O Euraxess Science Slam é uma iniciativa da União Europeia promovida no Brasil, China e Índia que estimula jovens pesquisadores a apresentar sua pesquisa em 6 minutos de forma criativa, original e acessível para todo tipo de público. São enviados vídeos de todo o país e selecionados cinco finalistas. Estes ganham um media coaching no dia anterior à final, sendo que em 2018 a novidade foi a oferta de mais duas sessões de coaching on line. O vencedor ganha uma viagem à Europa para um centro de pesquisa de sua escolha.

O desafio vem ocorrendo no Brasil desde 2013, e a Academia Brasileira de Ciências (ABC) vem atuando como parceira, tendo seus membros atuando no júri da apresentação final e, através da Assessoria de Comunicação, fazendo divulgação, cobrindo o evento e difundindo o resultado. A principal responsável por todo o processo de organização é Charlotte Grawitz, representante da Euraxess no Brasil, que é mestre em economia, especializada em economia internacional e do desenvolvimento.

Práticas corporais

A professora de dança da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Nathalia Menezes conduziu a primeira atividade, dividida em três partes. “Para quebrar o gelo e soltar o corpo”, disse, animada, orientando o grupo na formação de três filas. Cada fila andava para um lado e seguia o “mestre” em seus movimentos, isto é, imitava a “coreografia” do primeiro da fila. Quando a música parava, o líder ia para o fim da fila e o seguinte se tornava o “mestre”.

Na segunda parte, formaram-se pequenos grupos, nos quais um dos participantes era escolhido como “boneco”. A cada grupo era mostrado um emoji e os componentes tinham que “modelar” o ícone no rosto do “boneco”, que devia adivinhar o emoji escolhido. Por fim, a música rolava e todos caminhavam livremente. Quando o som parava, todos paravam e procuravam preencher com o corpo- deitados, sentados ou em pé, como quisessem – o espaço entre si e o outro.

Lindo resultado visual, gargalhadas e interação. Objetivo atingido, passando para outro treinador.

Ciência e humor: Grupo Gatu

O vencedor do Science Slam de 2015, Leonardo Parreira, integra o Grupo Gatu de Comunicação Científica, sediado no interior de São Paulo. Ele falou sobre o uso do humor em apresentações científicas, explicando que o riso provoca prazer em quem ri e em quem faz rir. “O riso prende a atenção e provoca o aumento de neurotransmissores”, explicou. Ele afirmou que o humor, aliado à linguagem simples, são ótimos recursos para facilitar a comunicação do cientista com o público leigo.

Parreira explicou que a piada é formada de dois elementos: o “set up“, que é a informação real, ou seja, no caso o conteúdo científico; e a “punch line“, que é o elemento absurdo, surpreendente, distorcido. Alertou, porém, para o cuidado necessário com o conteúdo da piada, para fazer rir sem agredir. “Não fazemos piada do doente e sim da doença”, apontou.

O exercício para a plateia era simples: de dois em dois, um fazer cócegas no outro. Em meio às risadas inevitáveis, parreira explicou que essa atividade envolve dois elementos: a intimidade e a violação. Ao mesmo tempo que o toque é benigno, no sentido de que não machuca, invade o espaço do outro. E é essa é uma fórmula de piada.

Outro elemento citado pelo treinador foi a aproximação: sempre incluir na sua palestra algo que o aproxime do público, como referências bem humoradas à cidade onde  o evento está ocorrendo, ou sobre a Europa e a Euraxess, enfim referências comuns na quele momento entre quem está na plateia e o apresentador.

Por último, Leonardo parreira falou do “call back” – recurso de humor que resgata algo que foi dito antes e no desfecho ganha um significado engraçado.

Citou, ainda, uma pesquisadora inglesa, Sophie Scott, que demonstra que se o palestrante rir, alguém vai rir com ele e isso gera uma reação em cadeia, como visto no vídeo produzido por Scott “Skype Laughter Chain“.

