“Lugar de mulher é em todo lugar”, defendeu a física Márcia Barbosa, uma das cinco pesquisadoras laureadas este ano pelo programa internacional L’Oréal-Unesco For Women In Science. Professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), ela recebeu uma bolsa equivalente a cem mil dólares para dar continuidade a suas pesquisas e, no último dia 23 de outubro, esteve presente em noite de homenagem às sete vencedoras da versão nacional do prêmio.

No Brasil, a parceria se estende à ABC e esta foi a oitava edição de um concurso que já destinou, desde 2006, US$2 milhões a 54 cientistas brasileiras das mais diversas áreas do conhecimento. As premiadas de 2013 foram Adriane Ribeiro Rosa (UFRGS), Clarissa Martinelli Comim (Unisul), Fernanda Regina Vitorino (UFMT), Taís Gratieri (UnB), Raquel Giulian (UFRGS), Florencia Graciela Leonardi (USP) e Joyce Kelly da Silva (UFPA).

Fernanda Vitorino, Clarissa Comim, Taís Gratieri, Adriane Rosa,
Joyce da Silva, Florencia Leonardi e Raquel Giulian
Mesmo que projetos de incentivo à presença da mulher em diferentes âmbitos profissionais sejam cada vez mais frequentes, estatísticas revelam que ainda há, no universo científico, uma grande disparidade entre os gêneros. Segundo estudos realizados em 2012 pela Comissão Europeia, menos de 30% dos físicos, engenheiros e cientistas de computação da União Europeia, Estados Unidos, Brasil, África do Sul, Índia, Coreia e Indonésia são mulheres. Além disso, nesses países, apenas 12% dos cargos científicos de tomada de decisão nas universidades e no setor privado são ocupados por elas.
Associando esses números à importância da mulher no desenvolvimento de uma ciência de qualidade, a iniciativa da L’Oréal é também um estímulo a meninas cujos interesses passem pelo campo da pesquisa. Como? “Através de exemplos, de modelos inspiradores e de toda uma consciência coletiva voltada ao desenvolvimento e à inovação”, afirmou a mestre de cerimônia Flávia Fernandes. Didier Tisserand, presidente da L’Oréal Brasil, foi ainda mais enfático: “Se o mundo precisa de ciência, a ciência precisa de mulheres.”
Marlova Noleto, representante da Unesco, enfatizou sua alegria em ver o quão jovens eram as premiadas. “A ciência necessita da força e da delicadeza que só as mulheres sabem combinar.”
O Acadêmico Cid Bartolomeu de Araújo, por sua vez, falou em nome de Jacob Palis, presidente da ABC, e fez votos de que todas as homenageadas fossem bem sucedidas na instalação de seus laboratórios e encaminhamento das pesquisas iniciadas. “Eu tenho observado, a cada ano, uma melhoria crescente na qualidade dos trabalhos apresentados não só na minha área, a física, mas em todos os outros campos do conhecimento abarcados pelo prêmio”, pontuou o membro da Comissão Julgadora.
Neste ano, Raquel Giulian foi a única cientista laureada na área de ciências físicas. De acordo com a pesquisadora da UFRGS, cujo trabalho é estudar materiais porosos que possam ser utilizados como detectores de gases, já está provado que as mulheres são tão capazes quanto os homens. Nesse sentido, ela vê na premiação uma forma de inspirar suas alunas. “Eu espero conseguir transmitir a essa nova geração que física também é um campo para mulheres”, afirma. Para Raquel, os jovens que estão trabalhando nesse projeto também se sentem motivados com o reconhecimento.
Casada com um físico do mesmo instituto em que trabalha, Raquel concilia
a profissão com a maternidade. Seu filho, Heitor, tem um ano e dez meses

Já no campo das ciências matemáticas, o projeto escolhido foi o da argentina, nascida na cidade de Pehuajó. Florencia Graciela Leonardi veio ao Brasil cursar doutorado na Universidade de São Paulo (USP) e não voltou mais.

