Localizado próximo ao Centro do Rio de Janeiro, o Casarão Ameno Resedá é uma casa de shows conhecida por sediar diferentes manifestações culturais brasileiras: mostras de dança, feijoadas com direito a muito samba e peças de teatro. Mas e quando no palco estão jovens cientistas expondo suas linhas de pesquisa? Parece chato? Não foi essa a opinião do público que compareceu ao Euraxess Science Slam 2013 no último dia 24. “Teve de tudo um pouco, de desenho animado à capoeira, de performances teatralizadas à música e dança. E tudo em inglês!”, avalia o jornalista científico Sérgio Brandão, apresentador do evento.
Promovida pelo Euraxess Links Brazil, projeto cuja proposta é estreitar os laços entre pesquisadores brasileiros e europeus, a primeira edição do evento premiou a melhor performance com uma viagem para Bruxelas, na Bélgica, onde será realizada a conferência Euraxess – “Dando voz aos pesquisadores – opiniões sobre empregos, carreiras e direitos”. Lá entrarão na competição os vencedores dos science slams da América do Norte, China, Índia, Japão e Cingapura. Dentre os muitos aspectos inovadores da proposta estava a própria forma de avaliação das apresentações: cada um dos sete jovens foi julgado não só pelo júri previamente escolhido, mas também pela plateia. Organizadora do evento, Charlotte Grawitz ressalta que os votos do público foram feitos por mesa, sendo necessário um consenso entre os presentes. “Isso favoreceu o diálogo e funcionou como uma ótima oportunidade de networking“, avalia.
A vencedora foi Milene Möller. Doutoranda em genética e melhoramento de plantas pela Universidade de São Paulo (USP), ela fez perguntas à plateia e, para que o debate fosse mais descontraído, propôs um sistema de recompensas: quem respondesse às questões ganhava um chocolate. A partir dessa dinâmica, tratou de sua especialidade – a eliminação do uso de inseticidas contra percevejos na cultura da soja – explicando aos presentes a importância desse mercado para a sociedade. Milene graduou-se em ciências biológicas pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e obteve seu título de mestrado também pela USP. “Foi a primeira vez que participei de um evento descontraído como o Euraxess. Achei a iniciativa muito interessante e criativa”, opina a premiada.
Em segundo lugar ficou Aline Machado Rapello do Nascimento, cuja premiação foi um vale livros no valor de R$500. Graduada em medicina veterinária pela União Pioneira de Integração Social, em Brasília, ela obteve seu título de mestrado pela Universidade Federal de Goiás e atualmente cursa doutorado em medicina tropical na Universidade de Brasília (UnB). Sua apresentação se baseou nas dificuldades enfrentadas por um pesquisador das áreas veterinária e de medicina tropical. Fazendo uma demonstração de capoeira ao final de sua fala, Aline procurou afirmar que, tendo ginga, é possível enfrentar as adversidades do universo científico.
Marcela Uliano da Silva foi a terceira colocada. A projeção de um vídeo sobre sua linha de pesquisas, o sequenciamento do genoma do mexilhão dourado, lhe rendeu um vale livros de R$400. Para seguir a proposta do Euraxess Science Slam 2013, a doutoranda do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro também narrou em inglês o conteúdo da animação. Muito interessada, além da sua área de especialização, em filosofia da ciência, literatura e divulgação científica, Marcela possui um blog que trata de assuntos afeitos a disseminação da ciência à sociedade.
Aline do Nascimento, Milene Möller, Gabriel Andreuccetti, Vanja Dakic,
Marcela Uliano, Luiz Marcelo Santos e Silvia Maciel (Foto: Euraxess Links Brasil)
Logo em seguida ficou classificado Luiz Marcelo Vídero Vieira Santos, premiado com um vale livros de R$300. Em inglês, ele cantou uma música de sua autoria explicando os efeitos do Programa Bolsa Família na cidade de Guaribas, no sertão do Piauí. No melhor estilo karaokê, a canção – que tinha a mesma melodia de Eduardo e Mônica, da Legião Urbana – foi cantada ao mesmo tempo em que fotos e trechos de sua letra eram exibidos no telão. Empatados na quinta posição – e recebendo R$200 de vale livros cada um – ficaram Silvia Fernanda de Medeiros Maciel, Gabriel Andreuccetti e Vanja Dakic.
Silvia criou um ambiente aconchegante e, como se fosse uma contadora de histórias, falou sobre crianças que, a seu pedido, fotografaram suas rotinas para seu projeto de pesquisa de doutorado em psicologia cognitiva. Essa atividade, que para os pequenos era apenas mais uma brincadeira, auxiliou a pesquisadora em estudos relacionados aos processos de produção de sentido na vida cotidiana. Gabriel, por sua vez, optou por uma abordagem mais tradicional sobre o uso de drogas e álcool. De acordo com Charlotte, ele buscou, durante toda a apresentação, utilizar exemplos bem difundidos na sociedade e uma linguagem simples, compreensível a todos os presentes. Por fim, Vanja Dakic simulou no palco uma discoteca, com direito inclusive à música alta, para explicar como as substâncias químicas podem interferir no funcionamento do cérebro de um usuário. Suas pesquisas estão centradas no efeito da dimetiltriptamina (DMT) – presente no chá ayahuasca e utilizada nos rituais de algumas religiões – nos neurônios e em seu potencial para o tratamento de doenças como a depressão.
Realizando um balanço final da noite, Sérgio Brandão – diretor geral da VideoCiência e curador internacional das mostras VerCiência – diz ter apreciado a originalidade e criatividade da comunicação dos temas científicos. “Foi um mix de ciência com entretenimento da melhor qualidade”, resume. Em sua opinião, os jovens cientistas deram um “show de talento e jogo de cintura” para responderem ao desafio de apresentarem suas pesquisas em apenas dez minutos. De acordo com ele, encontros como esse deveriam acontecer com mais frequência, podendo inclusive concorrer com outras modalidades da manifestação cultural: “Fico imaginando o dia em que as pessoas irão à Lapa para assistir, curtir e participar de noites assim.”