Ciência na América Latina: hoje e amanhã” que um grande desafio para os cientistas e comunicadores de ciência hoje é a opinião pública.

 

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