Em artigo publicado no Jornal da Ciência, no dia 25 de abril, a farmacêutica Vanderlan da Silva Bolzani, membro titular da ABC e vice-presidente da SBPC, faz uma reflexão sobre os 66 anos de fundação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e o atual momento de tensão pelo qual a ciência passa. Concebido e fundado pelo Almirante Álvaro Alberto, o CNPq nasceu como “Conselho Nacional de Pesquisa”, criado por meio da Lei nº 1.310 de 15 de Janeiro de 1951, chamada pelo Almirante de “Lei Áurea da pesquisa no Brasil”.

Segundo dados do órgão, nos últimos 10 anos, 316.885 estudantes foram contemplados com bolsas no país e no exterior. Sendo 45,9 mil bolsistas no exterior e 270,9 mil no país. Ao todo, 5.178 instituições foram contempladas. Atualmente, cerca de 90 mil pesquisadores são apoiados pelo CNPq, sendo cerca de 15 mil com o mais alto nível de apoio, as bolsas de Produtividade em Pesquisa e de Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora, destinadas a pesquisadores de grande produtividade. Confira abaixo a íntegra do artigo da Acadêmica da ABC.

Como vamos comemorar o aniversário do CNPq?

O fato de o aniversário de 66 anos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) ser comemorado em um momento de grande tensão para os cientistas e educadores brasileiros abre inúmeras questões para essa comunidade. Uma delas é saber qual a sua capacidade de se articular e interferir no cenário maior das decisões políticas, de forma isolada ou em conjunto com outros grupos da sociedade. Talvez estejamos apenas no começo do debate e de um movimento que teve como marco especial a Marcha pela Ciência, realizada em âmbito mundial, no último dia 22 de abril.

Uma contribuição para a discussão é lembrar que a criação do CNPq foi uma decisão política, de um país pobre, diante de escolhas difíceis no recém-desenhado mundo da Guerra Fria e da energia nuclear. A lei n. 1310 de 15 de janeiro de 1951, que criou o CNPq, assinada pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra, no final de seu mandato, tinha como base “a ideia de capacitação de pessoal técnico-científico”, como mostra o historiador Shozo Motoyama, em seu livro “Prelúdio para uma história – Ciência e tecnologia no Brasil” (Edusp/Fapesp, 2004). Diz ele, resumindo a justificativa da lei: “Nenhum projeto científico ou tecnológico de envergadura, incluindo o da energia nuclear, teria êxito se não contasse com um número suficiente de cientistas, tecnólogos e pesquisadores. Nos países subdesenvolvidos, a prioridade máxima está na formação de recursos humanos – eis a variável essencial da política científica e tecnológica dessas nações.”

Durante esses 66 anos de existência do CNPq, a proposição que associa formação científica e desenvolvimento continuou em tela, com avanços e retrocessos. A chamada “década perdida”, dos anos 1980, viu minguarem os recursos para CT&I atrelados aos baixos resultados do desempenho econômico e da recessão, sem, contudo, interromper a continuidade de um processo em andamento. E um dos fatores básicos que assegurou essa continuidade foi a existência do CNPq e de sua estrutura presente em todo o País, apta a desempenhar seu papel e ser protagonista do desenvolvimento científico e tecnológico de um Brasil ainda em construção.

Neste momento, diante da complexidade do mundo global, do surgimento dos BRICS, em especial da China como uma nova potência, o que vemos aqui é a falta de uma política de estado que aproveite o esforço já feito e que leve o Brasil a ocupar um lugar de liderança nessa nova realidade. O sistema de ciência e tecnologia brasileiro foi estruturado e organizado com a criação de várias instituições protagonistas, a partir da década de 1950, com destaque para o CNPq, que hoje completa 66 anos, fato que temos muitas razões para celebrar.

A data, neste momento, sugere o debate e a reflexão sobre o que somos agora obrigados a enfrentar, de forma inevitável, com cortes de recursos que nos remetem aos idos de 2003, pondo em risco projetos e programas de excelência e amplitude nacional, cuja descontinuidade impactarão sobremaneira a nossa ciência e tecnologia.

Que esta mensagem de felicitação ao CNPq nos leve ao resgate dessa história, pois ela pode ser a base para uma outra etapa, a de superação das dificuldades, que se apresentam em ciclos, na vida da sociedade brasileira.