A ABC e a SBPC enviaram, no dia 04 de maio, carta ao presidente da República, Michel Temer, em que manifestam indignação com a decisão do Ministério do Meio Ambiente (MMA) de contratar uma empresa privada para fazer o monitoramento do desmatamento da Amazônia por sensoriamento remoto. O documento é assinado pelos presidentes da ABC, Luiz Davidovich, e da SPBC, Helena Nader. A denúncia foi feita pelo repórter do Estadão, Herton Escobar, em matéria publicada no dia 03 de maio. Confira a íntegra da carta:

“Senhor Presidente,

Voltamos à presença de Vossa Excelência para informar que causou surpresa e indignação nas comunidades científicas brasileira e internacional a decisão do Ministério do Meio Ambiente (MMA) de contratar empresa privada para fazer o monitoramento do desmatamento da região Amazônia por sensoriamento remoto.

As razões dessa surpresa e indignação são várias e justificadas:

1. O monitoramento do desmatamento da Amazônia é realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) desde 1989, com tecnologia, competência e propriedade reconhecidas internacionalmente. Nesses 28 anos, a atuação do INPE na Amazônia vem sendo objeto de sucessivas melhorias e aperfeiçoamentos, tanto em termos tecnológicos como metodológicos, ao ponto de o Brasil ostentar liderança mundial em termos de monitoramento de desmatamento. Por exemplo, dados fornecidos pelo INPE possibilitaram ao governo brasileiro, em especial ao MMA, implementar ações que resultaram na redução do desmatamento na Amazônia em 72% entre 2004 e 2016. Portanto, é notório que o País já dispõe de um eficiente sistema de monitoramento do desmatamento, o que dispensa a necessidade de outros atores neste cenário.

2. Ao ser uma atividade realizada com independência por uma instituição de pesquisa, o monitoramento feito pelo INPE oferece, além de confiabilidade, transparência e isenção. O fato de o Ministério do Meio Ambiente vir a poder avaliar os resultados do trabalho que é sua atividade-fim configurará explícito conflito de interesses, portanto uma prática desaconselhável em nome da boa gestão pública.

3. O MMA teria justificado que o contrato que pretende estabelecer com empresa privada visa acrescentar tecnologias não disponíveis no INPE, como imagens de radar. Contudo, em primeiro lugar, o INPE não foi consultado pelo MMA sobre a possibilidade de incluir outros recursos tecnológicos em seus programas de monitoramento da Amazônia. Em segundo lugar, o INPE conta, sim, com conhecimentos sobre o uso de radar, inclusive para formação de especialistas nesse tipo de equipamento.

4. O Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações também não foi consultado pelo MMA sobre as possibilidades de se ampliar ou aperfeiçoar o monitoramento da Amazônia, ou sobre as eventuais conveniências e vantagens ao País de se contratar uma empresa para essa finalidade. Essa postura unilateral do MMA cria uma fissura em sua histórica e harmônica convivência com o Ministério da
Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.

5. Causou estranheza – inclusive na mídia internacional – o curtíssimo prazo, estabelecido pelo MMA, entre a publicação do edital (20/04/2017) e a entrega das propostas (04/05/2017), considerando-se, inclusive, a existência de dois feriados nesse período. Uma vez que o Pregão Eletrônico estava marcado para ocorrer às 10h de 04/05, o tempo efetivo para elaboração das propostas foi de apenas sete dias úteis, para um edital com 161 páginas.

6. O edital prevê em R$ 78,5 milhões os gastos com o contrato. Considerando-se que esse valor corresponde a 18% do orçamento do MMA para este ano, trata-se de uma cifra considerável em tempos que o governo federal tenta dar mostras de austeridade em seus gastos. Diante do exposto, recorremos a Vossa Excelência com a expectativa de que o Ministério do Meio Ambiente não dê prosseguimento ao Pregão Eletrônico nº 07/2017. Será uma afronta ao País e à Ciência e Tecnologia nacional.

Diante do exposto, recorremos a Vossa Excelência com a expectativa de que o Ministério do Meio Ambiente não dê prosseguimento ao Pregão Eletrônico nº 07/2017. Será uma afronta ao País e à Ciência e Tecnologia nacional.

Com nossos protestos de estima e consideração,
Atenciosamente,

HELENA B. NADER
Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência

LUIZ DAVIDOVICH
Presidente da Academia Brasileira de Ciências”