O pesquisador do Centro de Pesquisas René Rachou (Fiocruz) Leo Heller apresentou o tema “Água, saúde e bem-estar: como encontrar as interseções” no evento da ABC-UFMG-Fapemig, intitulado “Água na Mineração, Agricultura e Saúde: o que a Ciência tem a dizer a partir de Minas Gerais”.

Heller procurou abordar a questão da água a partir da perspectiva do bem-estar e da felicidade dos seres humanos. Para isso, utilizou sua experiência recente como relator especial das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos à Água e ao Esgotamento Sanitário e afirmou que a pessoa humana deve ser considerada central quando se trata da água e suas diferentes aplicações. “O desprezo a esta dimensão vem provocando frequentes e graves impactos no desenvolvimento econômico e social do Brasil, como nos casos do desastre de Mariana [MG] e da colonização do Estado por indivíduos que desviam as ações que deveriam priorizar políticas públicas de água e saneamento básico em prol de outros interesses”, afirmou o palestrante.

Por meio de sua atuação como relator especial da ONU, o Prof. Leo Heller teve a oportunidade de se aprofundar no arcabouço teórico e analítico dos direitos humanos, que, muitas vezes, fica distante daquilo que é feito, por exemplo, na área de engenharia, ao se pensar a água. Essa nova abordagem possibilita um olhar diferenciado, que mostra outras faces dessa realidade: deixa-se de analisar as estatísticas referentes à média da população, abordando as camadas em situação mais vulnerável. Assim, é possível constatar que o padrão de políticas desse setor tem ignorado essa parcela da população, não apenas no Brasil, mas também em outros países – desde os muito pobres até os desenvolvidos.
Heller afirmou que, nas missões que vem realizando pelas Nações Unidas, costuma conversar com pessoas de áreas remotas para entender suas realidades e visitar prisões, para conferir o acesso de pessoas privadas de liberdade à água e a banheiros. O pesquisador destacou que, em geral, as populações urbanas têm mais acesso à água e ao saneamento básico em comparação às rurais. Da mesma maneira, moradores de favelas, grupos étnicos minoritários e mulheres são atingidos pela ausência desses serviços de forma muito mais dramática.
O conferencista relatou que o ponto de vista dos direitos humanos realça outras dimensões das políticas públicas que precisam ser consideradas para que as camadas menos privilegiadas da população sejam alcançadas: realização de processos participativos, accountability (prestação de contas, abertura a reclamações sobre prestadores de serviços), transparência e clareza de informações para todos. Os direitos humanos apontam, também, para outras formas de prestar os serviços de água e de esgotamento sanitário, olhando não apenas para a necessidade de tecnologias adequadas, que evidentemente são necessárias e indispensáveis, mas também para tecnologias acessíveis, inclusive financeiramente.
Por fim, Heller enfatizou que “colocar o bem-estar e a felicidade humana no centro das preocupações sobre a água é menos uma opção e mais um imperativo, se nós quisermos que a água cumpra o papel social que ela está destinada a cumprir”, uma vez que se trata de um elemento essencial à vida e que precisa ser visto como tal.