Ideias inovadoras para além da academia

O farmacêutico, bailarino e doutor em Gestão, Educação e Difusão de Ciências  pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), João Silveira, que trabalha na Swissnex, promoveu a atividade seguinte e fez com que cada participante saísse do evento com um projeto de clipe pronto do seu trabalho.

O público, munido de lápis e papel, tinha alguns minutos para responder por escrito a cada pergunta proposta por Silveira, sempre com no máximo dez palavras. Após atribuir um número a cada pessoa, ele deu início à atividade. A sequência de perguntas era: “Qual a sua ideia? Com quem você pode se unir ou colaborar para realizá-la? Como você está preparado? Qual o diferencial da sua proposta em relação ao que já existe?” A cada rodada de respostas, Silveira sorteava um número e a pessoa ia para a frente ler suas dez palavras. Três pessoas compartilhavam com todos suas respostas.

No final, João Silveira dedicou um tempo para conversar com os participantes, explicando que as anotações de cada um eram um projeto de “pitch” do seu trabalho. Nota dez.

Comunicação objetiva, uma arte

O biólogo da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Ronaldo Christofoletti fez uma apresentação teórica sobre detalhes que considera importantes na comunicação científica. Ele introduziu o tema destacando a importância da divulgação de ciência para a sociedade, que deveria se tornar uma política pública. Mas destacou que transformar um conhecimento complexo numa comunicação simples não é uma tarefa fácil.

“O mais importante é conhecer o público-alvo”, ressaltou Christofoletti, explicando que o conteúdo tem que ser adequado a cada tipo de audiência. “Temos que eleger conceitos básicos: o que é que você quer que a pessoa lembre da sua apresentação depois de três dias?”

Uma dica é a inclusão da pessoa com quem se está conversando. “O que se diz tem que ter relação com quem está ouvindo, a pessoa tem que se sentir parte daquilo”.

E o que você, como palestrante, quer que a pessoa sinta ou faça a partir do entendimento do conceito apresentado? É a próxima reflexão sugerida por Christofoletti. Outra dica é valorizar o início e o fim da apresentação. “O ideal é criar uma estrutura, um esqueleto para o seu conteúdo e aí desenvolver.”

Antes do dia de treinamento presencial, Christofoletti ofereceu apoio à distância. “O coaching online foi uma excelente oportunidade para estimular os participantes a reconhecerem suas características e estruturarem suas propostas de forma mais adequada para a platéia, respeitando os objetivos de cada finalista”, relatou. Ele promoveu sessões individuais, onde discutiram qual a proposta de cada um  e como os seus potenciais e desafios poderiam ser trabalhados para que fizessem uma apresentação clara, com conteúdo e com segurança. “O objetivo do coaching não é direcionar as atividades dos participantes, mas sim ajudá-los a identificar seus objetivos e fortalecer suas próprias habilidades de comunicadores, incluindo a segurança em momentos sob pressão”, explicou o cientista, acrescentando que criar conexão com a audiência é uma das características essenciais para uma comunicação eficaz. “A audiência tem que sentir que é o foco da apresentação”, observou Christofoletti.

Ciência Hoje: um caso de renovação e superação de dificuldades

A jornalista Bianca Encarnação falou sobre a revista Ciência Hoje, criada em 1982 e precursora na comunicação de ciência ao público. Ela relata que a revista viveu períodos de grande sucesso, mas também passou por grandes dificuldades. A pior crise foi nos anos de 2015 e 2016, quando toda a estrutura da revista foi desmontada. “Em dezembro de 2017 a produção de conteúdo foi interrompida”, contou Bianca.

