As diferenças entre China e Brasil são nítidas, uma vez que o primeiro é um país oriental, o outro é ocidental; um tem 1.33 bilhões de habitantes e o outro tem 209.3 milhões; em um ainda é dia, enquanto no outro já é noite. Na terceira sessão da Conferência Internacional “Como Ciência e Tecnologia Podem Contribuir para a Redução da Pobreza e da Desigualdade, o sociólogo chinês Liu Jinlong, especializado em desenvolvimento rural, e o Acadêmico Ricardo Paes de Barros, economista, mostraram que essas naturezas tão distintas têm em comum o foco nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODSs), estabelecidos pela ONU. Eles debateram formas de melhorar as condições de vida dos menos favorecidos, com abordagens referentes aos seus respectivos países, a fim de abordar os ODSs referentes à erradicação da pobreza e à redução das desigualdades. A sessão foi moderada por Ratemo Michieka, membro e secretário honorário da Academia Nacional de Ciências do Quênia. 

Liu Jinlong, Ratemo Michieka e Ricardo Paes de Barros

Paes de Barros pontuou três estratégias utilizadas pelo Brasil na redução da pobreza e da desigualdade que poderiam ser reproduzidas por outros países, e também citou outras três atitudes não tão exemplares. Dentre as ações bem sucedidas estão a redução das desigualdades, a garantia de que o salário e as oportunidades de trabalho dos menos favorecidos expandam e um alto investimento em educação. Para o Acadêmico, “se é necessário aumentar o salário dos mais pobres, é preciso aumentar a produtividade deles e, para isso, é essencial o aumento das oportunidades educacionais”.

A China já está utilizando estratégias parecidas, que foram definidas pelas Diretrizes da Redução da Pobreza Rural do país (2011-2020) e determinam que a população pobre deve ser provida de alimentos e roupas, e as crianças dessas famílias devem ter acesso à educação obrigatória por nove anos. Necessidades médicas básicas e condições de vida dessas pessoas também devem ser garantidas, de acordo com as diretrizes.

 

O que o Brasil e a China tem feito para reduzir a pobreza e as desigualdades? 

Quando o assunto diz respeito a uma sociedade mais igualitária, o professor Liu Jinlong acredita que na China, as desigualdades não são tão sociais e, sim, regionais, uma vez que as pessoas mais pobres são as que moram no campo, nas regiões mais afastadas. Para ele, “essas regiões são isoladas, ecologicamente frágeis, não há recursos suficientes para sustentar que as pessoas vivam nas áreas ricas, então elas se mudam, migram. No Brasil, a situação social é muito mais complexa, devido a grande diversidade de etnias, raças e classes”.

Para tentar atingir o décimo Objetivo, que diz respeito à redução das desigualdades, o Brasil utilizou a educação como mecanismo principal e, com uma sociedade menos desigual, acabou reduzindo ainda mais a pobreza. Essa redução gerou o aumento da taxa de crescimento da renda dos menos favorecidos de forma muito mais rápida que a média do país. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), trazidos pelo economista brasileiro, no país, entre 2001 e 2015, a renda dos 10% mais pobres cresceu, a cada ano, a uma taxa de quatro vezes mais que a renda dos 10% mais ricos.

Ricardo Paes de Barros ainda alegou que “esse processo produz um crescimento econômico mais lento, no geral, mas o Brasil conseguiu reduzir a pobreza pela metade em 15 anos, ou seja, as taxas foram de 40% para cerca de 15%, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), realizada pelo IBGE. Logo, é possível reduzir a pobreza, mesmo em países que não cresçam muito, desde que eles reduzam as desigualdades”. 

Em relação ao primeiro Objetivo, que trata da erradicação da pobreza, Liu Jinlong pontuou que “um grande desafio para a redução da pobreza na China é a integração do conhecimento e da cultura tradicionais com a ciência e a tecnologia modernas”. Para promover essa interação, o país pretende promover o uso de alta tecnologia, como a detecção remota por satélite, popularizar a ciência nas áreas precárias, desenvolver a informatização rural, além de ações para desenvolver a indústria, como a construção de parques científicos e tecnológicos.

 

O que deu errado?

Por outro lado, no mesmo período o Brasil também adotou atitudes que não devem ser reproduzidas por outros países, uma vez que “foi muito eficiente na redução das desigualdades, mas não tão eficiente a ponto de ter a disciplina de se manter no orçamento”, aponta Paes de Barros. Além disso, o país aumentou muito a dívida pública e elevou o salário mínimo dos trabalhadores muito mais rápido do que a produtividade. Ainda de acordo com o Acadêmico, há uma falha recorrente de comunicação entre o sistema produtivo e o sistema educacional, que vem impedindo que colaborem entre si.

Apesar dos grandes avanços percebidos até 2014, um gráfico com os resultados da PNAD, exibido pelo economista, mostrou que entre 2015 e 2017 e o percentual de pessoas vivendo na pobreza voltou a subir. De acordo com Ricardo Paes de Barros, “se o Brasil tivesse a capacidade de transformar a educação em produtividade, como a Turquia e a Coreia fizeram, o crescimento da economia brasileira nos últimos 25 anos levaria o país para uma posição entre os 25% dos países com melhor PIB per capita do mundo”.

 

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