André Luiz Barbosa Báfica cresceu em uma época na qual as crianças ainda podiam, sem grandes perigos, brincar nas ruas. Assim, passou grande parte de sua infância empinando pipa, andando de carrinho de rolimã, jogando futebol ou brincando de pique-esconde com os amigos. Criado em um ambiente familiar de muito carinho, André recorda os tempos de menino com muita alegria: “Eu também passava muito tempo tentando montar coisas a partir de peças velhas de rádios, calculadoras e bicicletas. Mas, ainda que me divertisse muito, nunca montei nada que, de fato, funcionasse.”
Filho mais velho do primeiro casamento de seu pai, que trabalhava na execução de obras de construção civil, André tem oito irmãos, quatro deles apenas por parte de pai. A mãe era dona de casa. Surpreendentemente, André foi alfabetizado em casa, antes mesmo de começar o jardim da infância. “Nessa época, minha família morava em um apartamento na Vila da Penha. Mais tarde, nos mudamos para uma casa no Méier, onde estudei na Escola Municipal Pastor Miranda Pinto, uma excelente instituição. Ainda me lembro perfeitamente das aulas de matemática, francês e inglês que tinha lá”, conta, destacando que sempre teve interesse especial pelas disciplinas de ciências e matemática.
Ele conta que se lembra claramente do fascínio que tinha por um volume de fisiologia e anatomia de uma enciclopédia comprada por seu pai. “Sempre fui muito curioso. Acho que isso se deu por influência de meu pai, que tratava tudo com extremo ceticismo e não acreditava em praticamente nada”, explica. André também se interessava muito pelas figuras de “cientistas malucos” que via em desenhos e filmes. Mal sabia ele que, durante sua vida universitária, entraria em contato com muitos desses “cientistas típicos”, que pensavam na ciência pela ciência.
“Optei pelo curso de medicina pelo aspecto humanitário da profissão”
Na época do vestibular, Báfica escolheu dois cursos: engenharia civil e medicina. “Resolvi, então, cursar medicina na Universidade Federal da Bahia, pois era esse o meu verdadeiro sonho. Além de gostar muito de biologia, química, física e matemática, eu também tinha uma curiosidade inata pelos fenômenos biológicos”, recorda. No terceiro semestre da graduação, começou um estágio de iniciação científica no Centro de Pesquisas Gonçalo Moniz (CPqGM), da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) de Salvador, também na Bahia. “Logo de início, passei a frequentar as reuniões científicas do CPqGM. Nelas, professores e estudantes apresentavam resultados recentes para discussão entre os pares. Foi então que eu comecei a vislumbrar a possibilidade de fazer parte do grupo de pesquisadores que escrevem a história científica da humanidade e não apenas uma pessoa que recebe o conhecimento de maneira passiva”, explica. Nesse ambiente, ele percebeu que queria ser cientista. E teve a oportunidade de interagir com profissionais de alto nível que foram verdadeiros mentores, como os Acadêmicos Manoel Barral Netto – orientador de seu doutorado em patologia humana pela Fiocruz – Aldina Barral, Edgar Marcelino, Zilton Andrade e João Santana da Silva, além do pesquisador belga Johan Van Weyenbergh.
Em seguida, André foi aceito em um curso de pós-doutorado no National Institutes of Health (NIH), em Bethesda, nos Estados Unidos (EUA). Sob a supervisão do Dr. Alan Sher, reconhecido pesquisador na área de imunologia, Báfica pôde interagir com inúmeros cientistas de renome internacional durante sua estadia no exterior.
Desvendando a bactéria causadora da tuberculose
Atualmente, Báfica é professor adjunto do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Além disso, atua como pesquisador do Conselho de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) junto ao CA-Imunologia e no Howard Hughes Medical Institute Early Career Scientist. O principal objetivo de seu grupo de pesquisa é descobrir substâncias produzidas pela bactéria causadora da tuberculose – o bacilo de Koch – que futuramente possam ser usadas como alvo vacinal. “Estudamos a entrada desse bacilo em células do sistema imune chamadas de macrófagos a partir da utilização de técnicas imunológicas diversas”, explica. O pesquisador também desenvolve ferramentas a partir de modelos in vitro, com células humanas, ou in vivo, com animais de experimentação, para investigar importantes questões relacionadas aos modos pelos quais o bacilo de Koch consegue escapar do sistema imune.
“Fazer parte do quadro de Afiliados da ABC é um sonho para todo jovem cientista brasileiro”
Eleito Membro Afiliado da ABC para o período de 2013 a 2017, Báfica afirma sentir-se muito honrado por todo o reconhecimento que vem agregado à titulação. “O principal benefício de me tornar Acadêmico é a possibilidade de servir como fonte de inspiração para que outros jovens também sigam o caminho da ciência.” André também pretende aumentar sua atuação política junto à Fundação de Amparo à Pesquisa de Santa Catarina (Fapesc) para buscar ampliar o financiamento para ciência básica, considerada por ele pedra fundamental no desenvolvimento de aplicações futuras para a sociedade. Ele também enxerga na divulgação científica um viés importante para o desenvolvimento do país, dada a importância de uma população consciente do papel da ciência para a sociedade – e se coloca à disposição da ABC para colaborar em projetos nesse sentido.
Em sua opinião, um estudante interessado na área deve, além de ser ético e curioso, ter consciência do trabalho divertido – ainda que árduo – que envolve a ciência. “Imagine um formigueiro e as suas formigas: os cientistas são como as formigas e o avanço científico da humanidade é o grande formigueiro. Interaja com inúmeros cientistas, leia muito e procure um bom orientador que te dê liberdade de escolha em um determinado tema de investigação de seu interesse”, aconselha.
Para o novo Acadêmico, a pesquisa é a melhor maneira de libertar a mente de alguém. “A ciência desafia todos os limites do nosso conhecimento e isso é, afinal, o que mais me encanta. Na minha área especificamente, tenho curiosidade de entender a linguagem entre o sistema imune e os micro-organismos, além da possibilidade de aplicar leis da natureza que façam previsão dessa complexa interação”, conclui.