Filiada a um grupo de pesquisadores que busca compreender o funcionamento do cérebro, sua pesquisa se chama “Inferência estatística para grafos aleatórios e redes probabilísticas”.

Emocionada pela homenagem, ela afirma: “Ninguém nunca vai conseguir aprender tudo o que existe. A grande questão é nunca desistir.”

Pesquisadora da Universidade Federal do Pará (UFPA) e premiada na área de ciências químicas, Joyce Kelly da Silva também acredita no poder da persistência.

Apaixonada por ciência desde a infância, ela conta que a vocação se intensificou no ensino médio, quando entrou em contato com a química orgânica. Atualmente, Joyce estuda as atividades da tirosinase de óleos essenciais da Amazônia oriental com potencial aplicação dermocosmética.

Em sua opinião, o prêmio aumentou a visibilidade da iniciativa privada em suas pesquisas. “Os laboratórios da LOréal certamente vão querer conversar com você”, brincou a mestre de cerimônias.

Todas as demais laureadas eram da área de ciências biomédicas, biológicas e da saúde. Também da UFRGS,

Adriane Ribeiro Rosa desenvolve métodos de avaliação do grau de funcionalidade de pacientes com transtorno bipolar – patologia que, segundo dados da Organização Mundial da Saúde, ocupa o sexto lugar na classificação de doenças mais incapacitantes.

Feliz por sair vitoriosa em um programa tão concorrido, ela conta: “Esse prêmio é o reconhecimento a um trabalho iniciado em 2004.”

Clarissa Martinelli Comim, por sua vez, investiga a sepse como fator de risco para o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos em modelos animais.Professora da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), ela destaca a seriedade da doença. “A sepse se desenvolve com rapidez principalmente em recém-nascidos, devido à fragilidade de seus sistemas imunes, podendo deixar inúmeras sequelas”.

Representando as sete premiadas em discurso breve e emocionado, ela agradeceu: “Um dos maiores retornos para um pesquisador é receber uma premiação desse porte.”

A Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT) também teve sua representante. “A possibilidade de comprovar hipóteses me motiva a continuar no campo científico”, afirma Fernanda Regina Vitorino.
Sua linha de pesquisas, intitulada “Interleucina-10 como um potencial modulador da função vascular e da pressão arterial em animais hipertensos”, lhe rendeu uma oportunidade considerada, em sua visão, inestimável: “O prêmio vai projetar a ciência praticada no interior do Mato Grosso para o mundo todo.”
Fechando o quadro de premiadas estava Taís Gratieri, docente da Universidade de Brasília (UnB). Influenciada desde cedo por pais professores a seguir a área acadêmica, ela conta que se sente feliz por também poder estimular suas alunas a optarem pela ciência.O projeto submetido por Taís, “Desenvolvimento de nanossistemas mucoadesivos para o tratamento de infecções oculares e avaliação da iontoforese na potencialização terapêutica”, visa à utilização da nanotecnologia para o desenvolvimento de colírios mais eficazes.

Algumas ex-premiadas pela versão brasileira do For Women in Science também estavam presentes. Laureada no ano passado, Paula Murgel Veloso contou que, à época de sua premiação, ela lecionava há pouco tempo na Universidade Federal Fluminense (UFF). “Com respaldo para a minha pesquisa, eu pude equipar meu ambiente de trabalho, fazer muitas viagens para participar de congressos e interagir com outros pesquisadores. Foi um grande estímulo”, detalha.

Membro afiliado da ABC, Yraima Cordeiro viveu uma situação parecida. Quando recebeu o prêmio, em 2006, ela havia saído do Instituto de Bioquímica Médica da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde cursou mestrado e doutorado, e passado em um concurso para professora da Faculdade de Farmácia da mesma instituição. “Lá, ninguém me conhecia. O prêmio me deu muita visibilidade.”

Também afiliada da ABC, a matemática Carolina Bhering de Araujo recebeu sua premiação, no ano de 2008, ainda em uma etapa bastante inicial de sua trajetória. “O prêmio me fez acreditar em mim mesma e contribuiu para a solidificação da minha carreira”, finalizou