“Morreu, aos 200 anos de idade, o Museu Nacional do Rio de Janeiro. Com ele, uma parte importante da ciência e da memória do Brasil.”
Este epitáfio é de autoria do presidente da ABC, Luiz Davidovich, sobre a terrível tragédia que foi o incêndio do Museu Nacional, ocorrido na noite de 2 de setembro. “Uma tragédia para a ciência brasileira e para a ciência mundial. São 200 anos de conhecimento, de memória, de registros importantes que são perdidos nesse desastre, que reflete o descaso das autoridades com o conhecimento, com a ciência, com a história, com a memória do país. Foi mais um duro golpe para a sofrida ciência brasileira nesses últimos anos, vítima de sucessivos cortes orçamentários. Que esse seja um momento de reflexão sobre a importância do patrimônio histórico do nosso país”, destacou.
Davidovich ressalta que os cortes sucessivos que sofreu o Museu Nacional levaram ao que pode até ser considerada uma tragédia anunciada, em vista dos dados do gráfico abaixo.
De acordo com material enviado à ABC pelo Acadêmico Renato Cordeiro, de autoria do pesquisador do Departamento de Vertebrados do Museu Nacional da UFRJ, Paulo Buckup, “os prédios dos Departamentos de Vertebrados, Departamento de Botânica, Biblioteca Principal, Pavilhão de Salas de Aulas, Laboratório de Arqueologia na Casa de Pedra, Anexo Alipio de Miranda Ribeiro, e anexo da coleção do Serviço de Assistência ao Ensino não foram atingidos. A sobrevivência do Anexo Alípio de Miranda Ribeiro é importante, pois continha algumas coleções de invertebrados e dipterologia.
O prédio principal – Palácio da Quinta da Boa Vista – teve perda total, com a possível exceção da coleção de material tipo de moluscos que pude ajudar a salvar graças a um técnico da Coleção que nos guiou em meio à escuridão. Os funcionários que participaram do mutirão dos últimos momentos estão de parabéns pela coragem e dedicação, embora muito pouco tenhamos conseguido fazer.
As grandes perdas foram os materiais da exposição e as coleções situadas no prédio principal: arquivo e acervo histórico, maior parte das coleções entomológicas, antropológicas, coleções de aracnologia e crustáceos. O acervo de paleontologia e mineralogia talvez possa ser parcialmente resgatado, se for feito um trabalho cuidados após o rescaldo. Das coleções de vertebrados, perderam-se os exemplares das exposições antigas que seriam incorporados na nova exposição, mas a maior parte do acervo científico está preservada. Por enquanto é isto. Vou tomar um banho para lavar a fuligem e restos de carvão e este cheiro miserável de incêndio e destruição.”
Mas a esperança sobrevive. Um grupo de estudantes de museologia da UniRio está divulgando amplamente nas redes sociais uma campanha para que quem tenha fotos do Museu envie-as para que seja organizado um acervo de memórias pessoais, tornando-as coletivas. Vamos colaborar.
O especialista em tecnologia Ronaldo Lemos também se manifestou e criou, em forma de abaixo-assinado, uma carta em defesa do Museu Nacional: pela ciência, tecnologia, educação e cultura no Brasil. Para apoiar a iniciativa, clique aqui.
A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) no Brasil publicou em seu site uma nota lamentando “a perda incalculável para a cultura, a ciência e a história natural” resultante do incêndio que atingiu o Museu Nacional.
O presidente da ABC aponta para que as forças da nação se dirijam para a reconstrução do Museu Nacional. “Começar de novo. Vamos começar hoje, 2ª feira, 3 de setembro, a reconstrução do Museu Nacional. Porque um país sem memória vai ter dificuldade de construir seu futuro.”
Em depoimento para a ABC, o historiador e Acadêmico José Murilo de Carvalho declarou: “O ano de 2018 já tem sua marca. Não serão as eleições presidenciais, seja qual for seu resultado. Será o crime de lesa-pátria, cometido ao longo de anos por sucessivos governos, o crime de desinteresse e negligência em relação ao Museu Nacional que levou a sua extinção pelo fogo. Pela importância arquitetônica do prédio, pela riqueza fabulosa do acervo que registrava nosso percurso desde a pré-história, pelo que representou como uma de nossas mais importantes instituições de pesquisa, a morte do Museu é também a morte de parte de nossa história e de nossa cultura. Qual pode ser o destino de uma nação que comete tais crimes?”