A inovação é base importante no tripé de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento. Mas como avaliar o retorno que os investimentos em pesquisa geram? Com o intuito de debater essa questão, a Academia Brasileira de Ciências (ABC) e a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) se uniram no Seminário Internacional de Promoção, Desenvolvimento, Apoio e Avaliação da Inovação, na sede da ABC.
davi_left.jpg O presidente da Academia, Luiz Davidovich comentou sobre a importância da avaliação neste contexto: “Mais do que nunca, precisamos convencer autoridades sobre a necessidade da ciência e tecnologia e, nesse sentido, a avaliação é muito importante, porque mostra esse retorno.” Davidovich citou ainda importantes descobertas feitas no Brasil, como o uso de bactérias no solo para aumentar a produção de soja, pesquisa da engenheira agrônoma Johanna Döbereiner; e o pré-sal, responsável por metade do petróleo produzido no Brasil. “O caminho da inovação é o caminho para o Brasil. O país não pode ficar para trás, precisa ser arrojado, e isso vem dessa união, da ciência com inovação”, concluiu o presidente.
cintra_left.jpgMarcos Cintra, presidente da Finep, abordou a forma como os gestores do Brasil tem lidado com a crise e criticou o método de corte linear e indiscriminado de gastos. “Acredito que o ajuste fiscal é necessário, mas existem maneiras e maneiras de fazê-lo. Hoje, o governo não tem critérios de avaliação, não hierarquiza seus gastos”, defendeu. Ele explicou que o corte de gastos pesa sobre as chamadas atividades discricionárias, que são as voltadas para bens e serviços públicos. Em 2015, 19,5% do PIB foi direcionado para o gasto primário federal do país. Deste valor, apenas 3,9% correspondiam às atividades discricionárias, dividindo-se entre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Ministério da Saúde, da Educação, Desenvolvimento Social e outros setores, conforme mostra o gráfico abaixo.
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Para Cintra, um método mais pertinente de redução de custos seria o Orçamento Base Zero. Comum nos Estados Unidos desde a década de 70, a técnica econômica leva em conta o retorno social dos projetos públicos, avaliando sua eficácia e renovando o orçamento com a retirada dos programas que não atingiram o sucesso estipulado. “Hoje, no Brasil, qualquer coisa que já tenha entrado no orçamento permanece por inércia, mesmo não havendo um retorno social”, criticou o economista.
Novas perspectivas de CT&I
kurose_left.jpgProfessor emérito da Faculdade de Informação e Ciência da Computação da Universidade de Massachusetts Amherst (EUA) e diretor da Fundação Nacional de Ciência (NSF, na sigla em inglês) para as áreas de Engenharia, Ciência e Computação (CISE, na sigla em inglês), James Kuroseexplicou como ocorre a produção de pesquisa e avaliação na NSF-CISE.
A NSF é uma agência governamental independente dos Estados Unidos, criada pelo Congresso em 1950, que promove a pesquisa e educação fundamental em todos os campos da ciência e engenharia. Segundo Kurose, a agência é responsável por fomentar toda a área de pesquisa, exceto a voltada para saúde. Os projetos escolhidos são recebidos e avaliados por pares. A instituição direciona as verbas para os centros de pesquisa, contribuindo para que eles se insiram no mercado. Kurose afirmou que, desde 1995, as áreas de computação, comunicação, tecnologia da informação e infra-estrutura cibernética são responsáveis por 25% do crescimento econômico do país. “Os impactos desses avanços nos afetam até hoje, em nosso dia-a-dia, e a tendência é que isso continue crescendo”, afirmou. O diretor lembrou, no entanto, que alguns desses projetos mostraram rapidamente seus resultados, mas que muitos levaram décadas para gerar lucros.
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Ele defendeu que o principal desafio é fazer a ponte para transformar pesquisa em inovação e apresentou alguns dos projetos da NSF-CISE que trabalham para que isso aconteça. Dentre eles, o Innovation Corps (I-Corps), que usa as descobertas dos clientes em modelos de negócios para validar oportunidades de comercialização. “Os projetos de sucesso do programa são preparados para tornarem-se negócios”, explicou Kurose. Além dele, há também o Programa de Pesquisa e Inovação para Pequenos Negócios e Programa de Tranferência de Tecnologia para Pequenos Negócios (SBIR & STTR, respectivamente, na sigla em inglês), ambos voltados para o suporte de pesquisa e desenvolvimento em negócios de pequeno porte.
gault_left.jpgO professor do Instituto Maastricht de Pesquisa Econômica e Social e Inovação e Tecnologia (UNU-MERIT) Fred Gault lembrou um importante detalhe da inovação. “Uma característica da inovação é que ela deve ser implementada e um produto ou tecnologia só é implementado quando é introduzido no mercado e de fato usado”, explicou Gault.
Gault ressaltou que a fabricação de políticas de inovação é um reflexo das prioridades de um país e da sua esfera de governo. Ela leva em conta, num contexto macro, desafios de desenvolvimento econômico e social mundiais, mas é essencial que, em sua feitura, essas políticas contemplem as particularidades do contexto nacional. Além disso, aspectos como sustentabilidade, inclusão e diálogo e participação de diferentes grupos são relevantes e é preciso que haja uma regulamentação na qual eles estejam inclusos. “A ciência precisa ser vista como uma política e precisamos de um sistema no qual as pessoas entendam o que é ciência”, defendeu.
Para além do passo da produção das políticas, Gault reforçou ainda a necessidade de haver diálogo e esclarecimento no momento da implementação. “Para que essas políticas funcionem, elas precisam ser de fato implementadas e precisa haver um diálogo com a população.” Para ele, é preciso ainda ser realista e analisar o quadro após essas práticas: “Caso seja feita a análise e a política não funcione, tem que se voltar à estaca zero e fazê-la de novo.” O economista observou ainda que não se vê muita inovação sendo feita na esfera pública e que ela deveria ser estendida também para esse setor.
lastres_left.jpgA professora do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Helena Lastres concordou com Gault ao falar de contextualização. Para ela, é necessário olhar as necessidades de desenvolvimento do país ao construir políticas. “As políticas de inovação podem e devem contribuir para diminuir as desigualdades”, opinou. Lastres afirmou ainda que as potencialidades do país devem ser aproveitadas nessa feitura e alertou sobre os perigos de ignorar a história e geografia local na teoria econômica.
A economista defendeu que a produção e inovação não se limitam ao desenvolvimento econômico e que, por isso, é preciso ter cuidado com definições estreitas que não colocam em perspectiva o perfil do país, levando a uma hierarquização errada dos atores que precisam de apoio. Lastres argumentou ainda sobre a importância da avaliação. “A avaliação é exatamente o que podemos mudar e seu foco deve ser trabalhado, já que elas costumam ser pensadas para os grandes atores”, observou.
salles_filho_left.jpgA importância da avaliação de políticas foi abordada também pelo coordenador de Avaliação de Programas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Sergio Salles-Filho. Ele explicou a necessidade de se reunir um número de indicadores para fazer o acompanhamento posterior da aplicação das políticas. Mencionou, ainda, a importância de que isso seja feito de forma sistêmica, com avaliações internas e contratadas, e de forma permanente. Além disso, falou sobre a necessidade de se juntar evidências – qualitativas e quantitativas – para redesenhar as políticas: “Desde os anos 80 isso é feito no Reino Unido, esse recolhimento de evidências para saber o que essas políticas estão gerando”, contou.
Salles-Filho lembrou ainda que, para que a avaliação seja feita, é necessário ter recursos para ela, reunir visões de diferentes atores e analisar impactos de diferentes esferas, como econômica, social e ambiental.
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