Sem recursos no volume adequado, o muito que já se fez será perdido. É preciso combinar boa gestão e muito dinheiro, como mostra artigo da Acadêmica Helena Nader, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), e Pedro Wongtschowski, presidente do Conselho Superior da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (ANPEI).
“Se a produtividade da América Latina tivesse crescido, a contar de 1960, nos mesmos índices do resto do mundo, o PIB da região seria 47% maior do que o atual. Se tivesse acompanhado os países desenvolvidos, seria 62% maior; e os da Ásia Oriental, três vezes maior. Esses dados estão no estudo “La era de la productividad: como transformar las economias desde sus cimientos”, lançado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento em 2010. A comparação serviria também para o Brasil.
A questão aqui não é lamentar nem propugnar que tenhamos um PIB maior – o que, obviamente, todos queremos – mas sim como chamar a atenção para a importância da produtividade nos tempos atuais em que a economia é globalizada e os ativos intangíveis, não raro, valem mais do que os tangíveis. Crescer com qualidade é um grande desafio para o Brasil, e colocá-lo nesta rota talvez seja o maior desafio do segundo mandato da presidente Dilma. Elevar a produtividade da economia brasileira por meio de investimentos expressivos e regulares para melhorar a qualidade de nossa educação e para promover a Pesquisa, o Desenvolvimento e a Inovação (P, D&I), colocando-os como motor do desenvolvimento, é condição necessária para o crescimento sustentável.
A solução de outros gargalos, como melhoria da infraestrutura, enxugamento do “custo Brasil” e redução da burocracia, obviamente é igualmente necessária. O processo de inclusão social deverá continuar; há, portanto, que se considerar que os demais pré-requisitos para o desenvolvimento sustentado são cidadãos instruídos, produção científica e tecnológica extensa e qualificada, e produtividade elevada. Estão aí as verdadeiras fontes e expressões de riqueza de um país na economia globalizada.
Chegar a essa conclusão não é difícil. Basta colocar lado a lado rankings globais, indicadores de desenvolvimento, que aparecem sempre os mesmos países ocupando as primeiras posições. No Índice Global de Competitividade, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial (WEF), se destacam Alemanha, Estados Unidos, Cingapura, Finlândia, Holanda, Japão, Reino Unido, Suíça e Suécia. Praticamente são esses países que ocupam as primeiras posições também no ranking da SCImago, plataforma web que mede a quantidade e a qualidade da produção científica dos países, e no Programa para Avaliação Internacional de Alunos (Pisa, na sigla em inglês), da OCDE.
Nesses rankings, o Brasil aparece em uma posição relativamente boa no SCImago: ocupa a 15ª posição tanto no número de artigos científicos publicados como no impacto que esses artigos provocam na ciência mundial. Muito pouco desta ciência, no entanto, chega hoje ao setor industrial brasileiro. Mas, mesmo se a ciência brasileira está despontando entre as melhores do mundo, o Pisa mostra o quanto nossa educação é sofrível: o Brasil ocupa a 58ª posição, entre 65 países. No ranking do WEF, quesito “qualidade da educação”, o Brasil aparece no 108º lugar entre 144 países.
Nossas colocações em rankings de inovação também deixam muito a desejar: 61ª no ranking da Organização Mundial de Propriedade Intelectual, e 62ª no do WEF.
No que se refere à produtividade, a economia brasileira encontra-se praticamente estagnada desde a década de 1980, enquanto nos países asiáticos cresceu duas vezes nesse período. Com relação à América Latina, segundo dados da Conference Board, a produtividade brasileira ocupa a 15ª colocação; no ranking global, é a 79ª entre 122 países – números que são compatíveis com a posição do Brasil (62ª) no Índice de Competitividade Global do WEF.
Esses números guardam correspondência com o potencial do Brasil? Não. Nosso desafio, portanto, é dar ao país o tamanho de seu potencial, transformar potencialidade em realidade.
P, D&I são instrumentos indispensáveis para se promover aumento de produtividade, quer seja por meio do aprimoramento do processo de produção ou melhoria funcional de bens ou serviços já existentes, quer seja com a introdução no mercado de novos processos produtivos ou de novos bens e serviços. Estudos mostram que, como estão mais distantes da fronteira tecnológica, os países em desenvolvimento têm maior retorno dos investimentos em P, D&I (cerca de sete vezes mais do que os investimentos em capital fixo) na comparação com os países desenvolvidos (100% no G-7). Ou seja, para o Brasil, investir em P, D&I proporciona uma grande margem de retorno. Paradoxalmente, nosso país tem um investimento ainda muito reduzido em P, D&I – cerca de 1,2% do PIB, enquanto Dinamarca, Coreia, Suécia e Finlândia já ultrapassaram os 3%, e Israel passou de 4%. A média dos países da OCDE está perto de 2,4%.
Daí decorre que o Brasil precisa aumentar seus investimentos – público e privado – em P, D&I. Enquanto a academia é a principal produtora de ciência, a indústria é o principal motor da inovação e a sociedade, a principal beneficiária. Enquanto não se faz boa tecnologia sem ótima ciência, não há inovação sem ciência e sem tecnologia.
No mesmo passo acelerado, o Brasil precisa também qualificar sua educação. Outro estudo do BID, lançado neste ano (“Cómo repensar el desarrollo productivo?”), mostra que apenas oferecer educação não basta para haver aumento da produtividade do trabalho. De 1970 a 2012, a média de anos de estudo dos brasileiros com 15 anos de idade ou mais subiu de 2,8 anos para 7,5 anos – aumento de 267%. No mesmo período, a produtividade da força de trabalho no país, por trabalhador, passou de US$ 12.200 para US$ 20.000, crescimento de 64%. O problema, portanto, reside não mais na oferta de ensino, mas sim na sua qualidade.
O que se fez nos últimos anos em educação e ciência e tecnologia tem muito valor. Mas sem recursos no volume adequado, o muito que já se fez será perdido; P, D&I não pode prescindir de uma combinação de boa gestão e muitos recursos financeiros. Necessita-se, portanto, de uma mudança de escala, compatível com o tamanho da economia brasileira e com as aspirações de crescimento e de desenvolvimento que temos, os brasileiros todos.”
Helena Nader é presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).
Pedro Wongtschowski é presidente do Conselho Superior da ANPEI – Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras.