Anderson Rezende Rocha sempre foi determinado. Esta característica, que ele considera fundamental para todo cientista, o ajudou a superar alguns obstáculos durante a vida. Nascido no interior de Minas Gerais, filho de pai pedreiro e mãe professora primária, além de irmão mais velho de duas meninas, Anderson foi a primeira pessoa da sua família a concluir o ensino superior. E foi mais longe. Ele é professor do Instituto de Computação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) onde cursou mestrado, doutorado e pós-doutorado em ciência da computação, tendo cursado a graduação na mesma área, na Universidade Federal de Lavras (UFLA). É membro do Comitê de Informação Forense e Segurança Técnica do Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos (IEEE- IFS-TC) e revisor do periódico Elsevier de Comunicação Visual e Representação da Imagem (JVCI, na sigla em inglês). Foi reconhecido academicamente pela Microsoft Research em 2011, mesmo ano em que foi eleito membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências.
Anderson cresceu no interior de Minas Gerais, no distrito conhecido como Sobradinho, que tem aproximadamente 500 habitantes, pertencente ao município de São Tomé das Letras. Ele admirava os engenheiros da Companhia Energética de Minas Gerais, gostava de acompanhá-los durante as leituras dos medidores de energia das residências próximas de onde ele morava, sonhando ser um deles algum dia.
“Minha maior lembrança desta época foi quando ganhei um capacete oficial de um dos funcionários”, recorda.
Somente a vontade de ser fazendeiro rivalizava com a de ser engenheiro, o que fazia com que passasse boa parte do seu tempo livre brincando com sabugos de milho, fazendo-os de “vacas leiteiras”.
Se no tempo livre ele brincava de fazendeiro ou engenheiro, no colégio Anderson era daqueles que gostavam de estudar, principalmente matemática e física. Aos 14 anos de idade, ouviu falar pela primeira vez em computadores. Foi um colega que lhe contou sobre a chance de comprar um computador bastante modesto, que já havia tido outros dois donos anteriormente.
“Era um daqueles grandes, pesados, que hoje só se vê – e com espanto! – nos filmes antigos.”
Olhando maravilhado para aquela máquina, ele conta que viu o mundo e o seu futuro. “Aquele conjunto de duas caixas beges com uma tela de fósforo verde esperando por comandos para processar tarefas me cativou, eu disse aos meus amigos que ali estava meu futuro, que eu tinha certeza daquilo”, lembra.
Para adquirir aquele computador, Anderson e seu colega fizeram economias do salário que recebiam trabalhando como garçons e só conseguiram comprá-lo em muitas e muitas prestações. O seu autodidatismo se fez com prática, curiosidade e leituras de livros e revistas especializadas no assunto que, em um ano, o fez conhecer softwares, sistemas operacionais e, até mesmo, oferecer aulas particulares de informática – cuja remuneração economizava para comprar um computador melhor. O seu futuro estava traçado. Terminando os estudos escolares, ele estava convicto de cursar ciência ou engenharia da computação.
Se para ingressar nas universidades públicas no Brasil é preciso enfrentar uma enorme concorrência, Anderson ainda precisou superar as limitações do ensino público básico e fundamental. “Ao terminar o ensino médio, eu já estava preparado para passar um ano estudando em casa, enquanto trabalhava à noite, para me preparar”, afirmou. No entanto, ele conseguiu uma bolsa de estudos em um curso preparatório para o vestibular na cidade de Belo Horizonte. “Até hoje agradeço à minha professora de história na escola, Lucia Rezende e ao professor Caio Junqueira Maciel por terem acreditado em mim e aos meus pais por terem feito tudo para que o sonho continuasse possível”, afirma Anderson. Também foi em Belo Horizonte que ele conheceu Ana Dias, sua futura esposa, fonte de inspiração para todas as suas atividades, em suas palavras. Ele foi aprovado para muitas universidades públicas e ingressou no curso de ciência da computação na Universidade Federal de Lavras (UFLA), em Minas Gerais.
