No dia 14 de maio, durante a Reunião Magna da ABC, cujo foco era nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável, Adriana Abdenur abordou em sua palestra o Objetivo 16. Este ODS tem por finalidade promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis.

Adriana é doutora em sociologia pela Universidade de Princeton. Dentre suas atividades, ela compõe o Conselho do Centro Internacional das Forças Armadas Suecas (Swedint), encarregado de treinamento para operações de paz e é membro do Comitê de Políticas de Desenvolvimento do Conselho Econômico e Social da ONU.

Segurança é pré-condição para o desenvolvimento

Ela apresentou o Instituto Igarapé https://igarape.org.br/, onde coordena a Divisão de Paz e Segurança. Esta é uma instituição sem fins lucrativos e apartidária, que tem 80 funcionários, incluindo economistas, sociólogos e cientistas políticos. “É um centro de pensamento independente, dedicado à integração das agendas da segurança, justiça e do desenvolvimento”, explicou Adriana.

Embora sediado no Rio de Janeiro, a atuação do Instituto transcende fronteiras locais, nacionais e regionais. De fato, o Igarapé está conectado a um amplo ecossistema de organizações e agências do Brasil e do mundo todo.

Seu objetivo é propor soluções inovadoras a desafios sociais complexos, por meio de pesquisas, novas tecnologias, influência em políticas públicas e articulação. Atualmente o Instituto atua em cinco áreas: consolidação da paz, política nacional e global sobre drogas, cidades seguras, segurança cidadã e segurança cibernética.

Adriana ressaltou que a segurança é uma pré-condição para o desenvolvimento do país. É um bem público e um direito de cada cidadã e cidadão. Daí a importância do ODS 16, abordado por Adriana em sua palestra. Ela explicou que seu foco de atuação é “tornar o Brasil, a América Latina e o Sul Global mais seguros”.

Em termos globais, o ODS 16 é fundamental porque metade da população de baixa renda vive em áreas afetadas por conflitos ou em Estados frágeis. “Em menos de dez anos, essa condição pode envolver mais de 80% da população global”, destacou a pesquisadora.

Os conflitos mundiais vêm aumentando, especialmente os conflitos não-estatais e transnacionais, que se tornam mais complexos e se confundem com dinâmicas interestatais. Alguns dos focos destacados por Adriana são a guerra civil na Síria, a instabilidade política no Iraque, Líbano, Egito e Venezuela; os conflitos na Ucrânia, entre a Turquia e os grupos Curdos armados, entre Israel e Palestina, entre Índia e Paquistão; o Boko Haram na Nigéria, a militância islâmica no Paquistão, a violência criminal no México.

“Precisamos transformar ideias em ação, em arcabouço jurídico”

Para o Brasil, esse ODS é importante porque trata de questões como a expansão do crime organizado (façcões, milícia), corrupção, lavagem de dinheiro e falta de transparência. Na perspectiva da palestrante, a eficácia das instituições brasileiras é variável. “A sensação de medo e insegurança no país só cresce, com escolas tendo aulas suspensas por causa de tiroteios, hospitais que suspendem atividades por causa de violência e por aí vai.”

A especialista destacou que o Brasil é o país com mais homicídios no mundo. O número é maior do que o de países que estão envolvidos em guerras civis. “Há um apartheid do assassinato aqui: os negros são 71% das vítimas e o número vem aumentando, enquanto que o de brancos mortos diminuiu. Uma mulher é morta a cada 2 horas no país”, apontou Adriana.

Ela relatou que o Primeiro Comando da Capital e o Comando Vermelho, organizações criminosas do Brasil, aumentaram a ação no nordeste e norte do país. Adriana relata que eles entraram no sistema penitenciário de Roraima, com foco na nova rota para a cocaína. “Os políticos locais falam muito no aumento de criminalidade por conta dos refugiados, mas é uma falsa premissa”.

Segundo a conferencista, a mineração ilegal também serviu para aumentar a criminalidade no norte do país. Acrescentou que o preço do ouro aumentou tanto que está valendo mais a pena investir na extração de ouro do que no tráfico de cocaína.

A percepção da insegurança é um empecilho para que outros serviços sejam acessados. “Há o projeto de criação do Sistema Único de Segurança Pública, o SUSP. A ideia é muito promissora, pois uniria diversos órgãos de segurança pública. Mas ainda não foi implementado”, lamentou Adriana.

Para a socióloga, “nós sabemos o que fazer, temos produção cientifica, temos grandes especialistas”. O que falta é a capacidade de transformar as ideias em ação, em arcabouço jurídico”.

Ela listou algumas recomendações. Compartilhar informação, por exemplo, é uma questão fundamental. Ela sugere a ampliação, aprimoramento, e institucionalização da coleta de dados referentes aos temas de violência e o seu monitoramento. “Temos que fomentar uma ‘cultura da evidência’”, salientou Adriana. Estas evidências devem servir de base para a formulação e implementação de políticas, subsidiando a tomada de decisão. “E com insumos dos setores não governamentais”, acrescentou.  Recomendou, inclusive, que se aprofunde a coordenação entre repartições do governo, forças, sociedade civil e setor privado, assim como entre grupos que atuam nos demais ODS. “Temos que ampliar, também, a cooperação regional e a troca de experiências em torno dos desafios e soluções”, finalizou Adriana Abdenur.

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