A Amazônia Azul
Representando o Almirante de Esquadra Wilson Barbosa Guerra, secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação (C,T&I) da Marinha, Ruivo inicialmente falou sobre o conceito de Amazônia Azul – criado com o propósito de contribuir para o desenvolvimento da cultura marítima nacional por meio da divulgação de sua importância para o país. Nesse sentido, ele contextualizou: “No fim da década de 50, motivada pela crescente consciência sobre o potencial das riquezas existentes no mar, a Organização das Nações Unidas (ONU) passou a discutir a elaboração do que viria a ser, mais tarde, a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos do Mar (UNCLOS, na sigla em inglês).” De acordo com o Contra-Almirante, que é também diretor do Instituto de Pesquisas da Marinha, o Brasil participou ativamente de todas as reuniões de discussão desse tema na ONU, contando com o respaldo de representantes do Itamaraty e da própria Marinha.
Dentre os tópicos tratados constavam a ampliação do mar territorial, a criação da denominada “zona contígua” e o estabelecimento da zona econômica exclusiva (ZEE). A Convenção, assinada em 1982, foi ratificada pelo Brasil no ano de 1988 e, hoje em dia, conta com a assinatura de 156 países. Apesar da grande adesão internacional à UNCLOS, nota-se que o documento ainda não foi ratificado pela atual potência hegemônica, os Estados Unidos da América (EUA).
O documento permitiu, por exemplo, que os Estados costeiros pudessem apresentar à Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC) pleitos sobre o estabelecimento do limite exterior de suas plataformas continentais além do valor preestabelecido. Até o momento, nove países já exerceram esse direito, estando o Brasil entre eles. “Após uma coleta de dados que durou dez anos e contou com o apoio da Marinha, da Petrobras e da comunidade científica, o país apresentou, em setembro de 2004, sua proposta à CLPC”, declara. Ruivo ainda relatou que os espaços marítimos nacionais poderão atingir cerca de 4,5 milhões de quilômetros quadrados. Essa enorme extensão, proveniente da soma das áreas correspondentes à ZEE e à extensão da plataforma continental – atualmente pleiteada – corresponde não só a aproximadamente metade do território terrestre nacional, mas também a uma nova Amazônia, quando comparadas as dimensões. “É o que, na tentativa de alertar a sociedade da importância estratégica e econômica do mar que nos cerca, a Marinha vem chamando de Amazônia Azul”, conclui.
Potencial econômico
No que se refere à influência da Amazônia Azul no âmbito econômico, o Contra-Almirante é enfático: “À luz das enormes riquezas nela existentes e da importância estratégica e comercial do mar para o Brasil, a prudência e a lógica indicam que devemos cuidar com zelo dos diversos componentes do nosso poder marítimo.” Nesse sentido, durante sua fala foram fornecidos alguns números relativos às diferentes atividades produtivas da região. Além do turismo marítimo e dos esportes náuticos, a Amazônia Azul se destaca, principalmente, na produção de petróleo. Cerca de 91% dos quase dois milhões de barris produzidos por dia no país são provenientes de plataformas localizadas na ZEE. “Esse número, a preços conservadores”, afirma Ruivo, “corresponde a aproximadamente dois bilhões de dólares por mês”. No contexto do pré-sal, por sua vez, a produção diária de petróleo atingiu a marca de 300 mil barris – valor que, devido à existência de relevantes reservas petrolíferas na região, deve subir para um milhão de barris por dia até 2017. Ruivo lembrou que o potencial econômico da Amazônia Azul não se esgota nas atividades mencionadas. Como explicitado pelo palestrante, o fundo marinho também apresenta a ocorrência de diversos recursos minerais de grande relevância para o Brasil.
No setor pesqueiro, outra grande riqueza potencial da região, Humberto Moraes Ruivo destacou um grande número de melhorias a serem alcançadas. Dentre elas figuram não só a necessidade de impedir a pesca ilegal na ZEE, mas também a importância de se elevar – “e muito” – a produtividade. Para o conferencista, medidas nesse sentido irão, além de gerar empregos, possibilitar o aumento das exportações, trazendo divisas para o país e evitando que, conforme determina a Convenção, o Brasil seja obrigado a permitir que outros Estados explorem seus recursos naturais.
