A palavra prelúdio vem do latim “praeladium” e significa a experiência prévia de algo que vai acontecer. O prelúdio de algo é sempre uma antecipação ou aviso. Nada mais pertinente do que refletir sobre o prelúdio da realidade brasileira nas próximas décadas. O termo é também o título de um Programa regular da TV Cultura em que jovens talentos da música erudita – instrumentistas e cantores/as – têm a oportunidade de mostrar suas habilidades e concorrem a uma bolsa de estudos em Budapeste.Nesse programa comandado de forma brilhante pelo Maestro Júlio Medaglia, já se apresentaram mais de duas centenas de jovens que hoje nos encantam com seus talentos musicais.

É extraordinário observar que esses talentos são oriundos de todo o território nacional e de diferentes classes sociais. Isso demonstra que, mesmo em um país onde a cultura não recebe a atenção que merece, esses talentos, muitas vezes em condições adversas, se desenvolvem. Assistir a um programa como esse alimenta a nossa esperança, pois revela que temos uma juventude capaz de construir um Brasil cada vez melhor. Da mesma forma que temos talentos na área musical, temos talentos em outras áreas. Um exemplo é o desempenho de nossos jovens nas competições internacionais de matemática.

Voltemos ao prelúdio da nação brasileira.

Vivenciamos uma época dramática no cenário brasileiro. As desigualdades sociais, a educação em crise, o desmonte do sistema de Ciência e Tecnologia, a criminalidade, a alta taxa de desemprego, o colapso da saúde pública e a crise ética na política são adversidades a serem superadas.

É preciso que identifiquemos os nossos talentos em todas as áreas de atuação e conhecimento para que tenhamos líderes que possam transformar o cenário atual em um cenário virtuoso.

A liderança é um talento que precisa ser identificado e desenvolvido. Howard Gardner define talento “por um arranjo complexo de aptidões ou inteligências, habilidades instruídas e conhecimento, disposições de atitudes de motivações que predispõem um indivíduo a sucessos em uma ocupação, vocação, profissão, arte ou negócio”. Segundo a Organização Mundial de Saúde, cerca de 4% das crianças e jovens apresentam altas habilidades gerais ou específicas. Em muitos países, notadamente nos Estados Unidos, Canadá, Alemanha e Holanda, a abordagem para os estudantes com altas habilidades tem sido estudada. Nos Estados Unidos, por exemplo, há pelo menos dez periódicos voltados exclusivamente para a publicação de artigos ligadas a essas questões.

A educação formal no Brasil é feita com um tratamento homogêneo dos estudantes, sem reconhecer a diversidade entre eles. Especialistas no campo da educação de talentos apontam que a identificação precoce do talento é importante.

De maneira geral, as escolas não dispõem de recursos e não têm um corpo docente adequadamente preparado para prover os desafios acadêmicos, sociais e emocionais para proporcionar o desenvolvimento desses talentos que serão as nossas futuras lideranças. Quatro dimensões são consideradas importantes para aferir o potencial de liderança: o autodesenvolvimento, a habilidade no relacionamento interpessoal, a visão sistêmica e o senso crítico e a responsabilidade.

Essas características se manifestam e podem ser percebidas nos primeiros anos de vida e devem ser desenvolvidas no ambiente escolar.

A tendência de a aprendizagem ser baseada na discussão de temas e resolução de problemas pode ser considerada como um cenário adequado para o exercício do pensar e da crítica argumentativa.

Uma correta visão de um mundo civilizado e o estímulo ao conhecimento geral seriam pré-requisitos para a formação de nossos futuros líderes.

Um ambiente de total liberdade de diálogo e de expressão de pensamentos é absolutamente fundamental para o estímulo na formação de lideranças.

Romper com a falsa verdade de que alguém é o dono das verdades e diminuir a importância de seu próprio “eu” também devem fazer parte de um ambiente para a formação de novas lideranças que nos conduzam a um novo Brasil sem desigualdades sociais, em que todos os brasileiros e brasileiras possam realizar os seus sonhos. Vamos nesse prelúdio de uma nova era para o Brasil identificar e estimular os nossos jovens talentos. Eles serão os protagonistas de um Brasil melhor e mais justo. Esse é o caminho e a nossa esperança.

Isaac Roitman é membro da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Professor emérito da Universidade de Brasília (UnB) e membro do Movimento 2022 O Brasil que queremos.