Ensino básico, formação de professores e a expansão da inclusão social foram alguns dos temas abordados pelo ministro da Educação, José Henrique Paim, durante palestra na 66ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Antes de discursar, Paim recebeu os agradecimentos da presidente da SBPC e Acadêmica, Helena Nader: “Com os cortes no Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o MEC [Ministério da Educação] é quem tem nos mantido vivos”.
José Henrique Paim e Helena Nader
Por sua vez, o ministro elogiou o papel da entidade. “As universidades estão se reinventando a partir da SBPC, como no caso da Ufac [Universidade Federal do Acre].” Em seguida, lamentou que o Brasil tenha tido um despertar tardio na educação. Nas décadas de 60 e 70, a média de estudos era de 2,6 anos e, mesmo após a industrialização e um forte crescimento econômico, isso não se refletiu nessa área. “Em 2012, a média de estudo já era de 7,6 anos, mas ainda temos que avançar”, afirmou. “Estamos pagando um preço alto por não apostar nisso e entender que a educação é muito importante para o desenvolvimento de uma nação.”
Mudança de mentalidade
Paim ressaltou, no entanto, a mudança de mentalidade da população. Hoje, jovens mais pobres enxergam que a educação é o caminho para que se possa ter um avanço social. Uma mostra disso é o crescimento das inscrições no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). “Vimos esse processo ocorrer em alguns países no século 19 e início do 20, onde as pessoas tiveram essa perspectiva. Até pouco tempo, no Brasil, as famílias tinham a preocupação de arranjar um bom emprego para o filho. Hoje, querem que ele estude.”
O ministro falou sobre dois pontos importantes nessa temática. O primeiro deles é a necessidade de aproximação da ciência com a educação básica. Para ele, as crianças precisam ter, desde o início de suas atividades, o despertar para o lado científico.
Outra questão é fazer com que a produção científica reflita, do ponto de vista da tecnologia e inovação, nos resultados econômicos, de modo a tornar o país mais competitivo, com ampliação da renda e agregando valor ao seu produto. “O Brasil vai ter que fazer um grande esforço para recuperar o tempo perdido e se equiparar a outros países de produção científica muito elevada”, alertou. “Mas tudo começa na educação básica.”
Entre as conquistas, um sistema de avaliação eficaz
Ainda assim, o país já obteve importantes avanços em questões fundamentais. Temos, por exemplo, um sistema consolidado de estatística e avaliação da educação. “Construímos uma estrutura com condições de medir a situação de cada escola, municipal ou estadual, e isso permite que a gente desenvolva políticas cada vez mais efetivas.”
Anualmente, o Brasil atualiza o cadastro de todos os estudantes, o que permite o acompanhamento de cada um. São mais de 50 milhões de registros na educação básica. “Vemos se o aluno foi aprovado, se teve evasão. Poucos países têm um sistema nesse nível.” Há, também, a Prova Brasil, que mede a proficiência em português e matemática dos estudantes. “Juntando essas estatísticas com o censo da educação superior, temos indicadores que nos permitem planejar, reavaliar e estabelecer metas por escolas e sistemas.”
Paim, que atua há mais de dez anos no MEC, também comemorou o financiamento e a gestão na área, afirmando que se construiu um padrão para a educação básica. “Criamos o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), possibilitando que Estados como o Maranhão, cujo custo do aluno era equivalente a 30% do custo no Paraná, hoje tenha esse índice igual a 80%”, enfatizou.
O ministro destacou que nosso sistema educacional é descentralizado e, hoje, os Estados e Municípios têm autonomia, com sistema e redes de ensino próprios. Coordenar esse processo para se chegar a um resultado de qualidade, no entanto, é muito complexo, de acordo com Paim. “Definimos um padrão de relacionamento com Estados e Municípios e, atualmente, temos um diagnóstico deles. Fizemos com que apresentassem um plano de educação para que o MEC concedesse apoio.”
A emergência da educação em tempo integral
Mesmo assim, os desafios são enormes. “No Acre, foi feito um grande investimento na rede [pública de educação], mas em outros Estados a situação é muito crítica.” Paim ressaltou a necessidade de se ampliar a jornada nas escolas, atualmente de quatro horas diárias. “Precisamos de educação em tempo integral e sem investimento em infraestrutura não vamos conseguir.”