Com trabalho voluntário, inclusive da própria Bianca, a revista conseguiu ser resgatada em meados de 2018. “Agora ela é 100% digital, com possibilidade de impressão por demanda”, relatou. O elemento novo, que foi introduzido este ano, foi a interatividade. “Os cientistas fazem ‘pitches‘ de um minuto resumindo o que vão apresentar na próxima edição”, conta Bianca, explicando que estes vídeos ficam publicados por três dias com um chat aberto para comentários e perguntas do usuário. “Depois, ele constrói o artigo a partir das demandas do público”, informou. Bianca relatou que a coisa que mais muda na apresentação dos pesquisadores é a ordem em que a informação é apresentada. “A inversão de prioridades faz a maior diferença”.

Ela propôs então uma atividade: pediu que o público se dividisse em cinco grupos, cada um contendo um finalista do Science Slam, que contaria seu projeto e teria a ajuda dos membros do grupo para montar sua apresentação. Gravaram então um vídeo de um minuto, com o resultado. Dinâmico e proveitoso.

Integração de dimensões técnicas e humanas

Vencedor do Euraxess Science Slam 2017, Arthur Domingos de Melo preparou para os participantes uma palestra sobre o equilíbrio entre conteúdo e entretenimento em apresentações científicas. Ele indicou ferramentas e possibilidades para que o conhecimento produzido pela pesquisa acadêmica seja ensinado de forma a atender as demandas do público geral.

O doutorando em biologia vegetal pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) indicou que “esse movimento que a academia e a ciência ensaiam nesse momento, de sair das bancadas, de se fantasiar, de contar piada, contar histórias, é um movimento que a docência, que os professores, fazem há muito tempo”.

Além disso, Arthur falou também sobre como os espaços não formais de aprendizagem, como parques e museus, e os textos de divulgação científica também podem agregar na elaboração de apresentações científicas.

Para suprir a demanda por conhecimento e “fazer as pazes entre o que se espera de uma produção científica de qualidade e uma aceitabilidade da sociedade”, Arthur apontou a necessidade de se desenvolver bons modelos, como o famoso modelo de pudim de passas de Thompson. Ele explica que os modelos são meios de apresentar os processos de ciência, contornando as dificuldades de linguagem. “O grande segredo é tentar traduzir aquilo que você conhece através de modelos que usem palavras que fazem parte do mundo daquela pessoa”, afirmou Arthur.

O cientista falou também sobre a utilização da estética e do afeto como meios de atingir, além da dimensão técnica, a dimensão humana. Ele trabalhou o assunto introduzindo suas próprias experiências à apresentação, e por fim, apresentou o tema de sua pesquisa atual no poema “Quiropterófila”, unindo arte e ciência para falar sobre a polinização por morcegos.

Ensaio final

Durante a tarde foi realizado um mutirão de performances e os cinco finalistas do Euraxess Science Slam tiveram a oportunidade de realizarem suas apresentações na frente dos treinadores e do público que acompanhou as palestras pela manhã. Pensando em surpreender os presentes na apresentação final, os cientistas guardaram algumas atrações para a performance oficial, a ser realizada no dia seguinte.

Os treinadores foram divididos em três grupos, com a participação da bióloga e doutora em Educação, Gestão e Difusão de Ciências pela UFRJ Juliana Aguiar, da Rede de Pesquisadores, que ofereceu treinamento on line aos finalistas. Ela propôs uma atividade que batizou de “Conheça-te ou Devoram-te”, uma dinâmica de autoconhecimento para evidenciar potencialidades e fragilidades de cada finalista. “Eles foram desafiados a refletir e usar a criatividade para apresentar, por meio de selfies, características da sua personalidade que eles consideram pontos fortes e outros aspectos que gostariam de aprimorar”, explicou Juliana, acrescentando que cada um teve a oportunidade de praticar a empatia, conhecer um pouco mais de si e do outro, além de compartilhar dicas para se sentirem mais seguros.

“Aquele que sabe explorar as próprias habilidades age com autoconfiança ao fazer uso de suas competências, além de utilizar as emoções a seu favor. Revelar um estilo próprio amplia possibilidades de explorar a criatividade e a originalidade”, arrematou Juliana Aguiar.

Leia a matéria sobre a finalíssima do evento, realizada em 17/10.