O tema da pesquisa e inovação em produtos naturais da floresta levou um grande número de estudantes ao anfiteatro da Universidade Federal do Acre (Ufac) para assistir à apresentação da Acadêmica Vanderlan Bolzani, na 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Coordenadora do Núcleo de Bioensaios, Biosíntese e Ecobiologia de Produtos Naturais (Nubbe) e professora de química da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Araraquara, Bolzani se disse feliz com a plateia cheia e jovem e afirmou que o assunto é importante em uma região tão rica como a Amazônia.

A plateia lotada de jovens pouco antes do início da apresentação

No entanto, o país não aproveita todo o seu potencial e, apesar da diversidade brasileira, é nos países europeus que ocorre um grande desenvolvimento de produtos naturais, utilizando, muitas vezes, derivados do Brasil. “Vemos muitos made in Paris, mas poderia haver made in Acre, made in Amazônia”, destacou a Acadêmica.
Segundo Bolzani, para termos uma Amazônia sem fronteiras, falta planejamento estratégico, pessoas altamente capacitadas, política institucional e cultura organizacional. “Assim, teremos um ciclo capaz de viabilizar uma economia sustentável.” Ela lembrou que a região corresponde a mais de 50% do território brasileiro e detém o maior número de espécies do mundo. “Para valorizar a biodiversidade, é preciso investigação científica multi e transdisciplinar, de modo a extrair dessa riqueza conhecimento novo e produtos para alavancar a economia”, afirmou a Acadêmica.
Bolzani deu alguns exemplos de produtos naturais brasileiros que tiveram grande importância. Um deles é o curare, um composto orgânico que é um inibidor e controla a musculatura. Foi introduzido na prática anestésica por Griffith e Johnson em 1942, possibilitando a produção de fármacos que revolucionaram a eficácia da anestesiologia.
Já nos anos 60, o farmacologista e Acadêmico Sergio Henrique Ferreira pesquisou sobre macromoléculas de venenos de serpentes. Desse trabalho derivou um produto usado no mundo inteiro para tratar hipertensão, o captopril.
Para Bolzani, o Brasil é um país competitivo e inovador, com potencial para explorar melhor sua biodiversidade em prol dos avanços. “Quanto maior o nosso desenvolvimento tecnológico, maior será a facilidade com que poderemos organizar a sociedade.” Ela citou o fato de 45% das atividades do país serem baseadas no agronegócio e questionou o montante de riqueza que o setor, de fato, propicia.
O país precisa de produtos de alto valor agregado
A cientista enfatizou que a bioeconomia do açaí é extremamente importante por gerar emprego, mas é de baixo valor agregado. Bolzani explicou que, no Brasil, utilizamos o açaí para produzir alimentícios como sorvete, torta, geleia e bombom. A polpa é aproveitada, mas o caroço é jogado fora, vai se acumulando e gera lixo industrial. “Vocês não sabem o valor agregado que está por trás desse lixo simplesmente porque não é estudado; o potencial é enorme. Ele pode ser benéfico não apenas industrial e comercialmente, mas também trazer conhecimento novo.”
Ela deu um exemplo prático. Informou que usa um produto que contém ingredientes bioativos que, combinados, atuam na microcirculação e protegem as células contra os radicais livres, custando R$ 129. A caixa vem com 30 comprimidos e Bolzani toma dois por dia, ou seja, tem um gasto grande. Segundo a química, este produto foi descoberto na LOréal e é uma combinação de licopeno, mas o princípio ativo patenteado são os fenóis, muito comuns em nossas plantas do Brasil. E o próprio açaí tem uma composição química muito parecida com a do produto usado pela LOréal. “Ou seja, nós poderíamos fazer. Se, em vez de sorvete, tivéssemos um açaí fitocêutico, teríamos um valor agregado muito maior. Aí está a importância do conhecimento para fazer inovação.”
Atualmente, a LOccitane, empresa de cosméticos de luxo, abriu a linha LOccitane au Brésil. Seus produtos utilizam jenipapo, mandacaru e vitória-régia. “A indústria é francesa, mas elas estão em Jundiaí, no Estado de São Paulo.”
Nos Estados da Amazônia Legal, a maioria dos grupos de pesquisa trabalha com plantas medicinais, mas ainda estudando extratos, sem muito avanço na composição química. “É uma pesquisa muito básica, concentrada nas universidades públicas. Há poucas companhias investindo”, lamentou Bolzani. “Há uma quantidade enorme de dados armazenados sobre a biodiversidade da Amazônia, mas temos gotas de desenvolvimento sustentável.”