Adalberto FazzioLeia artigo do Acadêmico Adalberto Fazzio publicado no blog Ciência & Matemática, do jornal O Globo:

É fantástico acompanhar como se dá o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. Vou citar aqui um caso bem recente, talvez seja uma das grandes inovações na área de materiais, os isolantes topológicos.

Até pouco tempo cientistas consideravam inviável a existência de materiais em duas dimensões (2D). Entretanto, de forma inovadora, os pesquisadores Andre Geim e Konstantin Novoselov da Universidade de Manchester/Inglaterra, em 2004, conseguiram obter um material bidimensional formado somente por átomos de carbono – o fantástico GRAFENO! Este grande feito lhes rendeu o Nobel em Física no ano de 2010. Atualmente, o grafeno já é bastante conhecido da comunidade científica, sendo um dos principais focos de pesquisa do nosso INCT Nanocarbono. Esse material tem uma única estrutura planar (por isso chamamos de materiais 2D ou bidimensional) com átomos dispostos como uma colmeia, formando hexágonos.

De forma surpreendente, logo após a obtenção do grafeno, físicos teóricos da Universidade da Pensilvânia, Kane e Mele, estudando as propriedades eletrônicas deste nanomaterial, descobriram que poderia haver uma outra fase/classe de estrutura eletrônica de materiais – os denominados isolantes topológicos. Mas o que eles têm de especial?

Para simplificar, tomemos o caso de duas grandes classes de materiais do ponto de vista eletrônico. Conhecemos os isolantes, que são materiais que não conduzem eletricidade, como a borracha e os metais condutores de eletricidade, como o cobre. Estes são estados eletrônicos da matéria bem compreendidos pela comunidade científica e bem fundamentados pela Mecânica Quântica. Kane e Mele mostraram que há uma outra ordem não trivial da matéria, diferente dos já conhecidos metais e/ou isolantes, os fascinantes isolantes topológicos. Esses são materiais que apresentam o “bulk” (a parte central ou interna do material) isolante e a superfície (ou borda) metálica!

Mas por que topológicos? Topologia é um ramo da matemática que estuda a estrutura dos objetos sem se preocupar com seu tamanho ou formato. Só para exemplificar (ver figura), considere um “donut” o qual podemos lentamente ir deformando-o até ficar em outro formato, podemos até modelar em uma caneca. Também podemos pegar uma bola de futebol e deformá-la e transformá-la como na figura. Entretanto, nunca poderemos fazer nosso “donut” virar uma bola e vice-versa. Dizemos que eles apresentam diferentes classes topológicas!

Classe topológicas

O mesmo acontece com nossos materiais isolantes – existem os materiais que são isolantes normais e os isolantes topológicos, ou seja podemos perturbá-lo com campo elétrico, pressão etc. e nunca um isolante topológico se transformará em um isolante convencional.

E qual a consequência dessa invariância quando um isolante topológico fica em contato com um isolante convencional? Para bola de futebol virar um “donut” teríamos que destruí-la fazendo buraco! No caso dos isolantes haverá na região de contato um estado metálico! E pode-se mostrar que esse estado metálico não pode ser destruído e nem modificado.

Se considerarmos, por exemplo, uma isolante topológico bidimensional, a sua borda será metálica e os elétrons conduzem sem serem importunados por perturbações (exceto magnéticas) podendo a corrente elétrica fluir sem dissipação! Ou seja, podemos dizer que isolantes topológicos são materiais que apresentam suas superfícies metálicas protegidas e são isolantes no “bulk”. Esses isolantes são a grande coqueluche na física e ciência de materiais. Tem atraído grande atenção da comunidade devido seu potencial para aplicações em nano-dispositivos, spintrônica e computação quântica.

Hoje já são conhecidos um número grande de isolantes topológicos 2D, como exemplo podemos considerar a mesma configuração estrutural do grafeno, substituindo alguns átomos de carbono por átomos mais pesados da mesma linha da tabela periódica, como silício, germânio, bismuto, etc.

Pesquisadores do LNNano/CNPEM, UFMG, UFU e UFF, participantes do INCT Nanocarbono, têm contribuído fortemente na pesquisa de novos materiais da classe de isolantes topológicos, no entendimento de suas interfaces com semicondutores, no transporte eletrônico com publicações em revistas de grande impacto.

Certamente esses materiais promoverão grandes mudanças em novos nanodispositivos. Portanto, o impacto do conhecimento científico e tecnológico de novos materiais é determinante para o desenvolvimento de novos dispositivos e mais uma vez a comunidade que faz ciência no Brasil está na vanguarda dessa inovação.