No último ano, o número de matrículas em tempo integral no ensino fundamental praticamente dobrou, chegando a 12% dos estudantes em 2013. Mas a meta do Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado recentemente pela presidente Dilma Rousseff, é chegar a 25% dos alunos da educação básica em dez anos.
Já a formação de professores é um dos maiores desafios da educação. Para Paim, o fato de a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) ter assumido a responsabilidade da instrução dos educadores no ensino básico já foi um importante avanço, mas é preciso mais. “A lacuna na formação de professores tem que ser enfrentada na raiz”, apontou. Assim, é necessário analisar o que precisa ser alterado no sistema de ensino e, para isso, o currículo deve ser discutido – não apenas na educação básica, mas também nas universidades.
Problemas no ensino médio
Paim afirmou que o ensino médio brasileiro precisa ser revisto. Segundo ele, até pouco tempo atrás, não havia condições mínimas para o seu funcionamento: “Faltavam financiamento adequado, livros didáticos, alimentação, mas conseguimos melhorar nesse ponto”. Agora, é preciso repensar não apenas o currículo, mas também a defasagem de idade dos estudantes que entram nessa fase.
Outro ponto é dar opção para que o estudante possa se profissionalizar se quiser seguir esse caminho. “Saímos de uma oferta de 3% de ensino médio com educação profissional para 8%, mas, em países como a Alemanha, 55% dos estudantes vão direto do ensino médio para a profissionalização.” Hoje, iniciativas como o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) já atuam nessa direção, possibilitando, inclusive, que pessoas que abandonaram o estudo possam retornar.
O papel do ensino superior
O ministro destacou que o ensino superior e a pós-graduação têm um papel-chave no desenvolvimento do país e uma conexão direta com a educação básica. Por isso, é importante manter o processo de expansão das universidades, p
úblicas e privadas, aumentando ainda mais o número de matrículas. “Agora, precisamos pensar em um novo modelo.”
Ele deu o exemplo da Ufac, que cresceu bastante ao longo de seus 50 anos, mas, ainda assim, teve o primeiro doutorado aprovado pela Capes apenas no ano passado. “Temos que criar um projeto para as universidades do Norte que as conectem com o seu vetor de desenvolvimento, que é a Amazônia.”
Paim lembrou da bem-sucedida inclusão social nas universidades, realizada nos últimos anos, com políticas voltadas para pessoas de baixa renda, como o Programa Universidade para Todos (Prouni) e o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). “Hoje, mais de 50% dos estudantes estão no sistema porque existe esse apoio. Nos próximos anos, vamos ter que chegar a 33% de presença líquida para a população entre 18 e 24 anos, o que vai significar 14 milhões de matrículas a mais, então teremos que ter ainda mais pessoas com poucos recursos no ensino superior.”
A internacionalização da educação brasileira
Outro ponto considerado importante pelo ministro foi o da internacionalização. Segundo Paim, o programa Ciência sem Fronteiras foi um passo importante, mas ele afirmou ser preciso estruturar a volta desses estudantes e construir uma cooperação de fato entre as universidades do Brasil e do exterior. “Estamos vendo quais instituições têm condições para esse processo, sem deixar de apoiar aquelas mais novas, que ainda estão se consolidando.” A internacionalização foi tema da palestra do presidente da Capes, Jorge Guimarães, na Reunião da SBPC.

O ministro enfatizou que deve haver um “casamento” da ciência nas universidades com o mundo produtivo. “Países como os Estados Unidos fizeram um grande investimento nesse aspecto, criaram universidades em vários Estados; a construção de ferrovias estava associada a um projeto educacional. Lá, as empresas se voltam para pesquisa e desenvolvimento (P&D) tendo ganhos tecnológicos importantes.” Paim defendeu, portanto, que é importante avançar na pesquisa científica e, ao mesmo tempo, renovar o espírito das empresas para que trabalhem na inovação. Esse tema foi discutido na apresentação do diretor de Cooperação Institucional do CNPq, Paulo Beirão. Clique aqui para ler a matéria.