Na universidade, deu seus primeiros passos na ciência aprovando três projetos de iniciação científica sucessivamente. Em 2001, no segundo ano de faculdade, sob orientação de Antonio Maria Pereira de Resende, estudou os sistemas multi-agentes para simulação do processamento paralelo e distribuído do cérebro. Em 2002, estudou a implementação de um simulador de algoritmos quânticos. Em 2003, sob orientação de Heitor Augustus Xavier Costa e Lucas Monteiro Chaves, iniciou os estudos de mensagens escondidas em documentos digitais, área na qual ele se especializou. O foco da pesquisa foi a esteganografia – o estudo e implementação de técnicas para mascaramento de mensagens em imagens digitais.
Foi um fato histórico que despertou nele a vocação científica e fez com que escolhesse esse ramo. “O atentado terrorista ao World Trade Center em 2001 me despertou para a ciência. Veiculou-se, à época, que os membros da Al-Qaeda haviam se valido de mensagens escondidas em imagens para organizar o ataque”, contou. A partir deste atentado, Anderson, que iniciava seus estudos universitários, passou a se dedicar ao estudo de imagens digitais, inteligência artificial, computação forense, esteganografia, esteganálise. Foi procurando meios de fazer com que atos como este sejam impedidos que ele cursou mestrado, doutorado e decidiu se tornar cientista. Hoje, suas pesquisas na área de análise forense de documentos são referência no país.
Iniciou o mestrado em ciência da computação na Unicamp em 2004, sob orientação do professor Siome Klein Goldenstein. Sua pesquisa foi na área de esteganálise, estudando técnicas para detecção de mensagens escondidas em imagens digitais. Ele continuou essas pesquisas no doutorado na Unicamp sob a mesma orientação e propôs a utilização de classificadores e técnicas para extrair informações relevantes de imagens e dados que contribuíram para solucionar problemas em processamento de imagens e visão computacional, tais como: categorização de imagens em duas ou mais classes (organização automática de imagens no computador sem intervenção do usuário), detecção de mensagens escondidas, distinção entre imagens digitalmente adulteradas e imagens naturais, autenticação e multiclassificação. Em reconhecimento ao trabalho desenvolvido, sua tese de doutorado foi escolhida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível (Capes) como a melhor em ciência da computação do Brasil no ano de 2009.
A área de atuação de Anderson de Rezende Rocha é conhecida como computação forense digital, um ramo de desenvolvimento de soluções científicas para a preservação, coleção, validação, identificação, análise, interpretação, documentação e apresentação de evidências derivadas de meios digitais, com a finalidade de facilitar e/ou permitir a reconstrução de eventos, usualmente de natureza criminal, auxiliando o sistema legal a validar ou refutar evidências em processos judiciais. De forma bem simples, pode ser compreendida como um ramo da ciência que pesquisa formas de identificação de documentos falsificados, indispensável, por exemplo, para que a veracidade de fotografias digitais, assinaturas em cheque ou cédulas sejam comprovadas. Também contribui com a justiça na identificação de outros delitos, tais como, pornografia infantil, ataques a sistemas de biometria etc.
Rocha aconselha quem está pensando em seguir uma carreira científica a ser sempre persistente, tanto no desenvolvimento da pesquisa quanto na escolha do campo de estudos no qual se aprofundar. Acima de tudo, seu conselho é que o jovem cientista veja na sua atividade um meio de fazer o mundo melhor.
Anderson de Rezende Rocha vê na nomeação como membro afiliado da Academia Brasileira de Ciências uma rara oportunidade de interagir diretamente com cientistas renomados e aprender com suas experiências. Ele quer contribuir, de alguma forma, nos temas de importância para a sociedade que são discutidos pela Academia e ajudar a propor políticas públicas correspondentes. “Acima de tudo, significa que o trabalho que estou fazendo está sendo reconhecido como tendo potencial impacto para ajudar as pessoas”, ele define.