Os novos patamares da Marinha
Tratando-se, portanto, do preparo de seu pessoal, da modernização dos meios navais e do desenvolvimento de seu sistema de C,T&I, a Marinha está em busca de novos patamares. De acordo com o Contra-Almirante, as principais publicações desse sistema de C,T&I são o Plano de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e de Inovação da Marinha (PDCTM) e o Programa de Ciência e Tecnologia da Marinha (Procitem). O PDCTM, com caráter normativo e doutrinário, utiliza horizontes de planejamento de dez anos; o Procitem, por sua vez, reúne a carteira de projetos científicos e tecnológicos da Marinha e conta com uma ferramenta digital que automatiza o cadastro de projetos em nível estratégico e também permite a consulta e atualização de dados em tempo real, via intranet, por meio de uma plataforma web com transmissão criptografada das informações.
Na tentativa de explicar aos presentes os mecanismos da Marinha nesse âmbito, Ruivo esclareceu: “A Secretaria de C,T&I da Marinha, órgão central do sistema, coordena todos os esforços realizados pelas diversas organizações que o compõem e assessora o Estado-Maior da Armada nos assuntos afetos à ciência.” O palestrante ainda destacou os esforços da Marinha em desenvolver uma estrutura especificamente voltada ao registro da propriedade intelectual: “A Secretaria de C,T&I possui, em sua estrutura orgânica, o Núcleo de Inovação Tecnológica da Marinha (NITMB), que estabelece procedimentos, divulga e gerencia assuntos relativos a essa temática. O NITMB possui a ele vinculadas as Células de Inovação Tecnológica (CIT) – cujo propósito é efetuar e acompanhar os pedidos de registro de propriedade intelectual e industrial nos produtos e invenções que, além de despertar o interesse da marinha, sejam desenvolvidos no âmbito de suas instituições.”
Submarinos: as armas da dissuasão
Por fim, o Contra-Almirante apresentou algumas das principais áreas de interesse da Marinha em relação à pesquisa e ao desenvolvimento. Nesse contexto, dentre outras iniciativas da Marinha brasileira, o conferencista citou a questão dos submarinos, considerados por ele essenciais à Amazônia Az
ul. “Submarinos são meios navais de grande importância estratégica para a negação do uso do mar a nações inimigas. Trata-se, portanto, de uma arma de grande poder de dissuasão. A política da Marinha do Brasil não é ofensiva; pelo contrário, ela se volta completamente à defesa e os submarinos são ferramentas de suma importância no que se refere à proteção de nosso território”, afirma, justificando a priorização desse projeto.
Segundo Ruivo, as principais características de emprego dos submarinos são sua capacidade de ocultação, sua elevada eficácia na detecção passiva, seu notável poder de destruição e sua mobilidade tridimensional. De acordo com ele, existem basicamente dois tipos de submarinos no mundo: os mais convencionais, dotados de propulsão diesel elétrica, e aqueles cuja propulsão é nuclear. O primeiro tipo, adequado ao emprego em áreas litorâneas devido à lentidão de seu deslocamento, depende do ar atmosférico. Os nucleares, por sua vez, independem do ar e – além de se caracterizarem por uma notória mobilidade – são capazes de manter elevadas velocidades por tempo indeterminado e cobrir consideráveis áreas geográficas. “Uma vez que suas aplicações direcionais se complementam, o programa da Marinha contempla os dois tipos de submarinos”, conclui.
Além disso, visando a controlar o impacto ambiental de suas atividades, a Marinha realiza projetos de monitoração dos percentuais de substâncias radioativas na costa brasileira. Dessa forma, muito antes do submarino nuclear entrar em operação, a concentração de radionuclídeos artificiais césio 137 e estrôncio 90 em amostras de água, sedimentos e organismos ao longo de todo o litoral brasileiro vêm sendo registradas em um banco de dados. O objetivo central da obtenção desses registros, explicou o Contra-Almirante, é utilizá-los em comparações futuras, capazes de comprovar que a operação do submarino nuclear não está ocasionando nenhum problema ambiental.